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25/10/2002 - 07h11

Salário vale mais, mas alta do consumo do Real perde força

ADRIANA MATTOS
FÁTIMA FERNANDES
da Folha de S.Paulo

Nos anos do governo FHC, 13,9 milhões de brasileiros migraram de classes de menor para as de maior poder aquisitivo e subiram um degrau na escala social.

O consumidor foi beneficiado ainda pelo fim da disparada dos preços. A inflação nos preços dos produtos como roupas e alimentos ficou abaixo da taxa média registrada nos anos FHC. Enquanto a inflação na era tucana foi de 117,66%, os preços dos alimentos subiram 73,34%; de calçados, 43,8%, e de roupas femininas, 35,42%. Os preços relativos caíram, nesses setores.

O consumo de produtos supérfluos disparou. As vendas de amaciantes de roupa subiram 374%; as de requeijão, 284%; e as de cremes e loções, 183%.
Além de a inflação ter ficado sob controle, a renda média do trabalhador pulou de R$ 769, em 1992, para R$ 1.098, em 1996 -o melhor ano. Mas o consumo começou a perder fôlego a partir de 1997 (como consequência também das crises internacionais), e a renda, a encolher. Em agosto de 2002, o valor médio da renda ficou em R$ 797,05 -o pior número desde o início dos anos FHC.

O movimento de remarcação de preços nos últimos meses, por conta da disparada do dólar, jogou água fria no final da era tucana. Nos últimos 12 meses terminados em setembro, o IPCA, índice de inflação do próprio governo, ficou em 7,93%, superando o de 2001, de 7,67%.

Assim, o brasileiro passou a consumir menos e a trocar produtos: só adquire o que é essencial e barato. Com isso, de janeiro a setembro deste ano, o faturamento real do varejo paulista caiu 5,26%. Nas lojas de departamento, a queda foi de 10,42% no período.

O freio nas compras, a retração da renda e o desemprego, que se mantém elevado, quebraram o encanto do início do Plano Real. Ainda assim, o país, na análise de especialistas ouvidos pela Folha, está numa situação mais confortável do que há oito anos quando o tema em questão é o consumo.

O que eles dizem é que o fim da elevada inflação que o país vivia no início dos anos 90 _em 1993, o IGP-DI bateu em 2.708%_ propiciou, além do incremento da renda, aumento da competitividade das empresas, eliminando, portanto, as menos eficientes. A redução do custo final dos produtos e o fim do fantasma da inflação fizeram com que as mercadorias ficassem mais acessíveis à população. A mudança pode ser vista em números.

Considerando como base 100 o índice de produtividade das indústrias em 1989, esse número bateu em 170,8 (produto por hora trabalhada) no ano passado, segundo levantamento da Fundação Dom Cabral. Em 1990, o índice estava abaixo de 100 (96). "As empresas se tornaram mais eficientes, e o consumidor, mais exigente. Isso não tem volta", diz Alberto Serrentino, sócio-diretor da consultoria Gouvêa de Souza & MD.

A exigência é reflexo do maior poder de compra. O BCG (Boston Consulting Group) informa que 4,5 milhões de brasileiros migraram do que a empresa classifica de classe D (renda mensal inferior a quatro salários mínimos) para a classe C (de quatro a dez mínimos). Outros 2,9 milhões pularam da classe C para as classes A e B (acima de dez mínimos). Os números têm como base o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Segundo o instituto, em 1992 a classe C representava 26,3% da população. Em 2000, esse grupo já respondia por 30%.

Dados do Ibope/Latin Panel mostram uma movimentação semelhante. Em 1993, 2% da população pertencia à classe A, de maior poder de compra. Em 2000, essa taxa chegou a 5%. Já a classe E, com menor poder de compra, diminuiu de 18% do total para 8%. O levantamento é feito em 6.000 domicílios.

A migração das classes de menor renda para as de maior causou a expansão no consumo. No período acumulado de 94 a 2000, o consumo per capita de creme dental, absorvente higiênico, papel higiênico e xampu cresceu cerca de 70%.

Na linha de bens duráveis, como TVs, refrigeradores e carros, o aumento do crédito oferecido pelos bancos aos consumidores foi o estopim de um processo que culminou em lojas cheias. Havia dinheiro barato na praça para aumentar as compras e saciar a demanda reprimida. De meados de 1994 ao início de 1995, os empréstimos aos brasileiros subiram de R$ 3 bilhões para R$ 26 bilhões.

"A expansão da carteira de crédito levou a um aumento brutal do poder de compra", afirma Fábio Pina, economista da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (FCESP). "O problema é que essa fase não durou."

O boom de consumo visto no início do Real foi brecado, em 1997, pelo aumento da inadimplência, que resultou na quebradeira de redes de lojas como Casas Centro, Mappin, Mesbla e Arapuã. Com tanto dinheiro disponível, gastou-se mais do que se podia pagar. "Há casos ainda de má administração no varejo", afirma Marcos Gouvêa, sócio-diretor da Gouvêa de Souza & MD.

Vale lembrar que os gastos cresceram durante o período anterior à disparada dos juros promovida pelo Banco Central. Com as crises da Ásia e da Rússia, em 1997 e 1998, respectivamente, foi necessário subir as taxas para manter o interesse do investidor estrangeiro pelo Brasil. Com isso, os juros ao consumidor subiram também.

Hoje, especialistas em varejo dizem que a explosão da inadimplência vivida pelo país em 97 não se repete, já que o comércio está mais cauteloso para liberar o crédito, e o consumidor, mais consciente. No mês passado, de cada 1.000 cheques compensados, 12,7 foram devolvidos. Em setembro de 2000, esse número estava em 13,7 -isto é, houve queda.

Veja também o especial Eleições 2002
 

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