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04/05/2003 - 08h31

CNBB permanecerá crítica, diz d. Geraldo

RAFAEL CARIELLO
da Folha de S.Paulo, em Indaiatuba

"Nunca perderemos nossa posição de crítica", diz d. Geraldo Majella Agnelo, 69, cardeal-arcebispo de Salvador e nome mais provável para ocupar a presidência da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) nos próximos quatro anos.

Nos últimos dias, a entidade tem dado declarações públicas de apoio ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em contraste com as duras críticas e cobranças que marcaram a relação da igreja no país com o governo anterior, de Fernando Henrique Cardoso.

D. Geraldo Majella diz que a aproximação com o governo e até a parceria no Fome Zero, acertada na visita que Lula fez aos bispos na Assembléia Geral da entidade na última quinta, não impedirão que a CNBB venha a fazer críticas quando achar que são cabíveis. Mas afirma que a entidade "não pode pregar o descrédito".

Até anteontem o único nome apresentado por duas chapas antagônicas para a presidência da CNBB, d. Geraldo Majella passou a ter a companhia de d. Cláudio Hummes, cardeal-arcebispo de São Paulo, em uma disputa de que o próprio d. Cláudio se recusa a participar. O nome do arcebispo de São Paulo foi indicado embora ele tenha dito em reunião com o episcopado que não gostaria de assumir o cargo. D. Geraldo Majella segue favorito na eleição que começa hoje em Indaiatuba.

Leia a seguir a entrevista.

Folha - O presidente Lula, em encontro com os bispos, pediu a participação da igreja no programa Fome Zero e a CNBB concordou. Foram acertados detalhes?
D. Geraldo Majella Agnelo
- Isso fica para ser feito à parte. Ali, foram tantas questões... Tem disponibilidade de parceria e colaboração? Tem. Isso ficou evidenciado.
Agora, a maneira será decidida em comissão que vão fazer.

Folha - Quem participará?
D. Geraldo Majella
- Depende do novo secretário. Será o novo secretário-geral com um grupo de assessores, por parte da CNBB. Por parte do governo, acho que o ministro [Luiz" Dulci.

Folha - Ontem [quinta-feira", um bispo chegou a dizer que temia que a CNBB fosse instrumentalizada pelo governo ao assumir esse papel no Fome Zero; que o governo tinha dificuldade em conseguir apoio das prefeituras e governos e então recorria à igreja. Existe risco de instrumentalização?
D. Geraldo Majella
- Não. Acho que não foi bem assim. Foi mais [por causa da] burocracia, que é tão grande. Então foi pedido, para que fosse ágil e transparente, foi pedido [auxílio] não só da nossa parte, mas da sociedade em geral, que fosse até as prefeituras também. Em todas as etapas. Às vezes algo é decidido, mas até que se comunique passa tempo, passa tempo... Por exemplo: o presidente libera uma verba. Até que ela esteja de fato disponível, demora. Nem o Lula está contente com isso.

Folha - Ele chegou a dizer isso?
D. Geraldo Majella
- Chegou a falar. De uma burocracia que existe e que precisa ser vencida.

Folha - A CNBB sempre foi uma das principais vozes críticas do país. O sr. não vê risco, com essa aproximação com o governo...
D. Geraldo Majella
- Não. Isso ontem foi dito claramente. Também da parte do Lula. Ele disse: "Quero a colaboração, sim. Mas também a crítica, construtiva".

Não se trata de uma associação de igreja e governo, mas de colaboração. Da parte dos bispos também foi rebatida essa posição. Colaboramos, mas nunca perderemos nossa posição de crítica, positiva, e de representar uma consciência da situação [do país].

Folha - Não há preocupação de que, com a participação mais efetiva da CNBB, possa ficar associada aos rumos que o Fome Zero tomar, mesmo os eventualmente ruins?
D. Geraldo Majella
- Não. Porque não é que nós vamos interferir na última decisão. Se tem uma colaboração... Olha, vamos dizer que numa paróquia distante do centro e de tudo, que ali possa ser um lugar que possa haver o contato com aquela comunidade, que se disponibilize o local, ou os locais. Tudo isso não tem problema.

Acho que a situação é tão delicada, tão dramática, de fome, de miséria, que precisamos ir e fazer o melhor. Em todos os tempos da CNBB, a igreja nunca esteve atrelada. Veja: a revolução [movimento militar de 64]. Veio a revolução, a igreja continuou crítica do mesmo jeito. Crítica antes, crítica depois. Às vezes, importuna.

É claro, não é sempre que é bem recebida uma crítica.

Folha - A posição da CNBB de crítica ao modelo econômico foi muito marcada no governo FHC. O sr. criticou que a estabilidade se mantivesse à custa do desemprego. Agora aparentemente há uma pausa na crítica, apesar da manutenção do modelo. Por que a CNBB não mantém a posição mais crítica?
D. Geraldo Majella
- Ontem [quinta], o próprio presidente, perguntado, falou sobre a dívida externa, o pagamento de juros. Não é uma coisa que ele possa, unilateralmente, dizer "não vou pagar mais". Tem que ter instrumentos para negociar e defender os interesses do país. Ele fala muito da união que deve haver entre os países da América Latina, da América do Sul em especial.

Dessa união que deve haver para analisar melhor essa questão da dívida, do pagamento dos juros. Ele disse: "Não estou pactuando, mas temos que ser retos no modo de agir. Tudo tem sido considerado, mas para não dar um passo que retroceda, no sentido da confiança [internacional]".

Eu tenho continuado a criticar. Faço os melhores votos para que tudo dê certo, para o bem do povo, não só para o bem do governo.

Folha - Mas o tom da crítica em relação ao governo não diminuiu? Ou continua o mesmo?
D. Geraldo Majella
- Continua, mas não podemos pregar o descrédito. Mesmo que a gente saiba das dificuldades imensas. Ter esperança, temos que ter.

Folha - A igreja tem mais esperança com Lula do que com FHC?
D. Geraldo Majella
- Comparando, não sei. Ainda é uma fase crítica, são apenas 120 dias de governo. Para ele conhecer a realidade, de onde está, da máquina, as mudanças internacionais.

Folha - Caso o governo persista, no futuro, na linha que vem adotando nesses primeiros meses, a CNBB fará críticas?
D. Geraldo Majella
- Quando for oportuno, faremos chegar o nosso pensamento. Uma crítica positiva que chame para fazer mais, fazer melhor. Ele também aceitou. Ele disse que quer a crítica.
 

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