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23/09/2000 - 19h37

Novo laudo desmonta defesa no Massacre de Eldorado dos Carajás

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MÁRIO TONOCCHI
da Folha Online, em Campinas

Um novo laudo elaborado pelo Laboratório de Fonética Forense e Processamento de Imagens da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas - 99 km de São Paulo), desmonta a argumentação de que a Polícia Militar agiu em legítima defesa no confronto entre PMs e sem-terra no dia 17 de abril de 1996 em Eldorado do Carajás, que acabou com a morte de 19 sem-terras.

A nova análise, segundo o promotor da cidade de Eldorado e Curionópolis, no Pará, Marco Aurélio Nascimento, traz provas suficientes para condenar os policiais envolvidos na ação.

Em agosto do ano passado, os três primeiros oficiais da PM julgados no no tribunal do Pará foram absolvidos. O responsável pela operação, coronel Mario Colares Pantoja, foi absolvido neste julgamento anulado.

O Ministério Público recorreu e em maio deste ano junto ao Tribunal de Justiça do Pará anulou a sentença. O novo julgamento deve acontecer até o final deste ano. "Para mim esse novo laudo confirma a tese de homicídio qualificado", observa o promotor.

A análise, que substituiu uma primeira do ex-chefe do Departamento de Medicina Legal da Unicamp, Badan Palhares, utilizou a técnica de desmembrar o filme em 33 frames por segundo.

Do total de frames o novo laudo, realizado pelo foneticista Ricardo Molina Figueiredo, coordenador do Laboratório de Fonética da Unicamp, chegou a sete frames que comprovam a ação ilegal da Polícia Militar.

As observações do laudo

De acordo com o laudo do Laboratório de Fonética Forense da Unicamp, no início da gravação observam-se ruídos semelhantes a rajadas de armas automáticas. São também observados alguns focos de fumaça, possivelmente relacionados com a explosão de bombas de efeito moral ou semelhantes.

Antes do confronto direto entre os integrantes do MST e os policiais militares, observa-se, ao fundo, um integrante do MST caído junto ao caminhão boiadeiro.

Isso mostra que o confronto começou antes do primeiro tiro do policial militar, como foi divulgado na época do julgamento. O PM, afirmou-se na época, atirou para revidar o disparo de um sem-terra.

Para o coordenador do Laboratório de Fonética Forense, a seqüência de eventos é extremamente importante definir a ordem dos disparos. "A análise detalhada da cena revela que o primeiro disparo registrado nesta tomada de câmara foi desferido por um policial militar", afirma.

Alguns segundos após o disparo efetuado pelo policial militar, ocorre um disparo realizado por um dos integrantes do MST. "Este evento foi registrado claramente".

Isso só pode ser visualizado depois da cena ser observada em câmara lenta, o que não aconteceu durante o primeiro julgamento. Essa cena, amplamente divulgada pela imprensa, foi utilizada pela defesa ignorando-se o restante da fita.

Ainda durante confronto foi possível capturar imagens pericialmente relevantes relacionadas com a existência de um integrante do MST caído na região lateral esquerda em relação à posição do MST, aparentemente ferido permanecendo assim durante todo o confronto. Esse sem-terra também foi ferido antes do confronto utilizado pela defesa.

Logo após o confronto, segundo o laudo, quando os integrantes do MST conseguiram se aproximar do caminhão boiadeiro, um deles posta-se ao lado do corpo caído e pede ajuda para que outros o auxiliem a carregar o corpo.

Para Molina, isso mostra que os sem-terra, no início dos confrontos, buscavam apenas resgatar as pessoas que já estava feridas, o que exclui os sem-terra terem atacado a polícia primeiro.

Já no acampamento, em uma das tomadas de câmara, logo após o cinegrafista e a repórter saírem de dentro de um dos barracos do acampamento, a objetiva da câmara de vídeo foi deixada em abertura muito grande, compatível com a penumbra do interior do barraco, mas de modo a permitir a entrada de luminosidade excessiva tão logo se alcançou o campo aberto sob o sol.

Assim, nessa tomada, por alguns segundos (até que o cinegrafista corrigisse a abertura) as imagens capturadas estão super-expostas, sendo percebidas apenas como uma mancha branca, quando se visualiza diretamente a cena por meio de monitor de vídeo.

Mesmo assim, na digitalização dessas imagens, isolando e filtrando alguns frames, constatou-se a existência de um corpo caído, de bruços, com uma grande mancha de sangue e, aparentemente, uma perfuração de projétil de arma de fogo nas costas.

Isso mostra, de acordo com Molina, que houve ação da PM dentro do acampamento, não limitando-se apenas a liberar a pista interditada.

Em dois momentos da fita observa-se integrantes do MST empunhando armas de fogo. Pode-se observar um integrante do MST empunhando um revólver, sem dispará-lo, por alguns segundos, sendo que, em um certo momento, outro integrante do MST retira o revólver de sua mão.

Em outro momento, novamente, um integrante do MST empunha uma arma, apontando-a sobre uma cerca, sem que, no entanto, seja possível verificar se houve disparo. Foi nessa hora que a PM invadiu o acampamento.

"Em diversos momentos da fita existem cenas mostrando integrantes do MST com ferimentos. Além dos diversos ferimentos de arma de fogo observados na região de pés e pernas, chamam particularmente a atenção os ferimentos situados em regiões mais altas do corpo, indicando que diversos disparos efetuados pelos policiais não foram desferidos para baixo", conclui o novo laudo.

Outras cenas mostram dois feridos na região da cintura. Três cenas mostram dois feridos do MST, um deles na região próxima ao olho direito e outro na região do pescoço. Em, outra cena vê-se a mesma mulher que já aparecera junto ao ferido anteriormente, agora mostrando um ferimento na altura da coxa esquerda.

Em uma das tomadas de câmara iniciada no tempo 05:05, é possível observar uma mulher cujas características faciais correspondem às da foto da Sra. Maria Abadia Barbosa fornecida para confronto. O laudo afirma que é praticamente certo quer ela estava no local.

O reconhecimento foi feito a pedido do promotor, já que no primeiro julgamento o depoimento da mulher foi desqualificado afirmando-se que era seria louca e que não estaria no local durante o confronto.

  • Veja a conclusão do laudo sobre Eldorado dos Carajás

  • Leia a descrição da fita por ordem cronológica

    Clique aqui para ler mais sobre política na Folha Online.
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