Publicidade
Publicidade
28/05/2002
-
08h07
GUSTAVO PATÚ
da Folha de S.Paulo
Uma espécie de piada ideológica afirma que, se alguém apregoa que no mundo de hoje não há mais diferenças relevantes entre a esquerda e a direita, pode apostar: é de direita. Em um contraponto hipotético para a piada, pode-se dizer que, para identificar um político de esquerda, deve-se procurar alguém tentando definir o que é ser de esquerda no mundo atual.
O tema tem seu lado bizantino, mas tende a ser inevitável numa eleição presidencial em que os quatro principais pré-candidatos se declaram representantes da esquerda ou da centro-esquerda e criticam, ainda que civilizadamente, o esquerdismo particular de cada concorrente.
O livro "Um Desafio Chamado Brasil", coletânea de artigos que Ciro Gomes (PPS) lança hoje, ajuda a entender o debate, ao menos no contexto brasileiro.
Nos textos, publicados de 1995 a 99, Ciro não está propriamente preocupado com os termos "esquerda" e "direita", mas trata de demarcar seu território no campo ideológico nacional, do período em que fazia parte do governo Fernando Henrique Cardoso até sua ida para a oposição.
Vê FHC como traidor do projeto social-democrata do PSDB _que deveria promover uma reforma profunda do Estado concentrador de renda, mas acabou sucumbindo à aliança com as oligarquias regionais, ao medo de desobedecer à visão neoliberal do capital financeiro e ao desprezo pelo diálogo com a sociedade.
Ao mesmo tempo, rejeita o radicalismo, o populismo, o corporativismo e a contestação dogmática das privatizações. Diz que o PT de Luiz Inácio Lula da Silva se tornou um partido limitado a dizer "não" ao governo e incapaz de propostas concretas. "O Brasil quer oposição. Mas não confia na oposição que tem", sentencia.
O papel que Ciro reserva à oposição e _e, consequentemente, a si próprio_ é nada menos que: 1) elaborar um "projeto de país", um "novo paradigma" para as relações entre Estado e mercado, um "modelo alternativo" que possibilite crescimento econômico e distribuição de renda; e 2) liderar uma mobilização popular e intelectual que, entusiasmada com o novo projeto, superaria as barreiras impostas pelas elites beneficiárias da situação atual.
Embora essa pregação esteja diluída em praticamente todos os 64 artigos reunidos no livro, as pistas sobre o que tal estratégia significaria em ações efetivas ainda são poucas.
Está lá, é verdade, a defesa do aumento da taxa de poupança nacional, por meio das reformas dos sistemas de impostos e de Previdência _ambas, aponta Ciro, relegadas por FHC_ e da renegociação da dívida pública.
Presume-se que aqui estaria o eixo principal de um governo Ciro: em português mais claro, organizar as contas do governo para que este deixe de consumir a maior parte da poupança privada, permitindo direcioná-la ao setor produtivo.
Trata-se de um objetivo ambicioso e respeitável, mas não parece o bastante para caracterizar um "novo paradigma" e, principalmente, para produzir o arrebatamento nacional sonhado pelo presidenciável.
UM DESAFIO CHAMADO BRASIL
Autor: Ciro Gomes. Editora: Civilização Brasileira. Quanto: R$ 28 (304 págs.). Lançamento: Hoje, às 20h, na livraria Argumento (rua Dias Ferreira, 417 -Leblon - Rio de Janeiro).
Em novo livro, Ciro Gomes dilui pistas de seu projeto para o país
Publicidade
da Folha de S.Paulo
Uma espécie de piada ideológica afirma que, se alguém apregoa que no mundo de hoje não há mais diferenças relevantes entre a esquerda e a direita, pode apostar: é de direita. Em um contraponto hipotético para a piada, pode-se dizer que, para identificar um político de esquerda, deve-se procurar alguém tentando definir o que é ser de esquerda no mundo atual.
O tema tem seu lado bizantino, mas tende a ser inevitável numa eleição presidencial em que os quatro principais pré-candidatos se declaram representantes da esquerda ou da centro-esquerda e criticam, ainda que civilizadamente, o esquerdismo particular de cada concorrente.
O livro "Um Desafio Chamado Brasil", coletânea de artigos que Ciro Gomes (PPS) lança hoje, ajuda a entender o debate, ao menos no contexto brasileiro.
Nos textos, publicados de 1995 a 99, Ciro não está propriamente preocupado com os termos "esquerda" e "direita", mas trata de demarcar seu território no campo ideológico nacional, do período em que fazia parte do governo Fernando Henrique Cardoso até sua ida para a oposição.
Vê FHC como traidor do projeto social-democrata do PSDB _que deveria promover uma reforma profunda do Estado concentrador de renda, mas acabou sucumbindo à aliança com as oligarquias regionais, ao medo de desobedecer à visão neoliberal do capital financeiro e ao desprezo pelo diálogo com a sociedade.
Ao mesmo tempo, rejeita o radicalismo, o populismo, o corporativismo e a contestação dogmática das privatizações. Diz que o PT de Luiz Inácio Lula da Silva se tornou um partido limitado a dizer "não" ao governo e incapaz de propostas concretas. "O Brasil quer oposição. Mas não confia na oposição que tem", sentencia.
O papel que Ciro reserva à oposição e _e, consequentemente, a si próprio_ é nada menos que: 1) elaborar um "projeto de país", um "novo paradigma" para as relações entre Estado e mercado, um "modelo alternativo" que possibilite crescimento econômico e distribuição de renda; e 2) liderar uma mobilização popular e intelectual que, entusiasmada com o novo projeto, superaria as barreiras impostas pelas elites beneficiárias da situação atual.
Embora essa pregação esteja diluída em praticamente todos os 64 artigos reunidos no livro, as pistas sobre o que tal estratégia significaria em ações efetivas ainda são poucas.
Está lá, é verdade, a defesa do aumento da taxa de poupança nacional, por meio das reformas dos sistemas de impostos e de Previdência _ambas, aponta Ciro, relegadas por FHC_ e da renegociação da dívida pública.
Presume-se que aqui estaria o eixo principal de um governo Ciro: em português mais claro, organizar as contas do governo para que este deixe de consumir a maior parte da poupança privada, permitindo direcioná-la ao setor produtivo.
Trata-se de um objetivo ambicioso e respeitável, mas não parece o bastante para caracterizar um "novo paradigma" e, principalmente, para produzir o arrebatamento nacional sonhado pelo presidenciável.
UM DESAFIO CHAMADO BRASIL
Autor: Ciro Gomes. Editora: Civilização Brasileira. Quanto: R$ 28 (304 págs.). Lançamento: Hoje, às 20h, na livraria Argumento (rua Dias Ferreira, 417 -Leblon - Rio de Janeiro).
Publicidade
As Últimas que Você não Leu
Publicidade
+ LidasÍndice
- Nomeação de novo juiz do Supremo pode ter impacto sobre a Lava Jato
- Indicação de Alexandre de Moraes vai aprofundar racha dentro do PSDB
- Base no Senado exalta currículo de Moraes e elogia indicação
- Na USP, Moraes perdeu concursos e foi acusado de defender tortura
- Escolha de Moraes só possui semelhança com a de Nelson Jobim em 1997
+ Comentadas
- Manifestantes tentam impedir fala de Moro em palestra em Nova York
- Temer decide indicar Alexandre de Moraes para vaga de Teori no STF
+ EnviadasÍndice