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26/01/2003 - 07h15

Palocci amplia atuação da Fazenda para a área social

GUSTAVO PATÚ
SÍLVIA MUGNATTO
da Folha de S.Paulo, em Brasília

Enquanto o projeto Fome Zero é preparado, em meio a críticas e indefinições, para ser a principal vitrine do governo Luiz Inácio Lula da Silva, um conjunto de diretrizes inovadoras e potencialmente polêmicas voltadas à área social é debatido num local inusitado: o Ministério da Fazenda.

Antonio Palocci Filho e sua equipe, com influência e colaboração de economistas de fora do governo, trabalham com o diagnóstico de que tão cedo não será possível elevar de forma visível os gastos no setor -mais que isso: essa não deve mesmo ser a prioridade da política social agora.

Mais importante, acredita-se, é descobrir quem são e quantos são os realmente miseráveis do país; coordenar a administração dos diversos programas e direcioná-los aos alvos corretos; definir indicadores para avaliar se os recursos empregados de fato contribuem para reduzir a desigualdade e a pobreza.

Dito assim, não parece nada além do óbvio, e até espanta que não tenha sido feito antes. Quando se desce aos detalhes, porém, percebe-se que Palocci, mesmo no seu estilo cauteloso e conciliador, pretende caminhar em terreno minado.

Um exemplo simples: para a Fazenda, os brasileiros ameaçados pela fome e pela subnutrição somam algo como 25 milhões. O Fome Zero, a partir de uma meta ambiciosa exibida durante toda a campanha eleitoral, se propõe a atender 44 milhões de pessoas.

Outro caso é a conclusão de que a ação antipobreza deve priorizar as crianças. Parece uma banalidade, mas o fato é que o Orçamento deste ano destina R$ 1,5 bilhão ao programa Bolsa-Escola, enquanto as universidades federais levarão R$ 7 bilhões do Ministério da Educação.

E o principal gasto social do governo, de longe, é com os benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social, que devem chegar a mais de R$ 100 bilhões neste ano. Uma das principais promessas de Lula na campanha foi dobrar o salário mínimo, o que atende principalmente aos aposentados.

Custo-benefício
Palocci conduz os estudos com discrição e cuidado político -não quer a imagem de um superministro da economia estendendo seus tentáculos sobre a área social. Uma primeira versão de sua lista de diretrizes será conhecida no final deste mês, prazo dado por Lula para que os ministros apresentem seus planos.

A parte mais consensual, ainda que tecnicamente complexa, do trabalho é a definição de parâmetros de avaliação da eficácia dos programas sociais. A equipe de Palocci cita o sistema de acompanhamento de obras públicas implantado no governo Fernando Henrique Cardoso.

"Hoje já existe uma relação entre o físico e o financeiro [é possível saber quanto foi gasto em cada programa e qual foi o resultado para o total gasto]", diz o secretário do Tesouro, Joaquim Levy. "O que é importante é fazer o mesmo sobre o benefício que os programas trazem."

Levy menciona especialistas do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, ligado ao Planejamento) que já desenvolvem critérios para medições assim. "Esses estudos medem, por exemplo, o efeito da Bolsa-Escola na redução do trabalho infantil. E podem responder a perguntas como: Se eu duplicar a bolsa, haverá um aumento do nível de escolaridade ou é melhor dirigir os recursos para outro programa?"

Economistas da pobreza
A referência de Levy ao Ipea não é casual. Vários economistas do instituto têm se dedicado ao estudo das causas da pobreza e da desigualdade social no Brasil, entre os quais se destaca Ricardo Paes de Barros.

A influência de Paes de Barros nos trabalhos conduzidos pela equipe de Palocci começa por um diagnóstico de sua autoria e já repetido mais de uma vez pelo ministro: o governo não gasta pouco com a área social e, ainda assim, a concentração de renda se mantém praticamente inalterada há pelo menos três décadas.

Paes de Barros foi um dos 17 economistas que, durante a campanha eleitoral, elaboraram uma espécie de programa de governo combinando uma visão liberal da economia e uma reformulação das políticas sociais, batizado como "Agenda Perdida" -oferecida, sem sucesso, a todos os principais candidatos ao Planalto.

Um dos coordenadores do documento foi Marcos Lisboa, chamado por Palocci para a Secretaria de Política Econômica. O outro foi José Alexandre Scheinkman, que teve breve participação na campanha do hoje ministro Ciro Gomes (Integração Nacional), do PPS.

O receituário proposto no trabalho tem grande peso no discurso de Palocci, obrigado pelas contingências do cargo a conciliar a defesa dos mais puros princípios da ortodoxia econômica e os compromissos do novo governo com saúde, educação, assistência, reforma agrária e qualquer coisa que possa vir acompanhada do adjetivo "social".

Entre as contribuições de Paes de Barros tanto à "Agenda" como ao pensamento de Palocci, estão as propostas de um cadastro das famílias pobres -já iniciado no governo FHC- e de coordenação e avaliação sistemática dos programas sociais.

Também na conta no economista do Ipea estão críticas ao projeto Fome Zero, como no que já considerou um exagero na definição do público-alvo.

Veja também o especial Governo Lula
 

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