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21/12/2003 - 05h00

Procuradoria descobre mais "fantasmas" em Roraima

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JOSÉ MASCHIO
da Agência Folha, em Boa Vista

O governo de Roraima, administrado por Flamarion Portela (que pediu afastamento do PT), mantém em sua folha de pagamentos ao menos duas pessoas que, apesar de não fazerem parte do quadro do funcionalismo do Estado, tiveram seus salários sacados por outras pessoas.

A irregularidade foi constatada pelo Ministério Público e é admitida pelo governo do Estado.

O caso lembra o "escândalo dos gafanhotos", no qual pessoas indicadas por autoridades de Roraima recebiam -por meio de procurações- os salários de cerca de 5.500 funcionários fantasmas.

A nova fraude

De acordo com fichas funcionais às quais a reportagem teve acesso, a nova irregularidade consiste em "ativar" na folha de pagamentos fichas de ex-funcionários públicos ou pessoas que nunca trabalharam para o Estado.

Os saques desses salários, em dinheiro, eram feitos no Amazon Bank --novo nome da NSAP (Norte Serviços de Arrecadações e Pagamentos), que gerenciava o pagamento de salários de Roraima e é acusada de irregularidades na gestão de Neudo Campos (PP).

Campos deixou o governo em abril de 2002. Então vice-governador e no PSL, Flamarion Portela assumiu o governo e se reelegeu.

O governo de Roraima admite a existência da irregularidade, mas nega que ela seja uma continuação dos desvios do "escândalo dos gafanhotos" --que podem ter desviado mais de R$ 230 milhões.

O governo diz que os casos serão apurados e os responsáveis, punidos.

Um dos casos é o da servidora federal Marlene Guevara Pinho, 42. Ela soube que "recebia" do governo de Roraima após entrar em disputa judicial com o Estado para ser contratada como professora aprovada em concurso público.

Pinho descobriu que existiam pagamentos em seu nome, foi até o Amazon Bank e sacou R$ 1.200, para, em seguida, denunciar o caso ao Ministério Público Estadual.

A coordenadora de pessoal do governo de Roraima, Maria Francelina de Souza Alves, em ofício de 27 de agosto deste ano, respondeu ao promotor Ulisses Moroni Júnior que a inclusão de Marlene na folha de pagamento "foi um lapso". Ainda no ofício, disse que o problema foi detectado posteriormente e que determinou sua "exclusão da relação nominal do quadro efetivo de professores".

"Lapso nada. É fraude mesmo. Se fosse um erro como a coordenadora fala, eu seria intimada a devolver o dinheiro que saquei e que não é meu. Não fizeram isso porque alguém recebeu em meu nome por vários meses", afirma Pinho. Sua ficha funcional mostra que, somente nos primeiros quatro meses deste ano, foram feitos pagamentos no total de R$ 3.400.

Em outro caso, a ex-servidora estadual Vânia Gurgel da Silva, 32, pediu ao governo uma certidão que comprovasse seu período como professora no Estado. Ela trabalhou de junho de 2000 a abril de 2003, mas descobriu que estava "ativa" até novembro deste ano.

E mais: Vânia, que recebia R$ 900 como professora, teve seu salário "aumentado" para R$ 1.500 e "recebeu" a primeira parcela do 13º salário em novembro último --o governo anunciou que irá pagar a primeira parcela do 13º somente no próximo dia 30.

Ao pedir sua ficha funcional na Secretaria da Administração, Silva descobriu que o documento havia sido "clonado" e que os salários, depois de sua demissão em abril deste ano, eram depositados na conta de outra pessoa, no Banco do Brasil de Boa Vista. Era dessa pessoa o CPF (Cadastro de Pessoa Física) que constava na ficha "clonada" de Vânia.

A reportagem apurou, com funcionários da Secretaria da Administração de Roraima, que a reativação de fichas inativas funciona desde janeiro deste ano. Segundo o procurador Mazzoco, o Ministério Público Federal tem indícios de que outras fórmulas estariam sendo implementadas para manter ativa essa "sangria".

"Essa será uma segunda etapa das investigações do Ministério Público. Antes, vamos finalizar as denúncias contra aqueles que criaram o esquema do gafanhotos", disse Mazzoco.

Outro lado

Depois de verificar os documentos obtidos pela Agência Folha, o governo de Flamarion Portela admitiu a existência de irregularidades na folha de pagamento, mas negou a existência de uma esquema para desvio de dinheiro dos cofres públicos.

Na última quarta-feira, após ser informada do assunto pela reportagem, a secretária de Estado da Administração, Landercy Figueiredo Pereira, determinou a apuração de "responsabilidades no caso de desvio de conduta de qualquer servidor" na folha de pagamentos do Estado.

Segundo Péricles Perucci, secretário-adjunto de Comunicação Social de Roraima, a Secretaria da Administração fará um levantamento geral na folha de pagamentos para apurar eventuais irregularidades além das mencionadas.

Falando em nome de Portela, Perucci negou a existência de um esquema de fraudes montado no Estado. Segundo ele, o que existe são "irregularidades, como a levantada pela Agência Folha, não um esquema organizado, em razão da precariedade com que é feita a folha de pagamentos no Estado".

Perucci disse que Portela tem se empenhado "pessoalmente" para impedir fraudes e só não recebeu a Agência Folha na última quarta-feira porque estava com "uma séria crise de gastrite".

Perucci admitiu que o governo não tem controle sobre a folha de pagamentos, ao tentar justificar as razões para que o 13º salário tenha sido pago a terceiros, enquanto o funcionalismo normal ainda não recebeu nem a primeira parcela.

"É difícil. A situação é tão precária que detectamos que existiram pagamentos de parcelas do 13º à revelia da administração. A luta do governo é para acabar com essa precariedade e depois fazer um recadastramento de todo o quadro funcional."

A folha de pagamentos dos funcionários estaduais vai chegar a R$ 14 milhões neste mês, contra R$ 11,6 milhões de janeiro do ano passado. Perucci não comentou esse aumento -que já chegou a R$ 17 milhões em novembro- sem que houvesse aumento no quadro de 42,5 mil funcionários do Estado (7.500 cedidos pela União) no período nem aumento salarial.
 

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