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16/06/2001 - 09h45

O PFL e suas duas faces

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MARIA D'ALVA KINZO
Especial para a Folha de S.Paulo

Nesses 16 anos de experiência partidária democrática, nenhum dos partidos brasileiros atuou no jogo político com tamanha eficácia como o PFL. Originado das fissuras políticas do regime militar, logrou se instalar no poder já no primeiro governo civil, lá permanecendo desde então, a despeito das várias crises por que passaram os governos do regime inaugurado em 1985.

Divulgação
Livro é assinado pela colunista da <b>Folha</b> Eliane Cantanhêde
Livro é assinado pela colunista da Folha Eliane Cantanhêde

Dissidência do PDS, os pefelistas conseguiram resistir à onda eleitoral declinante que assolou seus companheiros do antigo partido para se tornar, já nas primeiras eleições democráticas, a segunda força eleitoral do país, suplantada apenas pelo PMDB. Reunião de elites parlamentares e regionais heterogêneas, o PFL conseguiu manter, ao longo de sua experiência parlamentar, uma invejável unidade de ação, demonstrando reiterada capacidade de fornecer apoio parlamentar à ação governamental.

Reconstruir os eventos em torno dos quais emergiu o PFL, acompanhar sua trajetória ao longo dos últimos 16 anos e identificar as figuras políticas chave que fizeram desse partido um ator político central no cenário político brasileiro são as preocupações do livro de Eliane Cantanhêde. Com o rigor e o detalhe próprios de um trabalho jornalístico criterioso, esse livro oferece um rico relato das articulações políticas que antecederam a criação do PFL e que o fizeram parceiro imprescindível da coalizão, liderada pelo PMDB, que deu sustentação ao primeiro governo da Nova República. Desde então, a trajetória do PFL foi ascendente.

Da reconstrução da história do PFL, tomamos conhecimento de episódios, apenas aparentemente sem importância, mas que podem ter contribuído para que o partido tivesse um perfil singular. Refiro-me, por exemplo, ao fato de Antonio Carlos Magalhães, que se tornou um de seus líderes máximos, não ter participado da gestação do partido, a ele se filiando um ano após sua fundação. Talvez em razão disso, ou seja, por ter sido criado sem a interferência de uma figura de poder incontrastável como a do líder baiano, o PFL se tornou algo mais do que a reprodução da imagem de ACM, ainda que esta seja uma das faces do partido. Sua outra face delineou-se a partir das lideranças que o fundaram, entre elas destacando-se Marco Maciel, Jorge Bornhausen, Aureliano Chaves e Guilherme Palmeira.

Como salienta Cantanhêde, recorrendo a um comentário emitido por Ruth Cardoso (pouco oportuno em períodos eleitorais, ao justificar a aliança partidária de apoio à candidatura de FHC), "há dois PFLs, o de Antonio Carlos e o de Krause e do Stephanes" ou mais precisamente, de Maciel e Bornhausen.

E é justamente do exame da biografia política dos membros proeminentes da cúpula pefelista que a autora busca delinear os traços que caracterizam o PFL: um partido que abriga, de um lado, a força avassaladora de um político personalista e autoritário como ACM e, de outro, o poder da negociação de cúpula e das articulações de bastidores de dirigentes partidários como Maciel e Bornhausen; um partido que a todo momento é associado a práticas fisiológicas e clientelistas, mas que se assume como portador de um projeto liberal e de modernização das estruturas políticas e econômicas do país.

Divisões intrapartidárias não são uma peculiaridade pefelista, tampouco brasileira; mas no PFL elas têm uma marca distintiva, porque tomam a forma de duas caras muito nítidas.

O surpreendente, no entanto, é o fato dessas duas partes terem conseguido, pelo menos até o momento, manter-se em equilíbrio quase que perfeito, a ponto de não prejudicar a ação coordenada de suas lideranças. Tanto assim que os pefelistas não se cansam de exaltar sua capacidade de ação disciplinada no Congresso, característica que tem rendido ao partido o cacife de parceiro governamental confiável.

Mas não é essa a visão de Eliane Cantanhêde, para quem a propalada unidade do PFL é mais mito que realidade. E completa: "desde a origem até todo o sempre, o PFL convive com uma cisão latente, que finalmente explodiu no início de 2001: de um lado, ACM e a bancada baiana; de outro, Maciel, Bornhausen e parlamentares dispersos por vários estados". De fato, desde fevereiro, o PFL tem se defrontado com sérios problemas internos em razão da postura de ACM de franco oposicionismo ao governo FHC, postura que se tornou ainda mais agressiva e independente após sua renúncia ao Senado e seu alijamento do centro da política nacional.

Acredito, no entanto, ser pouco provável que a presente crise pefelista leve de fato a uma cisão partidária. Por mais que uma de suas faces se encontre combalida, o PFL foi e continua sendo suas duas faces.

MARIA D'ALVA KINZO é professora do Departamento de Ciência Política da USP, autora de "Oposição e Autoritarismo - Gênese e Trajetória do MDB" e de "Radiografia do Quadro Partidário Brasileiro"

"Folha Explica - O PFL"
Autor: Eliane Cantanhêde
Editora: Publifolha
Páginas: 104
Quanto: R$ 17,90
Onde comprar: nas principais livrarias, pelo telefone 0800-140090 ou pelo site da Publifolha

 

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