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14/11/2003 - 00h01

"Temos um Estado democrático de direita", diz Rainha

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CRISTIANO MACHADO
da Agência Folha, em Mirante do Paranapanema (SP)

Um dia depois de sua libertação, o líder do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) José Rainha Jr., 43, criticou a estrutura do Judiciário brasileiro. "Temos aqui um Estado democrático de direita, não de Direito", afirmou, ao ser questionado sobre a atuação da Justiça no país.

Rainha ficou preso por quatro meses e foi solto ontem da Penitenciária de Dracena, no Pontal do Paranapanema (extremo-oeste de SP), principal foco do conflito fundiário no Estado. Um habeas corpus concedido pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) lhe deu direito de aguardar em liberdade a conclusão do processo em que é acusado de porte ilegal de arma.

Rainha aproveitou o primeiro dia fora da prisão para visitar três assentamentos na região. No início da noite de ontem, uma festa "regada a carne de porco e forró" estava preparada para comemorar a liberdade do líder.

Em entrevista à Agência Folha, no início da tarde de ontem, no assentamento Che Guevara, em Mirante do Paranapanema, onde possui um lote, Rainha disse se considerar um "perseguido da Justiça". E defendeu uma "mudança na estrutura" do poder. "A estrutura está velha, enferrujada. É uma estrutura de 500 anos."

Rainha também condenou a atuação do governo do Estado na condução do processo de reforma agrária na região. "O governo do Estado é inoperante, não consegue sair da teoria. Falta vontade política, está muito devagar."

O líder do MST afirmou que o Estado não assentou nenhuma família no Pontal neste ano, mesmo após convênio assinado com o Ministério do Desenvolvimento Agrário que destinou à região aproximadamente R$ 35 milhões. "Foi feito o convênio, a verba foi liberada, e nenhuma família assentada", disse.

Rainha elogiou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Disse que, "em linhas gerais", já fez mais que o governo passado, de Fernando Henrique Cardoso.

Rainha disse acreditar que Lula conseguirá assentar até o final de seu governo 1 milhão de famílias de sem-terra. "Temos paciência e vamos aguardar."

O líder afirmou ainda que não cogita no momento novas invasões de propriedades. "Estamos em outro momento. A luta será pacífica pois não podemos atropelar o tempo para não sermos atropelados", afirmou. A mobilização, disse, será feita com marchas e formação de acampamentos.

Ele reafirmou que não pensa em deixar o Pontal, como sugeriu seu advogado, o deputado federal Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP) --numa tentativa de evitar novas condenações.

"Uma decisão dessas cabe à direção do MST. O que se decidir eu vou aceitar. Mas, pessoalmente, não penso em sair daqui", afirmou. Ele disse ter "uma história na região", onde vive desde o ano de 1991, quando fundou o movimento no Pontal.

Também negou "qualquer tipo de problema" com a direção do MST, que o teria afastado há pouco tempo. "Nunca houve isso, o que houve foram interpretações da imprensa. Estou muito bem com o movimento", afirmou.

Em junho, antes de ser preso, a direção nacional do MST decidiu proibi-lo de conceder entrevistas em nome do movimento. Na época, Rainha afirmou à Agência Folha que acatou a decisão por respeito à hierarquia do MST.

Rainha disse que antes de retomar a "vida normal" no Pontal, vai a Brasília na próxima semana. Ele pretende visitar Frei Betto, assessor especial de Lula, e deputados e senadores que estiveram no Pontal durante o período em que ficou preso.

Outro lado

A Agência Folha tentou falar com o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Sérgio Augusto Nigro Conceição, sobre as críticas de José Rainha Jr. ao Judiciário. Segundo a assessoria de imprensa do TJ-SP, o desembargador estava ocupado durante toda a tarde e, até as 19h de ontem, não pôde ser interrompido.

Em outras ocasiões em que integrantes do MST ou pessoas ligadas ao movimento criticaram decisões do Judiciário em relação ao MST, o presidente do TJ não quis comentar.

O secretário estadual da Justiça, Alexandre de Moraes, responsável pela condução do processo de reforma agrária no Estado, respondeu ontem às críticas do sem-terra José Rainha.

"O Rainha não acompanha as negociações do governo porque está afastado da liderança do MST", disse.

De acordo com Moraes, as negociações têm sido feitas com Gilmar Mauro, Delwek Matheus e outras lideranças locais.

Na semana passada, os sem-terra foram recebidos pelo secretário e pelo secretário de Esportes, Lars Grael, para discutir a construção de quadras poliesportivas nos assentamentos.

Com relação ao convênio de R$ 35 milhões firmado com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, o secretário afirmou que a negociação não depende só do governo, mas também da disposição dos fazendeiros.

No momento, segundo ele, há quatro fazendas sendo avaliadas pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) para desapropriação. "Também há várias ações em curso na Justiça para desapropriar terras devolutas no Pontal", afirmou.
 

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