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02/12/2002 - 06h05

Trevisan quer alíquota única para impostos

GUILHERME BARROS
da Folha de S.Paulo

Na semana passada, o consultor Antoninho Marmo Trevisan, 53, presidente da Trevisan Auditores e Consultores, tornou-se o mais novo membro da equipe de transição do PT. Por ter sido um dos primeiros empresários a apoiarem a candidatura do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, Trevisan, ao ingressar na equipe, logo se tornou um dos "ministeriáveis" do novo governo.

O nome de Trevisan está cotado tanto para o cargo de ministro do Planejamento como para a Secretaria da Receita Federal. Ele nega ter sido convidado a fazer parte do governo. Por enquanto, segundo ele, seu papel será o de fazer uma radiografia das estatais. Ele foi incumbido de analisar mais de perto a Petrobras e o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

Se for chamado a dar palpites ao novo governo sobre reforma tributária, Trevisan já tem uma proposta pronta. Ele defende a idéia de uma alíquota única para todos os tributos, inclusive o Imposto de Renda, na faixa de 15% para todos, pessoas físicas e jurídicas. "Quanto mais harmonia existir nas alíquotas, menor será a interferência do sistema tributário nas decisões empresariais e dos contribuintes em geral", afirma.

Para Trevisan, "a cidadania se constrói também a partir da identificação de quanto cada contribuinte transfere para o Estado".

Folha -Qual será o seu papel da equipe de transição?
Antoninho Marmo Trevisan
-O objetivo da equipe de transição é o de preparar para o futuro governo uma idéia clara daquilo que o governo possui. Nós vamos produzir uma radiografia para que os futuros ministros não tenham que perder tempo para compreender o governo. Por conta da minha experiência com o mundo empresarial e por ter cuidado das estatais quando pertencia ao Sest (ex-Secretaria das Empresas de Controle das Estatais), em 1986, vou estar ajudando a fazer uma radiografia das estatais.

Folha -O sr. pretende apresentar alguma sugestão, como de privatização?
Trevisan
-Não, isso cabe ao presidente Lula, se for o caso, e aos ministros, a execução. O que pretendo é apresentar um quadro das estatais, a partir da minha experiência de ex-secretário das estatais, consultor e auditor. Portanto, a rigor, esse trabalho não busca apresentar sugestões. O trabalho é no sentido de fazer uma fotografia muito clara das empresas e possibilitar, de forma organizada, que o governo tenha à sua disposição relatórios os mais completos possíveis para permitir que se possa fazer proposições. É um trabalho mais estrutural.

Folha -Não se deve esperar nenhuma proposta da equipe de transição?
Trevisan
-Isso até poderá ocorrer, mas não é uma regra. Segundo os coordenadores Antônio Palocci e Luiz Gushiken, será sempre no sentido de sugestão aos futuros ocupantes, de acordo com o programa de governo apresentado na campanha. O objetivo é o de fazer uma análise da estrutura do governo nas diferentes esferas.

Folha -Mas haverá tempo para isso?
Trevisan
-O tempo é curto, mas será a primeira vez na história, que eu tenha conhecimento, que se faz esse trabalho. Quando eu cheguei na Sest, eu não sabia nem quantas estatais havia no país. Quem chegar para trabalhar no próximo governo vai se sentir muito mais confortável, após esse trabalho da equipe de transição. Terá sido um avanço formidável.

Folha -Como foi dividido o trabalho?
Trevisan
-A equipe de transição já está trabalhando a mil por hora. Eu vou trabalhar próximo de José Gabrielli, vice-reitor da Universidade de Bahia, de Sérgio Rosas, que foi diretor da Previ, e de Clara Ant, que também cuida da montagem do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. Minha função será a de estudar mais de perto a Petrobras e o BNDES.

Folha -O sr. não está sendo convidado, agora, para depois continuar no governo?
Trevisan
-O curioso é que até a minha mulher acha que eu estava escondendo informações sobre essa questão, de tanto ver na imprensa. Eu não tenho nenhuma informação sobre isso. Tudo não passa de absoluta especulação.

Folha -Mas não se trata de uma especulação à toa. O sr. já há bastante tempo tem fortes ligações com o PT.
Trevisan
-Eu até entendo as razões, afinal, estou há bastante tempo com o Lula, assessorando-o. Eu tive realmente algum papel na campanha de apoio a ele. Participei de estudos do programa e acompanhei o então candidato Lula em vários encontros com empresários. Coordenei o grupo de mercado de capitais do lado do PT para analisar o plano de desenvolvimento desse mercado, preparado por 24 entidades, entre elas a Bolsa de São Paulo e a Abamec (Associação Brasileira de Mercado de Capitais).

Folha -Desde quando o sr. convive com Lula?
Trevisan -Desde 1990, quando ele me convidou para discutir a privatização e a reforma tributária. A partir daí, passamos a ter encontros periódicos que se tornaram mais frequentes, acentuando-se de três anos para cá, quando fui mediador do seminário sobre erradicação da pobreza e combate à fome, com a participação de Lula e do senador Antônio Carlos Magalhães. Desde então, participei de vários debates e seminários do Instituto da Cidadania, com Oded Grajew e Guido Mantega. Este, eu conheço desde quando foi sub-secretário da prefeita Luiza Erundina (SP). Nessa época, eu fiz um trabalho para ele mostrando que as contas da Prefeitura de São Paulo, da prefeita Erundina, estavam em ordem. Com o Zé (José) Dirceu, minha relação é antiga, também de troca de idéias a respeito da reforma tributária, estatais e modelos de desenvolvimento empresariais. Com o Antônio Palocci, vem de quando ele foi prefeito de Ribeirão Preto pela primeira vez e promoveu a privatização do setor de água e saneamento da cidade. No meu livro, eu falo dessa experiência de Ribeirão Preto. Na campanha, participei do comitê de empresários de apoio ao Lula. Com José Genoino, com meu pessoal da Trevisan, trabalhamos na elaboração dos capítulos de seu programa relacionados ao comércio exterior, ao estímulo à micro e à pequena empresa e à criação de pólos de desenvolvimento empresarial sustentável.

