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07/04/2004 - 19h28

Petistas alertam governo para o risco de derrota nas eleições

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da Folha Online

O grupo de 15 deputados federais do PT que vem pedindo mudanças na política econômica alertou hoje, por meio de um documento, o risco de o governo ser derrotado nas eleições municipais deste ano.

Pela primeira vez, além das críticas na economia, os petistas demonstraram preocupação com as seguidas quedas de popularidade do presidente Lula Inácio Lula da Silva e a conseqüência disso para o desempenho do partido nas eleições para as prefeituras.

Segundo pesquisa divulgada ontem pelo Ibope, a avaliação positiva da população sobre o governo federal caiu seis pontos percentuais (ou cerca de 17,6%), de 34% para 28% de respostas "ótimo" e "bom".

Para os os petistas, a política adotada, "uma continuidade indisfarçável da política econômica do governo anterior", leva o partido a uma perda de identidade. No documento intitulado Declaração de Páscoa: mudança já, antes que seja tarde, os deputados pedem a retomada da postura do PT como partido de vanguarda.

"Se perdermos a identidade, perderemos as eleições", disse o deputado Chico Alencar (RJ).

Os deputados sugerem quatro medidas, classificadas no documento como emergenciais: a redução da taxa de juros real; o encolhimento significativo do superávit primário; a flexibilização, com responsabilidade, das metas inflacionárias (acompanhada de mudança de indexador dos preços administrados - tarifas públicas); a retomada do Estado --por meio dos bancos oficiais-- como indutor do desenvolvimento.

As propostas serão levadas para outros integrantes da bancada do partido na Câmara dos Deputados e à reunião do Diretório Nacional, marcada para os dias 17 18 de deste mês.

Veja a íntegra do documento

"Passados 15 meses de governo Lula, as conseqüências da escolha de política econômica feita em janeiro de 2003 ficam mais claras. Optou-se pela lógica de ganhar confiabilidade junto ao setor financeiro, tendo como avalista o FMI. A espinha dorsal dessa política é a continuidade indisfarçável da política econômica do governo anterior, tida como caminho único das economias periféricas.

Pragmaticamente, escolheu-se a rota que enfrentaria, em tese, menores obstáculos e resistências num primeiro momento do governo, em razão do temor da elite, dos monopólios e do capital financeiro de que a mudança de governo significasse mudança de projeto.

Os resultados da política econômica no período agradam particularmente os rentistas, maiores beneficiários do modelo. Os números são exibidos como exemplo de estabilidade macroeconômica: inflação menor a custa de juros siderais; redução do risco país; estabilização do dólar; superávit primário acima de 4,25% do PIB; pagamento religioso do serviço da dívida, um sangramento de 147 bilhões de reais; renovação do acordo com o FMI, que continua monitorando nossa economia e fazendo exigências próprias da ortodoxia monetarista.

Do lado mais fraco, explodiu o risco social manifesto em índices econômicos e sociais alarmantes: crescimento negativo da economia (-0,2% do PIB); desemprego em alta (quase 20% na grande São Paulo); queda acentuada da renda média dos trabalhadores (12,9% só em 2003) com conseqüente queda do consumo das famílias (-3,3%); drásticos cortes orçamentários que inviabilizam políticas públicas universalizantes e total falta de recursos para investimentos em infra-estrutura.

Nesse quadro, o que constatamos é uma economia excessivamente deprimida, onde a expansão do consumo se torna inviável. A parcela da população que poderia utilizar o crédito para ampliar o consumo, tem seu acesso bloqueado pelas elevadas taxas de juros e, como contraponto, a indisposição das pessoas ao endividamento devido à insegurança no emprego.

Aqueles mais pobres, viram sua renda real reduzir-se continuamente nos últimos anos, vitimados por aumento superior do custo de vida. Logo, qualquer ampliação significativa do consumo, por parte dos setores empobrecidos que se encontram à margem do mercado consumidor, dependerá tanto da redução substantiva da taxa de juros, quanto da ampliação do emprego e da massa salarial.

No tocante ao investimento, observamos queda expressiva nos últimos anos e o patamar de 2003, é um dos mais baixos da história contemporânea brasileira, salientando-se que, neste período, não se instalou capacidade produtiva nova em escala significativa. Uma pequena retomada, observada na produção de bens de capital, está associada ao crescimento das exportações e da atividade exportadora.

Mesmo assim, a elevação das inversões nesse segmento, não tem peso suficiente para mover a taxa global. Aliás, o modelo exportador, no Brasil, além de ser insuficiente para transmitir dinamismo ao conjunto da economia, é fortemente concentrador de riquezas, gerador de poucos empregos e, por vezes, agressivo ao meio ambiente.

