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14/08/2003 - 06h02

Incra quer expropriar por trabalho degradante

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ELVIRA LOBATO
da Folha de S.Paulo, no Rio

O superintendente regional do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) no Rio de Janeiro, Carlos Correia, abriu processo administrativo para a desapropriação das fazendas Cacomanga e Boa Vista, no município de Campos, na região norte fluminense, baseado em denúncia de "trabalho degradante" nas propriedades.

As fazendas fazem parte da Usina Santa Cruz, do empresário José Pessoa Queiroz, que liderou o comitê empresarial de apoio à candidatura de Lula no ano passado.

Já houve no Brasil desapropriação de terra por trabalho escravo (a Fazenda Flor da Mata, em São Félix do Xingu, no sul do Pará, em 1997), mas, segundo Carlos Correia, esta seria a primeira por trabalho degradante.

A diferença entre as duas situações, segundo o procurador do Trabalho Cássio Casagrande, é que no trabalho escravo a pessoa é impedida fisicamente de deixar o emprego ou mantida em servidão por dívida. Já o segundo caso seria caracterizado pela falta de condições dignas de trabalho, como higiene e segurança precárias, jornada excessiva etc.

José Pessoa nega as denúncias. Diz que comprou a usina em 2002 e passou a assinar a carteira de todos os empregados usados no corte da cana-de-açúcar. Segundo ele, isso teria contrariado agenciadores locais de mão-de-obra temporária, que estariam por trás das acusações contra a empresa.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Campos, Paulo Honorato, contesta o empresário e diz que as denúncias partiram de trabalhadores que a usina recrutou no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais.

Na avaliação do superintendente regional do Incra, há espaço legal para desapropriações por condições de trabalho degradantes: "O artigo 184 permite a desapropriação de imóveis rurais que não estejam cumprindo sua função social. O artigo 186 lista os quesitos que definem a função social da terra e entre eles está a observância das disposições que regulam as relações de trabalho".

MST

A desapropriação das duas fazendas foi pedida pelo MST e por outras 20 organizações em carta enviada ao Incra, em meados de maio. Segundo Correia, o processo está em fase de "instrução", na qual a procuradoria regional reúne os elementos para fundamentar a proposta de desapropriação, a ser encaminhada à procuradoria geral do órgão, em Brasília.

No final de abril, o Ministério do Trabalho determinou à DRT (Delegacia Regional do Trabalho) do Rio de Janeiro que apurasse a denúncia de que 500 trabalhadores, recrutados em oito municípios do Vale do Jequitinhonha, estariam vivendo em condições desumanas nas fazendas Cacomanga e Boa Vista.

Os trabalhadores ocupados no corte da cana são contratados pela EMAC - Empresa Agrícola Central Ltda., do mesmo grupo da Usina Santa Cruz. As duas empresas foram autuadas pelos fiscais.

A inspeção foi acompanhada pela Polícia Federal. O relatório da DRT diz que foram feitas 37 autuações, mas que não foi constatado trabalho escravo.

Entre as irregularidades listadas estão jornada de 12 horas "em condições insalubres" na usina, empregados sem uniforme e sem equipamentos de proteção, carteiras de trabalho retidas pelo empregador e alojamento com mau cheiro e sem ventilação suficiente.

Em meados de maio, a fiscalização da DRT voltou a Campos para rescindir os contratos de trabalho de 155 empregados recrutados no Vale do Jequitinhonha, que acusavam a usina de não pagar o salário que lhes havia sido prometido. Os contratos foram rescindidos e cada trabalhador recebeu R$ 756,00, em média.

Na rescisão, os representantes do ministério e os trabalhadores assinaram um documento afirmando que não havia mão-de-obra infantil na empresa nem indício de "falta de liberdade, servidão ou submissão que pudesse caracterizar condições similares a cativeiro ou escravidão".
 

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