Folha -O sr. também promoveu alguns encontros de Lula com empresários na campanha.
Trevisan
-Eu coordenei alguns encontros de empresários com Lula no meu escritório e na minha casa, mesmo antes da campanha. O primeiro desses encontros foi em novembro do ano passado, quando o o presidente eleito ainda não era candidato. Eu acho que a lembrança do meu nome para o governo se deve a isso tudo.

Folha -O sr. pretende apresentar uma proposta de reforma tributária?
Trevisan
-A minha posição sobre reforma tributária é pública. Aliás, há dois anos, eu apresentei na comissão da reforma tributária do Congresso Nacional, cujo vice-presidente era o então deputado Antônio Palocci e o presidente era o Germano Rigotto (governador eleito do Rio Grande do Sul, do PMDB), um projeto, em nome do Conselho Federal de Contabilidade, com uma proposta que estabelecia tributos com alíquotas na casa dos 10%.

Folha -Seria uma alíquota única?
Trevisan
-A tese central é de buscar uma harmonia de alíquotas. Quanto maior a harmonia tributária, menor o impasse que se cria nas discussões sobre justiça ou injustiça fiscal. Essa é uma célebre discussão. Por que se paga mais para determinados produtos e menos para outros? Por que uma determinada categoria paga mais e outra tem alíquota menor? Quanto mais harmonia existir nas alíquotas, menor será a interferência do sistema tributário nas decisões empresariais e dos contribuintes em geral. A decisão de uma empresa de instalar uma fábrica, ou de fazer um produto, não deve ser afetada pelo peso do tributo. Minha visão sobre o sistema tributário é de que ele tem de ser o mais neutro possível para não interferir na vontade das pessoas. Eu quero ressaltar, no entanto, que essa idéia faz parte da minha visão enquanto consultor e a proposta está disponível no Conselho Federal de Contabilidade. Estudo esse assunto há 30 anos e é por isso que muita gente especula com meu nome para a Receita.

Folha -O sr. acha que, agora, a alíquota única seria na faixa de 10%?
Trevisan-Quando fizemos esses cálculos, a idéia era de uma carga tributária que não excedesse a 30% do PIB. Era essa a nossa visão na época. Hoje, a realidade fiscal brasileira se alterou. O espaço para ousar com uma proposta de reforma tributária é menor do que há três anos atrás, quando fizemos esses estudos. Hoje, a dívida pública cresceu muito e o Orçamento é extremamente apertado. Como os cálculos foram feitos com base numa realidade de três a quatro anos atrás, hoje talvez a alíquota fosse de 15%, tanto para pessoas físicas como para pessoas jurídicas.

Folha -O sr. acha viável uma proposta como essa?
Trevisan
-Eu acho que todas as reformas, especialmente a tributária, requerem um amplo pacto com a sociedade. Essa, aliás, é uma das maiores qualidades do presidente Lula, de poder sentar ao mesmo tempo com trabalhadores, sindicalistas, empresários e parlamentares. Hoje, por uma necessidade premente de arrecadação, o sistema tributário é muito eficaz, mas incide sobre a produção. Em última análise, é o contribuinte quem paga, mas não deixa de ser uma distorção. O imposto indireto é sempre um imposto injusto que incide desproporcionalmente sobre a renda das pessoas e das empresas.

Folha -Se o sr. for chamado a palpitar no governo do PT sobre reforma tributária, essa será a sua proposta?
Trevisan
-Não sei como o grupo está avaliando isso, mas do ponto de vista da minha visão como consultor deveríamos perseguir alguma coisa nessa linha, tanto que fez parte do meu estudo sobre o tema. Eu continuo acreditando que um sistema tributário pode e deve ter como meta interferir o menos possível no processo produtivo e no direito das pessoas de ir e vir. E, sobretudo, defendo que é na qualidade dos gastos fiscais e no seu controle rígido que se faz a verdadeira justiça social.

Folha -Como assim?
Trevisan
-Com uma alíquota única para todos os impostos, inclusive o Imposto de Renda, as pessoas saberiam os custos embutidos em suas operações. Hoje, eu desafio as pessoas a dizer quanto elas estariam pagando de impostos nos bens que consomem e nos serviços que elas usam. Ao meu ver, a cidadania se constrói também a partir da identificação de quanto cada contribuinte transfere para o Estado.

Folha -Qual sua avaliação dos primeiros passos do novo governo?
Trevisan
-Não poderia ser melhor. O Brasil está dando uma lição para o mundo. A Argentina está querendo incorporar algumas idéias já postas em prática, especialmente a do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. O presidente Lula defende que o Mercosul só terá avanços se as assimetrias forem sendo construídas de forma ampla. Estou muito feliz em poder participar desse momento que o Brasil vive. E satisfeito em poder conviver com um grupo tão afinado e competente como esse do PT.
 

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