O aumento significativo do investimento dependerá, assim, da ampliação da absorção doméstica e da recuperação da infra-estrutura econômica e social do país. O que pressupõe uma ação pública decisiva tanto no gasto quanto no fomento, requalificando o papel do Estado. Aqui, dois conjuntos de medidas são necessários: a ampliação do gasto público empresarial e do crédito de fomento dos bancos oficiais. Paralelamente, busca-se a estabilização da taxa de cambio e a redução continuada dos juros.

É importante destacar que o desempenho pífio da economia brasileira em 2003, se desenrolou dentro de um cenário internacional muito favorável, tanto do ponto de vista dos preços internacionais de parcela expressiva das exportações, quanto da liquidez internacional, acompanhada de aumento geral do fluxo de capitais para os países, e nenhuma crise importante nos ditos emergentes.

Situação esta que pode sofrer alterações bruscas, e exige medidas claras, no sentido de evitar novas apreciações da moeda nacional e ampliação das reservas internacionais, medidas estas, que proporcionariam melhor inserção internacional e adaptação a refluxos de financiamento externo.

Noutro sentido, sabemos que o empresariado nacional não investirá na produção, se o Estado Brasileiro não investir em infra-estrutura. Também, não haverá aumento do consumo sem ampliar a distribuição de renda, criando-se um forte mercado interno. Acontece que o país está travado por um brutal superávit primário.

São quase 70 bilhões de reais, economizados entre receitas e despesas, para financiar menos da metade dos gastos com o pagamento de juros da dívida pública, que ainda assim, cresce e exige mais sacrifícios, num ciclo infernal que imobiliza o país e aprofunda a dependência externa.

Evidencia-se, deste modo, o grave erro governamental de oferecer ao FMI, no início do governo, um superávit primário ainda maior do que aquele organismo exigira (3,75% do PIB), já insuportável para qualquer tentativa de alavancagem econômica. No sentido inverso, apontamos a necessidade de redução substantiva do superávit primário, que deve aparecer já na aprovação do Plano Plurianual.

É fácil imaginar o quanto seria positivo para a economia brasileira que grande parte daquele superávit fiscal fosse direcionado para elevar a taxa de investimento público em infra-estrutura e efetivas políticas sociais como saúde e educação. Isto, além de ampliar a oferta de infra-estrutura, criaria demanda para o setor privado, dinamizando a economia. Representaria, também, um salto de qualidade na conquista de cidadania para o povo brasileiro, com a ampliação do gasto público nos serviços essenciais e na qualidade de vida.

Outra medida importante a ser adotada é o fortalecimento da função de fomento do sistema financeiro público, através da ampliação do volume e redução do custo do crédito (por meio da diminuição dos spreads bancários). Aqui se enfatiza a natureza pública dessas instituições, retirando-lhes o caráter privado, tanto operacional quanto no que diz respeito as exigências de rentabilidade.

No embate por uma nova política econômica torna-se necessário, também, enfrentar posições cristalizadas, que se tornam verdadeiros dogmas. É o caso da total inflexibilidade das metas de inflação acertadas com o FMI. Diz o Banco Central que é necessário acertar o centro da meta. Isto, mesmo quando se prova que a inflação tem aumentado como decorrência dos choques de oferta e, no quadro atual da economia brasileira de desemprego em alta e salários desindexados, é praticamente impossível uma aceleração inflacionária.

Quando se idolatra esta rigidez de metas, é preciso dizer quantos milhares de postos de trabalhos são ceifados para manter cada décimo de ponto da meta, a custa de juros himalaios. Nesse sentido, uma flexibilização das metas inflacionárias, com responsabilidade, é possível, viável e necessária.

Os signatários desse documento não aceitam o senso comum consolidado por analistas a serviço do mercado financeiro, de que qualquer sugestão no sentido da retomada do crescimento econômico, gerando emprego e distribuição de renda, implicará disparada inflacionária, irresponsabilidade fiscal e desarranjos cambiais.

Entendemos, ao contrário, que a ortodoxia da política econômica assentada em: metas rígidas de inflação, política fiscal ultrarestritiva e cambio flutuante sem controle da movimentação de capitais, tem causado uma recorrente instabilidade, que se evidencia nas altas taxas de juros, ampliação da divida pública interna e da dívida externa de curto prazo, dilatando a vulnerabilidade do país.

Nesse sentido, a tal credibilidade acumulada junto aos investidores, ao invés de proporcionar maior capacidade de ação para efetivar políticas alternativas, aumenta nossa vulnerabilidade. Isto torna o país refém do capital financeiro, induz ao aprofundamento da mesma política, dobrando a aposta na ortodoxia monetária. A conseqüência é a perpetuação de uma política de corte liberal que impede qualquer crescimento sustentável.

