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29/05/2004 - 06h00

Ex-coordenador da Saúde era "defensor da moralidade", diz ministro

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LUCIANA CONSTANTINO
ANDRÉA MICHAEL

da Folha de S.Paulo, em Brasília

O ex-coordenador-geral de Recursos Logísticos do Ministério da Saúde Luiz Cláudio Gomes da Silva, preso no último dia 19 pela Polícia Federal na Operação Vampiro, sabia das apurações em licitações para a compra de hemoderivados desde que assumiu o cargo, em agosto de 2003.

A informação é do ministro Humberto Costa (Saúde), que o nomeou. Segundo Costa, Silva era "o maior defensor da moralidade que havia aqui". O ex-coordenador, exonerado após ser preso, é investigado pela PF e pelo Ministério Público Federal, acusado de fazer parte de esquema para fraudar licitações do ministério. Conheceu Costa em 1995 e trabalhou com ele na Prefeitura de Recife.

As investigações da Operação Vampiro começaram em 2003, a partir da denúncia de irregularidade na licitação de hemoderivados. Levaram à prisão 17 pessoas, das quais seis eram servidores da Saúde. Três foram liberadas porque colaboraram com a apuração.

Psiquiatra, Costa, 46, se diz decepcionado e usa a "sensação de impunidade" para tentar explicar a razão de Silva saber da apuração e, mesmo assim, estar envolvido.

Para o ministro, ainda não é possível dizer qual foi o prejuízo à União causado pelas fraudes. O valor divulgado na semana passada, com base nos cálculos do próprio ministério, era de R$ 2 bilhões. Costa recebeu a Folha em seu gabinete anteontem à noite.

Folha - Como encarou o fato de um coordenador que nomeara estar envolvido nas apurações da PF?
Humberto Costa
- Eu já tinha conhecimento da investigação. Tudo começou em março [de 2003] com a licitação dos hemoderivados. Quando surgiu a denúncia de violação dos envelopes, encaminhei à PF não só o pedido para perícia, mas também solicitação para apurar a licitação como um todo. Em setembro, recebi carta anônima, fazendo denúncias semelhantes, de extorsão de empresários. Mandei abrir comissão de sindicância e enviei a carta à PF.

Imaginava que, a qualquer momento, o resultado dessa investigação poderia aparecer. O que de fato me surpreendeu e decepcionou profundamente foi que uma pessoa de confiança fizesse, pelo que a PF tem dito, parte dos que estavam sendo investigados. Causou uma decepção muito grande. Eu trouxe uma pessoa de confiança, e ela não correspondeu.

Folha - O sr. conversou com o ex-coordenador sobre a investigação?
Costa
- Ele tinha conhecimento.

Folha - Como o sr. explica, então, o fato de ele ser nomeado em agosto de 2003, saber da investigação e, em maio, ser preso pela PF?
Costa
- Não sei. Talvez a PF possa responder, porque monitorou pessoas e grampeou telefones, com autorização judicial. Mas tenho total convicção de que ele tinha conhecimento da apuração.

Folha - O sr. disse a ele?
Costa
- Não foi uma coisa secreta o que mandei para a PF. Não fiz nenhum alarde na imprensa, mas no ministério todos sabiam. O meu consultor jurídico me disse que chegou algumas vezes a brincar com ele [Silva] e dizer: "Esses telefones estão todos grampeados". Ele respondia: "Eu sei, não tenho nada a temer. A gente está acabando com esses ladrões". Sabia, sabia claramente. Creio que todo esse pessoal devia ter uma sensação de impunidade tão grande que não se preocupou.

Folha - Entre os presos, há outro servidor indicado pelo sr.?
Costa
- Não. Tinha confiança nele [Silva] e dei liberdade para que montasse a equipe. Não conhecia nem pessoalmente esses funcionários. O Manoel [Pereira Braga Neto] vi uma vez em uma reunião. As outras pessoas presas já estiveram no ministério em reuniões com entidades da indústria farmacêutica, tudo devidamente documentado, com ata assinada.

Folha - O sr. recebeu denúncia de que havia funcionário que nomeara envolvido em irregularidades?
Costa
- Todas as denúncias que recebi mandei apurar. Meu assessor jurídico disse que não acreditou quando viu o mandado de prisão porque o cidadão [Silva] era o maior defensor da moralidade que havia aqui. Chegava várias vezes identificando processos com problemas, irregularidades.

Folha - Como conheceu Silva?
Costa
- Eu o conheci por volta de 1995. Era casado com uma amiga de faculdade. O PT tinha sido indicado para ocupar a Secretaria de Estado da Saúde, e ele trabalhava na pasta. Nunca tive uma relação social próxima. Quando o PT ganhou a eleição municipal em 2000 [em Recife], fui convidado para ser secretário [da Saúde] e montei minha equipe. A maioria do pessoal do PT já havia trabalhado na secretaria estadual e sugeriu o nome dele, como bom gestor, ágil. Em saúde tem que juntar confiança, ética, honestidade, agilidade e competência administrativa. Gestor que não seja ágil pode levar ao desabastecimento.

Folha - O sr. diz que não quer politizar o caso, mas tucanos afirmam que a investigação foi divulgada em ano eleitoral, justamente quando o ex-ministro José Serra é pré-candidato a prefeito de São Paulo.
Costa
- A investigação não foi aberta agora. Segundo os procuradores do caso, já vem de longe. E, como administrador público, tenho a responsabilidade de apurar qualquer coisa que chegue e qualquer coisa que possa aventar uma possibilidade de irregularidade. Isso me obriga a determinar que todas as auditorias voltem no tempo. Isso não está direcionado.

Folha - O PT pode usar a Operação Vampiro na eleição municipal para dizer que moralizou o ministério?
Costa
- O PT tem tradição em gestão pública. Não queremos ser donos da verdade nem dizer que somos perfeitos. Não quero me transformar em investigador de polícia nem fazer uma devassa.

Folha - A forma de nomear muda?
Costa
- Os critérios usados no ministério são os mesmos do governo. Vamos continuar usando.

Folha - De onde vem os R$ 2 bilhões que poderiam ter sido desviados em licitações de hemoderivados, segundo as investigações?
Costa
- Isso não foi fornecido pelo ministério. Nosso número é a redução do gasto com hemoderivados em 2003 se comparado ao ano anterior em US$ 50 milhões.
 

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