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24/10/2002 - 20h07

Justiça censura edição do "Correio Braziliense" a pedido de Roriz

SANDRO LIMA
da Folha de S. Paulo, em Brasília

O jornal "Correio Braziliense" teve a edição de hoje submetida à censura prévia por decisão do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do Distrito Federal.

O desembargador Jirair Meguerian acatou pedido do governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PMDB), candidato à reeleição, para impedir a suposta divulgação pelo jornal de trechos de uma fita gravada pela Polícia Federal com autorização judicial.

Reprodução




A gravação registra uma conversa por telefone de Roriz com o empresário e deputado distrital eleito Pedro Passos (PSD), acusado de grilagem de terras públicas. Outros jornais, inclusive a Folha, também estão proibidos de divulgar trechos da fita.

Várias entidades, como a ANJ (Associação Nacional de Jornais), a ABI (Associação Brasileira de Imprensa) e a Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), se manifestaram contra a censura prévia ao "Correio".

O desembargador determinou a ''busca e apreensão, com arrombamento ou entrada compulsória, na sede, se houver necessidade de todos os exemplares do jornal 'Correio Braziliense', edição de 24.10.2002, desde que publique trechos ou a íntegra de conteúdo das fitas de gravação das conversas telefônicas interceptadas por ordem judicial''.

Um oficial de Justiça acompanhou a impressão do jornal para apreender todos os exemplares da edição caso algum trecho das fitas fosse publicado.

O advogado de Roriz, Adolfo da Costa, que acompanhou o oficial de Justiça, disse que está em estudo um novo pedido para acompanhar o fechamento do jornal. Uma reportagem da edição de hoje que mencionava as fitas foi retirada da edição. No lugar da reportagem, o jornal usou a palavra "censurado".

Meguerian convocou uma entrevista para explicar sua decisão, mas até o fechamento da edição não havia terminado.

Acusação
Pedro Passos é acusado de grilar uma área pública em um bairro nobre de Brasília para a construção de um condomínio irregular. Pela grilagem desta área, teve a prisão decretada, mas obteve um habeas corpus. Em uma das conversas, Passos teria pedido a Roriz que impedisse a Terracap (empresa estatal responsável pelas terras no DF) de fiscalizar a instalação do condomínio.

No depoimento que prestou à CPI da Grilagem da Câmara Legislativa, Passos confirmou que falou com Roriz, porém ressaltou que o pedido era para que a Terracap não se antecipasse à decisão judicial. Roriz transformou a área em um parque ecológico para evitar que as denúncias prejudicassem sua campanha à reeleição.

O pedido de Roriz para que a edição do "Correio Braziliense" fosse acompanhada foi motivado pelas mudanças na direção do jornal. O jornalista Paulo Cabral de Araújo divulgou ontem a decisão de renunciar aos cargos de presidente do Grupo Diários Associados e do Correio.

O motivo foi uma moção de censura com a assinatura de 13 dos 19 condôminos que compõem os Associados. Roriz temia que, antes da saída de Cabral, o jornal divulgasse trechos das conversas dele com Passos. Cabral deixará o comando do jornal no dia 1º de novembro.

Com Paulo Cabral, sai o diretor de redação do jornal, Ricardo Noblat, que imprimiu à linha editorial do Correio um tom mais crítico em relação à gestão Roriz, o que gerou vários atritos com o governador. Hoje, carros de som da campanha de Roriz divulgavam a saída de Noblat dizendo que agora Brasília "vai ter um jornal sério".

O diretor-executivo da ANJ, Fernando Martins, disse que a decisão da Justiça contraria precedentes constitucionais e é perigosa pois acena com a volta da censura prévia como ocorria na ditadura. "É a volta de um passado negro, onde os donos do poder ordenavam a censura de notícias que lhes desagradavam".

Para a presidente da Fenaj, Elisabeth Villela, a medida contra o Correio "é um absurdo, é a volta da censura prévia".

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do DF divulgou nota dizendo que o ato de Roriz é uma volta ao regime militar.

O presidente da ABI (Associação Brasileira de Imprensa), Fernando Segismundo, condenou ontem a decisão do desembargador Jirair Meguerian de proibir o jornal "Correio Braziliense" de publicar gravações de conversas entre o governador Joaquim Roriz (PMDB) e os irmãos Pedro e Márcio Passos.

"O governador está fazendo uso de uma censura prévia, o que é um absurdo. Mas o que mais lamento é saber que essas fitas foram gravadas com autorização judicial e a própria Justiça permitiu que um funcionário dela censurasse o jornal. É algo inconcebível", disse Segismundo.

Segundo o presidente da ABI, há uma "similitude" na decisão de Meguerian com as que foram tomadas em "outros tempos de nossa história", referindo-se ao período de censura prévia que vigorou durante parte do regime militar (1964-1985).

"Se o governador Roriz está ferido, ele pode recorrer à Justiça para conseguir um direito de resposta imediato ou mover uma ação de danos morais contra o jornal. Agora, pleitear da Justiça um censor é um caso de extrema gravidade, é lamentável", disse.

Segismundo afirmou ter ficado surpreendido também com a decisão do desembargador do TRE-DF, que, segundo ele, "foi um equívoco". "A Justiça é una, tem uma moral e uma ética comum. Ora, quem deu essa solução de mandar alguém censurar o jornal deveria saber antes que a própria Justiça autorizou a escuta. Então, há um conflito dentro da própria Justiça em detrimento à sociedade."

  • Colaborou MURILO FIUZA DE MELO, da Sucursal do Rio

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