As propostas acima elencadas, que sinteticamente se traduzem em:

- redução substantiva da taxa de juros real;

- encolhimento significativo do superávit primário;

- flexibilização, com responsabilidade, das metas inflacionárias (acompanhada de mudança de indexador dos preços administrados - tarifas públicas);

- retomada do gasto e do fomento numa ação pública coordenada que resgata o papel do Estado como indutor do desenvolvimento (com destaque para o papel dos bancos oficiais).

Essas medidas fazem parte da emergência necessária à imediata retomada do desenvolvimento que seja sustentável não só no aspecto econômico, mas também sócio-ambiental. Miramos, assim, prioritariamente no enfrentamento do desemprego e da redistribuição de renda, sem os quais a estabilidade social e política se vêem ameaçadas.

São medidas certamente necessárias, mas insuficientes para enfrentar com rigor a vulnerabilidade da economia herdada e aprofundada com o continuísmo econômico. Outras medidas são estratégicas para este enfrentamento. A primeira, é o controle e regulação dos fluxos de capitais sem o qual não é possível obter maior estabilidade das variáveis macro-econômicas e está entre as medidas essenciais para se efetivar política econômica soberana.

Na mesma linha, se coloca a necessidade de outro tratamento para o pagamento da dívida externa, de modo a impedir que o lucro financeiro e a "arma" da dívida apontada para a nação direcione nossa economia, sobrepujando o interesse nacional e as necessidades essenciais de nossa população, o que nos inviabiliza enquanto nação.

Outro ponto fundamental, é a retomada do papel do Estado como promotor e coordenador do desenvolvimento. Particulamente, nos países da periferia capitalista onde o Estado foi tão atacado, privatizado e desmontado pela lógica do Consenso de Washington, esse resgate é um grande desafio e uma ousadia necessária.

Os que se comprometerem com esse documento querem, pois, alteração imediata dessa política econômica, que desmobiliza a sociedade e enfraquece a legitima pressão popular pela mudança. Entendemos que ela desmotiva a população na defesa do governo, que ela espera seja para mudar o país e, ao contrário, o descredencia como agente da mudança. Nestas condições, o desgaste e a desconfiança encontram terreno fértil para prosperar.

É compreensão desse coletivo que não se faz alteração ou correção de rumos que ferem poderosos interesses e privilégios, sem mobilização social. Só assim podemos garantir uma efetiva reforma agrária, conquistar educação e saúde pública, gratuita e de qualidade, garantir saneamento básico, moradia, emprego e salário digno para os trabalhadores, que são inviabilizados hoje pela política de ajuste fiscal. Assim, é necessário deflagar um movimento massivo por outra política econômica, de baixo para cima.

Esse é o antídoto necessário às pressões que vem do alto, dos que querem perpetuar o modelo hegemonizado pelo capital financeiro. Este é o verdadeiro apoio ao programa e ao governo democrático e popular que a população brasileira espera, com ansiedade, seja colocado em prática, para mudar o Brasil.

O agravamento da crise econômica, passados 15 meses do governo Lula, deixa claro que precisamos mudar de rota. Apesar da alardeada positividade dos indicadores financeiros, os dados sobre o desempenho da economia em 2003 revelam estagnação e piora das condições de vida dos trabalhadores. Enquanto os banqueiros e rentistas continuam comemorando ganhos expressivos, do lado mais fraco aumenta o risco social, em função do crescimento negativo, do desemprego e da queda no consumo das famílias. Os sucessivos cortes no orçamento em nada contribuem para melhorar a situação das parcelas mais pobres da população.

Este quadro, que já repercute na popularidade do presidente e do governo, foi analisado no seminário "Queremos um outro Brasil", organizado por 15 deputados federais petistas em São Paulo, no dia 21 de março, que contou com a rica contribuição dos professores Carlos Eduardo Carvalho, Ricardo Carneiro, Laura Tavares e dos companheiros Patrus Ananias e Plínio de Arruda Sampaio.

Além do diagnóstico da crise e da análise de suas repercussões, o seminário apresentou propostas concretas, buscando abrir o debate público sobre os rumos do governo e a responsabilidade social do nosso partido, o PT. Queremos uma outra política econômica, um novo enfoque para a política social e a retomada da iniciativa política por parte do Partido dos Trabalhadores, na linha da mobilização cidadã e da disputa democrática pela mudança social.

O verdadeiro apoio ao nosso governo implica em estimular, de baixo para cima, um movimento massivo pelo redirecionamento político. Contra as pressões de cima --aí compreendidas as dos organismos financeiros internacionais-- para manter o conservadorismo da ortodoxia econômica, o remédio de reversão do continuísmo são as pressões de baixo pela mudança já.

A mobilização da cidadania é o caminho democrático para mudar a política econômica, colocar em eixo novo a política social e consolidar o governo democrático e popular, tão esperado pela maioria de nosso povo.

