Publicidade
Publicidade
30/05/2004
-
09h08
ANDRÉ SOLIANI
EDUARDO SCOLESE
da Folha de S.Paulo, em Brasília
A falta de uma legislação com critérios objetivos para a escolha das ONGs que recebem dinheiro público abre espaço para o governo favorecer aliados, sem precisar fazer prestação de contas à sociedade. A opinião é do procurador-geral do Ministério Público no TCU (Tribunal de Contas da União), Lucas Furtado.
Em entrevista concedida à Folha, o procurador disse que o governo deveria se preocupar em criar uma legislação para evitar que o dinheiro público seja repassado a instituições que não estão sujeitas a nenhum tipo de fiscalização e controle.
Segundo ele, de acordo com a atual legislação, o poder público não precisa justificar por que uma determinada entidade foi beneficiada com recursos orçamentários e outra não.
Em casos como o da Ágora, Furtado só encontra uma razão para a escolha de determinada instituição: "Porque quem estava do lado de cá do poder público quis que fosse a Ágora".
Segundo o procurador, sem a existência de critérios objetivos, é impossível responder tecnicamente por que uma instituição foi escolhida.
De acordo com o Ministério Público, a Ágora desviou cerca de R$ 900 mil em dinheiro recebido do governo federal para ser aplicado em cursos de qualificação de trabalhadores. A ONG é presidida por Mauro Farias Dutra, amigo pessoal do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Na última quinta-feira, o Ministério Público decidiu pedir a extinção da Ágora.
Folha - Quais são os critérios que o governo precisa seguir para contratar uma ONG?
Lucas Furtado - Quando se parte para a celebração de um convênio não há critério. Por que a Ágora ou qualquer outra entidade que recebeu dinheiro do FAT [Fundo de Amparo ao Trabalhador] para o Primeiro Emprego foram escolhidas? Eu não sei.
Folha - Como se pode corrigir esse problema?
Furtado - Isso não é uma irregularidade. É preciso uma mudança de legislação.
Folha - A idéia então é criar uma espécie de licitação para o estabelecimento de convênios?
Furtado - Não precisaria ser algo tão formal, no sentido de ganhar aquela que oferece o menor preço. Se o governo precisa de uma entidade privada para desenvolver um programa, como o Primeiro Emprego, que dê publicidade, que permita que outras entidades também possam apresentar propostas.
Isso não é culpa do governo Lula. Convênio, contrato de gestão e termos de parceria existem há muito tempo. O grande problema é que, de alguns anos para cá, o volume de recursos que está sendo repassado para as ONGs cresceu.
Folha - O senhor defende que o Planalto tome a iniciativa e elabore um projeto de lei para corrigir o problema?
Furtado - Ou pelo menos abra a discussão. Talvez não um projeto de lei, que pressupõe ter um critério de escolha.
Folha - Devido à falta de critérios, não se abre a possibilidade de os convênios serem usados para favorecer aliados ou fazer caixa de campanha?
Furtado - Não só para o financiamento de campanhas, mas para o próprio favorecimento. Por exemplo: foi escolhida [para fazer as campanhas publicitárias do governo] a empresa de comunicação do Duda Mendonça, que fez a campanha do presidente Lula à Presidência da República [em 2002]. Caso o Palácio queira acabar com a discussão, ele mostra que fez uma licitação.
Um processo objetivo legitima a escolha da entidade e serve até de amparo para o governante, que pode dizer que a entidade passou por um processo de seleção. É o momento de parar e discutir isso. Hoje, no Brasil, não há nenhum critério que defina qual entidade vai receber R$ 7,5 milhões, como é o caso da Ágora.
Folha - Ou seja, a autoridade pública tem o poder de escolher quem ela quer para celebrar um convênio?
Furtado - Quem ela quer que receba os recursos, sem dar satisfação a quem quer que seja. Um dos pontos do pedido de auditoria da Ágora ao TCU é: "Por que a Ágora foi escolhida?" Não há como responder a essa pergunta. Pergunta-se também se a Ágora tem condições técnicas de fazer o programa. Nesse caso há condições técnicas de fazer a avaliação. Mas responder por que a Ágora foi escolhia... A resposta é essa: porque quem estava do lado de cá, do lado do poder público, quis que fosse a Ágora. É até possível que a Ágora seja a entidade mais qualificada para desempenhar esse programa. Não sei.
Folha - Quando uma entidade subcontrata serviços com dinheiro público, há algum tipo de controle?
Furtado - Uma decisão do TCU determina a alteração da instrução normativa que regulamenta a celebração de convênios. A determinação é que as entidades conveniadas, quando forem contratar, adotem padrões da Lei de Licitação.
Folha - Isso é uma exigência ou uma orientação?
Furtado - O TCU está querendo isso. Houve a mudança. Hoje é obrigado a seguir a Lei de Licitação, mas não se segue.
Procurador vê lacuna em leis sobre verbas destinadas a ONGs
Publicidade
EDUARDO SCOLESE
da Folha de S.Paulo, em Brasília
A falta de uma legislação com critérios objetivos para a escolha das ONGs que recebem dinheiro público abre espaço para o governo favorecer aliados, sem precisar fazer prestação de contas à sociedade. A opinião é do procurador-geral do Ministério Público no TCU (Tribunal de Contas da União), Lucas Furtado.
