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14/07/2002 - 10h49

Pivô da crise no ES quer apoio dos "otários"

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PLÍNIO FRAGA
da Folha de S.Paulo, em Vitória

O principal foco da crise político-institucional no Espírito Santo se prepara para tentar reforçar seu poder onde os adversários menos esperam: nas urnas.

O deputado estadual José Carlos Gratz (PFL), 54, três vezes presidente da Assembléia Legislativa do Estado e que controla 28 dos seus 30 votos, repetirá neste ano a estratégia que lhe deu a supremacia nas três últimas eleições do parlamento local: ajudará no financiamento de campanha dos candidatos com mais chances.

"Esses otários aqui, quantas vezes eu for deputado, eles têm que votar em mim [para presidente da Assembléia]", declarou. À questão sobre que candidaturas ajudará a financiar, é direto: "Todas que tiverem chances de ganhar".

Um parlamentar do PMDB relata a forma de trabalho de Gratz. Na eleição passada, ele recebeu um telefonema do já então presidente da Assembléia, que perguntou o que faltava na campanha. Estrutura, foi a resposta. Mandou gasolina e um trio elétrico.

Não sabia que Gratz tinha pesquisas que o colocavam como o sétimo deputado mais votado. Foi eleito e até hoje faz parte da bancada que apóia o deputado pefelista, grupo este que independe de partidos -os dois únicos parlamentares que não são incluídos nele pertencem a PT e PSB.

Fortuna montada a partir da exploração do jogo do bicho e de cassinos, como afirma claramente, o pefelista está no centro da crise no Espírito Santo. Desde 1994, é acusado de envolvimento com o narcotráfico e com os desmandos no Estado, que incluiriam assassinatos, drogas e corrupção.

Após o relatório da CPI do Narcotráfico em que Gratz foi apontado como um dos líderes do crime organizado no Estado, teve os últimos cinco anos de sua movimentação financeira escarafunchados pela Receita Federal.

O resultado foi um auto de infração por "acréscimo patrimonial a descoberto", resultado de "omissão de rendimentos tendo em vista a variação patrimonial, na qual se verificou excesso de aplicações sobre origens não respaldadas por rendimentos declarados/comprovados".

Mas a punição parece tímida. Multa de R$ 82.527, 61, parcelada em 30 meses. "Num exame de cheques e depósitos como esse, se pegar o papa, acontece a mesma coisa", minimiza Gratz.

O presidente da Assembléia não revela quanto deve gastar na eleição: "Isso depende da quantidade de bônus eleitoral que vamos vender. Tenho o meu prestígio".

O projeto de Gratz é claro. À exceção do governador José Ignácio Ferreira (PTN), é inimigo das principais forças políticas do Estado e que são as favoritas na disputa até aqui, o senador Paulo Hartung (PSB) e o deputado federal Max Mauro (PTB): "Quero bater de frente com essa gente. Podia me candidatar ao Senado, mas não vou. Eles não dizem que sou um merda? Pois quero ver".

Na declaração de bens que entregou na semana passada ao TRE (Tribunal Regional Eleitoral), o patrimônio do pefelista é avaliado em R$ 779.348,55. No papel, houve uma redução, porque no ano 2000 declarava possuir um patrimônio de R$ 833.464,53.

Na lista entregue ao TRE, os bens que mais se destacam são a "disponibilidade financeira em moeda nacional" de R$ 396.500,00, um terreno de 27 mil m2 em Vila Velha (R$ 100 mil), 50% de uma lancha (R$ 62.500) e uma loja comercial onde funciona uma imobiliária (R$ 50 mil).

"Tenho dois bingos aqui, tenho restaurante, tenho 200 maquininhas (caça-níquel) lá no melhor bingo de Guarapari. Não vou viver do salário de deputado", afirma o presidente da Assembléia.

Foi sua força na Casa que impediu a votação do processo de impeachment do governador José Ignácio Ferreira, hoje no PTN, mas que era o principal cardeal do PSDB no Estado até 2001.

Na semana passada, Gratz foi, indiretamente, o pivô da demissão do ministro da Justiça, Miguel Reale Júnior, que defendia a intervenção no Estado e citava como um dos exemplos da corrupção entranhada no poder público 14 ações na Justiça que envolvem o pefelista capixaba. "Papel aceita tudo. Eu desafio essa merda de ministro a trazer um processo contra mim", rebate Gratz.

O pefelista apresenta uma série de declarações da Justiça que apontam que não há nenhum processo em que é réu e que não tem dívidas com a União. Ele afirma que o presidente Fernando Henrique Cardoso tem 425 ações contra si na Justiça. "Qualquer um pode colocar no papel qualquer coisa contra você. Provar é outra coisa", declara.

De 1978 a 1990, segundo afirma, Gratz se dedicou à exploração do jogo do bicho e de cassinos no Espírito Santo, estes últimos em associação com os mais famosos banqueiros do bicho do Rio.

"Em 1984, tivemos um negócio juntos no cassino, no hotel Pôr do Sol em Guarapari. Era eu, o [capitão] Guimarães, o Anísio [Abrão David] e seu Antônio (Turcão). Aqui sempre teve jogo. Como tem no Rio. Você quer que eu te leve em quantos cassinos? Tem em Recife, em Fortaleza com propaganda no aeroporto. Tem em São Paulo, do lado da casa do governador, no Morumbi. Isso é uma hipocrisia", declarou.

O presidente da Assembléia nega qualquer envolvimento com o narcotráfico. "Nunca vi maconha na vida." Afirma não ter lógica a associação entre jogo e drogas.

"Não faz sentido citar uma contravenção que é consentida pela sociedade -o jogo do bicho- com algo que é odiado pela sociedade -o narcotráfico. Quando mexia com esse negócio de bicho e ia muito no Rio, cansei de ver a alta cúpula da polícia pedindo apoio ao jogo do bicho para combater o narcotráfico."

Leia mais:
  • Intervenção no Estado seria a primeira desde 1964


  • "Meu negócio era cassino e jogo do bicho", diz José Carlos Gratz
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