Em síntese, eis as medidas emergenciais que defendemos:

Redução substantiva na taxa de juros real;

Diminuição do "superávit primário", projetando índices decrescentes nas previsões do Plano Plurianual;

Flexibilização, com responsabilidade, das metas de inflação, introduzindo o enfoque das metas de emprego e crescimento;

Ampliação das reservas internacionais, evitando a sobrevalorização da moeda para reduzir a vulnerabilidade externa e avançar na sua superação;

Controle dos preços administrados (tarifas públicas);

Aumento do investimento produtivo voltado para o mercado interno, visando criar mais empregos e melhores salários;

Concentração de investimentos na infra-estrutura econômico-social reservando recursos queimados na ciranda financeira para o investimento produtivo e em políticas sociais universais;

Resgate da primazia dos recursos públicos para a função do fomento, colocando os bancos estatais e sistema financeiro público - com spreads mais baixos que os do mercado - a serviço de mais crédito e crédito mais rápido e barato;

Redução da carga tributária sobre os setores produtivos;Reajustes do salário mínimo na perspectiva de dobrar o seu poder de compras até 2007, possibilitando o aumento do consumo e a dinamização da economia.Controle e regulação do fluxo dos capitais internacionais;

Auditoria e renegociação da dívida externa, buscando, inclusive nos fóruns internacionais, alternativas que alonguem sua amortização e evitem a sangria desatada de recursos provocada pelo pagamento dos juros e serviços atrelados a ela (na execução orçamentária de 2003, superior em R$ 10 bilhões aos gastos de todos os Ministérios, excluindo o da Previdência!);

Retomada do papel do Estado como promotor e coordenador do processo de crescimento econômico, na busca do desenvolvimento soberano, sustentado, ecologicamente equilibrado e solidário.

A política social, atrelada ao eixo da ortodoxia conservadora, também necessita correções. Fortalecendo o Estado como agente público do bem estar social e do ordenamento de direitos sociais, sugerimos:

Recuperação dos recursos da seguridade social, criando um orçamento social intocável, imune aos contingenciamentos e desvinculações;

Revisão da Lei de Responsabilidade Fiscal, para que ela não incida sobre áreas consideradas essenciais como educação, saúde e assistência social;

Construção de redes nacionais de bens e serviços públicos sobretudos nas regiões mais carentes tendo como eixos o programa nacional de alimentação e nutrição de menores de um ano e gestantes na rede do SUS, e a concessão de Bolsa-Família para as unidades da assistência social (do INSS);

Aceleração da Reforma Agrária, para democratizar o acesso à terra e a produção para o mercado interno;

Reiteração dos nossos compromissos concretos com a educação e saúde públicas gratuitas e de qualidade, saneamento básico, moradia, emprego e salário digno.

O PT precisa reassumir sua condição de polo de esquerda da coligação governamental. É hora de retomarmos a iniciativa política e recolocarmos nosso Partido na vanguarda da disputa democrática na sociedade, contribuindo para evitar que a descrença nos valores da cidadania se generalize. Está na hora do

Partido retomar o papel de sensibilizar o governo com as demandas da sociedade. Se o PT virar mera correia de transmissão do governo prestará um desserviço ao próprio governo. A campanha municipal se aproxima: se perdermos nossa identidade perderemos as eleições.

Apresentamos, por isso, estas propostas políticas, para apreciação de nossa Bancada e do Diretório Nacional do partido, em sua reunião de 17/18 de abril próximo:

Fortalecimento das instâncias partidárias, com democratização do debate sobre os rumos do governo, e transformando-as em geradoras de propostas, críticas e sugestões que aperfeiçoem a ação governamental;

Democratização da imprensa partidária, que não pode ser simplesmente homologatória das posições oficiais, mas vincular também posições minoritárias, estabelecendo o necessário contraponto de opiniões que ajudem a politizar o Partido e preparar a militância para os grandes embates;

Resgate do papel da bancada federal como fonte permanente de consulta, parceria e interlocução com o governo, sem o que não se dará, com consistência e segurança, a defesa das posições governamentais, prejudicando a unidade de ação;

Prestação de contas em tempo real da arrecadação e dos gastos nesta próxima campanha eleitoral, utilizando pioneiramente o site dos TREs disponibilizados para isto;

Mobilização de rua para que o Congresso aprecie, com urgência, alguns projetos de emenda constitucional, como a do financiamento público exclusivo de campanha, a do confisco de terras onde haja trabalho escravo e a da redução do recesso parlamentar;

Elaboração de um livreto, em linguagem popular, com as principais iniciativas governamentais que já melhoraram, concretamente, a vida dos brasileiros."

Brasília, Semana Santa, 7 de abril de 2004
 

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