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19/09/2002 - 02h55

Por que a corrupção sumiu do debate?

JUAN ARIAS
especial para a Folha de S.Paulo

Existe uma grande ausência nos debates presidenciais que não deixa de causar espanto aos analistas europeus: a corrupção. É um tema tabu que ninguém se atreve a abordar e que todos estão afastando dos debates.

Será que a corrupção não existe no Brasil? Ou será que todos os partidos têm seus esqueletos próprios escondidos e estão com medo de abrir as portas de seus armários?

Entretanto, basta sair às ruas e perguntar às pessoas para ver que a corrupção é um assunto que mobiliza a todos, que causa revolta profunda e é vista pelos cidadãos comuns como a causa dos piores males que afligem o país. Brecht já dizia que ""o pior dos bandidos é o político corrupto".

E a população sabe que isso é verdade. Como, também, sabe que a corrupção não se restringe à área política, mas invade todas as esferas do poder e todas as instituições. "Houve corrupção", foi a primeira coisa que declarou o secretário de Segurança do Estado do Rio no dia da mais recente tragédia na penitenciária de Bangu.

Impunidade
O pior de tudo é que a corrupção brasileira possui uma característica que a agrava: a impunidade. Talvez o que mais se assemelhe a ela seja a máfia italiana que cobri durante os 30 anos em que fui correspondente em Roma.

A cultura da Máfia, com sua capacidade de corrupção e seu alto grau de impunidade, tinha contagiado as pessoas e acabou arrastando para o abismo toda a classe política que governou o país durante 40 anos.

Mais do que a própria corrupção, foi a impunidade dos mafiosos e corruptos que causou uma sangria na Itália, que era um dos países europeus de mais força e prestígio.

É claro que a corrupção existe em todo o mundo. É claro que ela existe nos Estados Unidos e na Europa, possivelmente maior e mais ampla do que no Brasil. Mas há uma diferença fundamental. Na Europa e nos Estados Unidos, a impunidade para corruptos é muito menor. Quando se descobre um corrupto, ele é castigado severamente.

Helmut Kohl, o grande reunificador das duas Alemanhas, um dos políticos de maior prestígio do mundo, caiu vítima da corrupção e desapareceu por completo da vida pública.

Na França, houve até ministros que cometeram suicídio quando foi descoberta sua corrupção, e, na Espanha, o governo socialista de Felipe González, que tinha tido o mérito de transformar a arcaica e pobre Espanha franquista num país moderno e próspero, perdeu inexoravelmente seu poder nas urnas em razão da corrupção de alguns membros do partido governista.

Os países desenvolvidos têm corrupção, mas não há complacência nem impunidade para com ela. O Brasil, um país com tantas possibilidades para o futuro, seria diferente se tomasse uma atitude mais severa e radical diante da impunidade dos corruptos.

Além disso, como dizia Betinho, o Brasil "tem fome de ética e passa fome em consequência da falta de ética na política", ou seja, por causa da corrupção.

Os candidatos presidenciais -que, felizmente, não parecem estar pessoalmente envolvidos em casos de corrupção- estão perdendo uma grande chance diante de seus eleitores ao retirarem da pauta o tema tão candente da corrupção.

A que se deve tanto medo de enfrentar essa questão?

JUAN ARIAS, correspondente no Brasil do jornal espanhol "El País", escreve mensalmente nesta seção, às quintas

Tradução de Clara Allain


Veja também o especial Eleições 2002
 

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