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30/09/2002 - 11h50

Anúncio rápido de "novo" BC irá acalmar o mercado, diz Werlang

GUILHERME BARROS
Editor do Painel S.A.

Nos últimos dias, o nome do economista Sérgio Werlang, 43, ex-diretor do Banco Central e atualmente diretor do Banco Itaú, tem circulado como uma opção eventual para a presidência do BC, no caso de o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, vencer as eleições do próximo domingo.

Ele nega ter recebido qualquer convite, apesar de dizer que tem mantido conversas com a cúpula econômica do PT. "Estou bem onde estou. Há muitas pessoas com capacidade para assumir esse cargo", afirma Werlang.

Nessa entrevista, concedida na sexta-feira passada por telefone, de Washington, onde participa da reunião anual do FMI (Fundo Monetário Internacional), Werlang diz que a alta do dólar dos últimos dias se deve ao fato de o investidor estrangeiro não ter estudado as propostas do PT, como fez o investidor brasileiro.

Se tivesse feito isso, afirma Werlang, chegaria a conclusão de que o PT deve praticar uma política macroeconômica bastante coerente.

Para o economista, esse medo do mercado deve acabar assim que for anunciado o nome do novo presidente do Banco Central.

Folha - Como o sr. explica essa alta do dólar?

Werlang - Eu não sei responder exatamente como, de um dia para o outro, o dólar pulou de R$ 3,67 para R$ 3,88. O que posso tentar é explicar, de forma genérica, por que o ânimo do mercado está como está.

O que acho é que os investidores estrangeiros levaram muito tempo para perceber que havia uma possibilidade concreta de o PT ganhar as eleições. No Brasil, o mercado já tinha percebido isso há bastante tempo. Tanto que o mercado estudou em detalhes as declarações, os documentos, enfim, todas as propostas macroeconômicas que o PT têm feito, como a carta ao FMI com o apoio à meta de superávit primário de 3,75% do PIB. O que o mercado doméstico concluiu é que a política macroeconômica do PT será bastante coerente. Os estrangeiros não fizeram isso.

Folha - Qual é, então, o medo do PT?

Werlang - A dúvida é se o PT será capaz de pôr em prática as políticas que está propondo. É claro que esse nível de dúvida se dissipa muito rapidamente na proporção que se conheçam os membros da equipe econômica, principalmente o nome do presidente do Banco Central, o que eu acho que vai acontecer logo após as eleições, caso o PT ganhe.

Folha - Por que tanta convicção de que o PT irá adotar uma política macroeconômica coerente?

Werlang - Os brasileiros acompanharam os projetos do PT durante os últimos dois, três meses, olharam com cuidado, checaram a profundidade e coerência dos programas do PT, e eu diria que há uma possibilidade grande de o PT fazer um governo que, do ponto de vista macroeconômico, seja bastante razoável. Só os estrangeiros ainda têm na cabeça o PT que não mudou. Por isso, eles estão com medo de investir naquilo que eles não entendem muito.

Esse medo, é bom que se diga, é reflexo do que aconteceu na Argentina. Se você juntar o problema das perdas na Argentina com a lembrança do PT do passado, que defendia políticas macroeconômicas inconsistentes, o que acontece é que o mercado passa a adotar atitudes extremamente defensivas. É isso o que estamos vendo.

Folha - Mas o que garante que são só os estrangeiros temem o Lula?

Werlang - Um bom exemplo são os preços da dívida externa brasileira, que, em boa parte, estão nas mãos dos estrangeiros não-residentes. Os papéis da dívida externa estão muito mais depreciados do que os da dívida interna.

O deságio das LFTs (Letras Financeiras do Tesouro) no Brasil está em cerca de 2% ao ano, enquanto o deságio do titulo da dívida externa está em 22% a 23% ao ano. Você pode dizer o que quiser, que as medidas são diferentes, mas quando você mede os riscos dos dois tipos de dívida, se vê que a diferença é enorme. E o que distingue essas duas dívidas? A diferença básica é que a dívida externa é detida praticamente por estrangeiros e a interna, por brasileiros.

Folha - Se dependesse só dos investidores brasileiros, o dólar não estaria tão alto?