Em entrevista concedida à Folha, o procurador disse que o governo deveria se preocupar em criar uma legislação para evitar que o dinheiro público seja repassado a instituições que não estão sujeitas a nenhum tipo de fiscalização e controle.
Segundo ele, de acordo com a atual legislação, o poder público não precisa justificar por que uma determinada entidade foi beneficiada com recursos orçamentários e outra não.
Em casos como o da Ágora, Furtado só encontra uma razão para a escolha de determinada instituição: "Porque quem estava do lado de cá do poder público quis que fosse a Ágora".
Segundo o procurador, sem a existência de critérios objetivos, é impossível responder tecnicamente por que uma instituição foi escolhida.
De acordo com o Ministério Público, a Ágora desviou cerca de R$ 900 mil em dinheiro recebido do governo federal para ser aplicado em cursos de qualificação de trabalhadores. A ONG é presidida por Mauro Farias Dutra, amigo pessoal do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Na última quinta-feira, o Ministério Público decidiu pedir a extinção da Ágora.
Folha - Quais são os critérios que o governo precisa seguir para contratar uma ONG?
Lucas Furtado - Quando se parte para a celebração de um convênio não há critério. Por que a Ágora ou qualquer outra entidade que recebeu dinheiro do FAT [Fundo de Amparo ao Trabalhador] para o Primeiro Emprego foram escolhidas? Eu não sei.
Folha - Como se pode corrigir esse problema?
Furtado - Isso não é uma irregularidade. É preciso uma mudança de legislação.
Folha - A idéia então é criar uma espécie de licitação para o estabelecimento de convênios?
Furtado - Não precisaria ser algo tão formal, no sentido de ganhar aquela que oferece o menor preço. Se o governo precisa de uma entidade privada para desenvolver um programa, como o Primeiro Emprego, que dê publicidade, que permita que outras entidades também possam apresentar propostas.
Isso não é culpa do governo Lula. Convênio, contrato de gestão e termos de parceria existem há muito tempo. O grande problema é que, de alguns anos para cá, o volume de recursos que está sendo repassado para as ONGs cresceu.
Folha - O senhor defende que o Planalto tome a iniciativa e elabore um projeto de lei para corrigir o problema?
Furtado - Ou pelo menos abra a discussão. Talvez não um projeto de lei, que pressupõe ter um critério de escolha.
Folha - Devido à falta de critérios, não se abre a possibilidade de os convênios serem usados para favorecer aliados ou fazer caixa de campanha?
Furtado - Não só para o financiamento de campanhas, mas para o próprio favorecimento. Por exemplo: foi escolhida [para fazer as campanhas publicitárias do governo] a empresa de comunicação do Duda Mendonça, que fez a campanha do presidente Lula à Presidência da República [em 2002]. Caso o Palácio queira acabar com a discussão, ele mostra que fez uma licitação.
Um processo objetivo legitima a escolha da entidade e serve até de amparo para o governante, que pode dizer que a entidade passou por um processo de seleção. É o momento de parar e discutir isso. Hoje, no Brasil, não há nenhum critério que defina qual entidade vai receber R$ 7,5 milhões, como é o caso da Ágora.
Folha - Ou seja, a autoridade pública tem o poder de escolher quem ela quer para celebrar um convênio?
Furtado - Quem ela quer que receba os recursos, sem dar satisfação a quem quer que seja. Um dos pontos do pedido de auditoria da Ágora ao TCU é: "Por que a Ágora foi escolhida?" Não há como responder a essa pergunta. Pergunta-se também se a Ágora tem condições técnicas de fazer o programa. Nesse caso há condições técnicas de fazer a avaliação. Mas responder por que a Ágora foi escolhia... A resposta é essa: porque quem estava do lado de cá, do lado do poder público, quis que fosse a Ágora. É até possível que a Ágora seja a entidade mais qualificada para desempenhar esse programa. Não sei.
Folha - Quando uma entidade subcontrata serviços com dinheiro público, há algum tipo de controle?
Furtado - Uma decisão do TCU determina a alteração da instrução normativa que regulamenta a celebração de convênios. A determinação é que as entidades conveniadas, quando forem contratar, adotem padrões da Lei de Licitação.
Folha - Isso é uma exigência ou uma orientação?
Furtado - O TCU está querendo isso. Houve a mudança. Hoje é obrigado a seguir a Lei de Licitação, mas não se segue.
Publicidade
As Últimas que Você não Leu
Publicidade
+ LidasÍndice
- Nomeação de novo juiz do Supremo pode ter impacto sobre a Lava Jato
- Indicação de Alexandre de Moraes vai aprofundar racha dentro do PSDB
- Base no Senado exalta currículo de Moraes e elogia indicação
- Na USP, Moraes perdeu concursos e foi acusado de defender tortura
- Escolha de Moraes só possui semelhança com a de Nelson Jobim em 1997
+ Comentadas
- Manifestantes tentam impedir fala de Moro em palestra em Nova York
- Temer decide indicar Alexandre de Moraes para vaga de Teori no STF
+ EnviadasÍndice