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Construtora financia político em cidade onde é investigada
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FÁBIO ZANINI
enviado especial da Folha a Nortelândia (MT)
A construtora Camargo Corrêa, no foco da investigação da Operação Castelo de Areia, é a financiadora eleitoral da elite política de algumas cidades no interior do país em que mantém interesses econômicos. É o caso de Nortelândia, uma cidadezinha de 6.200 habitantes a três horas de carro de Cuiabá.
Metade da área do município, equivalente a meia cidade de São Paulo, fica atrás dos muros e das cercas da fazenda Camargo, estabelecida em 1970.
Gigante econômica numa cidade com economia frágil e baixos indicadores sociais, a empresa teve peso decisivo no resultado da última eleição municipal. Foi ela a maior doadora privada para o prefeito, Neurilan Fraga (PR), e para 5 dos 9 vereadores, segundo dados declarados à Justiça Eleitoral.
Atenção semelhante recebem outras cidades em que a empresa tem obras, na análise de suas doações declaradas em 2008. É o caso de Iranduba (AM), Ribas do Rio Pardo (MS) e Glória de Dourados (MS).
Investigação
No caso de Nortelândia, o apoio político local vem a calhar para a empresa, investigada desde o ano passado pelo Ministério Público Estadual. A suspeita é de que sua usina hidrelétrica particular tenha alterado a vazão do rio Santana, que corta o município, reduzindo a população de peixes pintados e dourados e matando a atividade pesqueira local. Há também uma investigação sobre o não recolhimento de impostos.
O prefeito e os vereadores, aliados declarados da empresa, são da opinião de que não se deve fiscalizar suas atividades.
Há pelo menos cinco anos não é feita uma audiência pública na Câmara que tenha como tema as atividades da Camargo. "Quem tem de fiscalizar é o governo estadual. Nós não temos competência para isso", diz o vereador Luiz Garcia (PPS), financiado por ela.
A distribuição dos recursos para o prefeito, cinco vereadores e dois suplentes --da mesma coligação-- foi sacramentada em 12 de setembro, numa reunião na fazenda. Cada escolhido recebeu um cheque. O prefeito teve metade da campanha bancada pela Camargo. Recebeu R$ 54 mil, cinco vezes mais do que tudo que levantou seu único adversário. A campanha custou R$ 43 por voto. A de Gilberto Kassab (DEM), em São Paulo, R$ 14 por voto.
Pelas ruas esburacadas do centro, praticamente todas as casas ainda exibem adesivos amarelados da campanha de Neurilan. "Busquei o recurso junto a gerentes da empresa que conheço. É claro que ajudou muito", afirma o prefeito.
Os vereadores receberam cotas de R$ 3.000 cada um -em alguns casos, isso respondeu por 40% de tudo o que arrecadaram. Todos são do mesmo grupo, que há dois mandatos controla a cidade, embora pertençam a partidos diferentes: DEM, PMDB, PSDB, PPS e PR.
"Nosso grupo procurou a empresa e fomos agraciados com essas contribuições", afirma o vereador Benedito Mayer (PMDB). "É uma cidade de economia fraca, qualquer doação que entra faz muita diferença", diz o presidente da Câmara, Aníbal Oliveira (DEM).
Em 68 mil hectares, a fazenda cria 14.500 cabeças de gado nelore, planta 9.124 hectares de soja, 1.200 de milho e 300 de sorgo. A usina hidrelétrica tem capacidade de 4,2 MW e foi construída com R$ 15 milhões de recursos do BNDES. A Promotoria apura assoreamento do rio, desmatamento de vegetação ciliar e a criação desordenada de javalis (uma praga para as pequenas lavouras locais).
São 160 empregos gerados (muito pouco, segundo moradores) e nenhum centavo de imposto recolhido ao município. Por estar em área rural, a fazenda não paga IPTU. Também não recolhe ISS nem paga royalties pelo uso da água do rio. Todos os pontos estão sendo investigados. "É no mínimo imoral que essa empresa tenha pago tantas campanhas de políticos do município", afirma a promotora Claire Dutra.
Outro lado
A Camargo Corrêa diz escolher os candidatos para os quais doa "em função de seus ideais". Segundo a empresa, pesam na decisão o compromisso do candidato com temas como crescimento do país, educação e situação de crianças e adolescentes.
As doações, segundo o grupo, são feitas de forma "plural", ou seja, para vários partidos. Os valores são estabelecidos segundo a realidade econômica das cidades.
A empresa diz que a fazenda Camargo emprega 160 pessoas e gera divisas para o município na medida do possível --além de pagar todos os impostos que a lei exige.
Não se paga royalties sobre o uso do rio, de acordo com a Camargo Corrêa, porque toda a produção da usina é para consumo próprio, localmente e nos escritórios de São Paulo, o que é permitido.
A empresa também diz que tem licenciamento ambiental do governo do Estado, que a usina não altera a vazão natural do rio e que, em períodos de estiagem, há uma limitação de operação, sempre assegurando um fluxo mínimo para não prejudicar a fauna marinha.
A construtora nega ter havido desmatamento e diz ter autorização do Ibama para uma pequena criação de javalis, cerca de 40 animais.
A Camargo Corrêa afirma ainda que tem ações sociais na cidade, em áreas como reforma de escolas e capacitação profissional.
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