Werlang - Na minha leitura, há muito menos incerteza no Brasil do que fora do Brasil e nós estamos sofrendo por isso. Isso só será corrigido quando, seja quem for que ganhe, seja o PT, Serra ou outro candidato, forem anunciados os nomes das pessoas que irão gerir a economia e quais as políticas a serem seguidas de fato. Ou seja, se vão assinar de fato o acordo com o FMI, se vão manter o regime de metas da inflação, etc.

Eu diria, no entanto, que o essencial para o mercado é saber quem vai presidir o Banco Central.

Folha - O sr. não acha que essa alta do dólar tem também muito de especulação, como disse o ministro Pedro Malan?

Werlang - É praticamente impossível para alguém que entenda de economia responder sobre oscilações do câmbio no curto prazo. Aliás, os Banco Centrais do mundo inteiro têm um grande problema, que é o de prever qual será a taxa de câmbio. Todos os BCs gostariam de ter bons modelos, mas não têm. Você até pode ter idéia das movimentações gerais. Já a movimentação do dia-a-dia é impossível de se prever.

Folha - O sr. acha que o Banco Central errou ao anunciar que não iria mais renovar a dívida cambial?

Werlang - Não foi um erro. A dívida cambial curta, que vence nos próximos três ou quatro meses, está com uma taxa de juros em dólar, que o jargão do mercado chama de cupom cambial, muito elevada. Ora, se a dívida está com uma taxa de juros elevada, o Banco Central não tem mesmo porque pagar essa taxa. Portanto, o BC acertou em dizer não a essa taxa de juros. A taxa de juros em dólar está muito elevada porque as pessoas não estão querendo mais títulos em dólares.

Folha - O que pode acontecer com as empresas brasileiras com essa alta do dólar?

Werlang - A maioria das empresas está em boa parte protegida contra essas variações cambiais. Se você olhar o gráfico da dívida externa brasileira privada, verá que ela vem caindo. Ela caiu de US$ 240 bilhões em 99 para pouco mais de US$ 200 bilhões este ano.

Isso mostra que houve uma queda bastante grande da dívida em dólares, assim como tem tido um aumento da oferta de instrumentos de proteção contra a oscilação cambial. Hoje em dia, não é tão problemático assim, para uma empresa, essa oscilação do dólar.

Folha - Qual sua previsão para o dólar?

Werlang - Eu acho que se o PT ganhar e anunciar para o Banco Central um time de diretores que sejam percebidos pelo mercado como capazes de levar adiante as políticas de metas de inflação e de câmbio flutuante, o dólar deve cair para a faixa de R$ 3,20.

No caso de o Serra ganhar, que já anunciou que irá manter o Armínio no BC, o dólar deve cair para alguma coisa entre R$ 3,10 e R$ 3,20. É claro que se qualquer candidato que ganhe as eleições anuncie um nome para a presidência do BC que que não seja percebido pelo mercado como capaz de gerir a economia no curto prazo, a desvalorização será maior.

Folha - O sr. tem conversado com o PT?

Werlang - Eu tenho conversado com pessoas do PT, mas em rodas normais de economistas.

Folha - Com quem o sr. conversa no PT?

Werlang - Já estivemos com o (deputado) Aloizio Mercadante e com o Guido Mantega (assessor econômico de Lula), mas em conversas normais.

Folha - O sr. já ouviu falar em alguns nomes para o BC?

Werlang - Eu já ouvi falar de muitos nomes. Já se falou no Joaquim Elói de Toledo (vice-presidente de Finanças da Nossa Caixa), no Cláudio Haddad (ex-diretor do BC), enfim, vários nomes.

Folha - O sr. acharia conveniente manter o Armínio no BC?

Werlang - Seria um sinal muito positivo, mas o Lula disse que não vai fazer. Pelo menos num período de transição de um ano, o Armínio poderia ser mantido para se discutir com calma as políticas econômicas do novo governo.

Folha - Se convidado, o sr. aceitaria ser presidente do BC?

Werlang - Nunca conversei com o PT sobre participação no governo. Nunca fui convidado. Estou muito bem onde estou. Há muitas pessoas com capacidade para assumir esse cargo.

Folha - O sr. acha que o novo governo poderá ter que pedir mais dinheiro do FMI?

Werlang - O dinheiro do FMI que está aí é suficiente. Os problemas econômicos de 2003 são perfeitamente manejáveis.

Leia mais no especial Eleições 2002

 

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