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30/05/2005 - 09h34

Cresce verba oficial para "capacitar" o MST

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MARTA SALOMON
da Folha de S.Paulo, em Brasília

Com objetivos declarados oficialmente como formar lideranças capazes de "organizar a sociedade", promover encontros com "companheiros e companheiras acampadas" e oferecer assistência jurídica a trabalhadores rurais, cresceram nos últimos anos os repasses de dinheiro público a entidades ligadas ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).

Em 2004, a transferência direta da União a 30 entidades ligadas ao MST havia registrado um aumento de 150% em relação ao último ano da gestão Fernando Henrique Cardoso. No mesmo período, os gastos da União com compra de terras e instalação de famílias nos assentamentos aumentaram 81%. Nos dois casos, as despesas não foram corrigidas pela inflação.

Há duas semanas, quando a Marcha Nacional pela Reforma Agrária chegou a Brasília com cerca de 15 mil pessoas, a Folha pesquisou o destino do dinheiro público repassado a entidades como a Anca (Associação Nacional de Cooperação Agrícola), a Concrab (Confederação da Cooperativas de Reforma Agrária), o Iterra (Instituto de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária) e o Centro de Capacitação Canudos, além de cooperativas de assentamentos e associações de reforma agrária, tidas como alguns dos braços financeiros do MST.

Escola do MST

Uma ordem bancária de pagamento lançada no Siafi (sistema de acompanhamento de gastos da União) três meses antes registrava o repasse de R$ 300 mil para a compra de equipamentos, móveis e um veículo para a Escola Nacional Florestan Fernandes, principal centro de formação do MST, localizada a 60 km de São Paulo.

O endereço eletrônico do movimento lista como objetivos da escola formar lideranças e capacitar militantes da reforma agrária. Por ora, seus cursos não são reconhecidos pelo Ministério da Educação. O secretário de Educação Profissional e Tecnológica, Antonio Ibañez Ruiz, responsável pelo convênio celebrado com o Iterra, disse que "os cursos não necessariamente devem dar diploma".

De acordo com Ruiz, o governo federal está interessado na capacitação técnica dos militantes e dos líderes dos sem-terra.

Menos de duas semanas depois, o Siafi registrou mais um repasse para a escola do MST. Em convênio celebrado com a Anca, o Ministério da Cultura contribuiu com mais R$ 25 mil para a compra do mobiliário e equipamentos da Florestan Fernandes.

A formação de lideranças de "pré-assentamentos" foi o motivo apontado pelo Ministério do Trabalho para repassar à Anca no final de 2003 cerca de R$ 500 mil. Diz o registro do convênio no Siafi que o dinheiro se destina à formação de lideranças "que desempenhem de forma eficaz a tarefa de organizar a sociedade". Em 2004, foram gastos mais R$ 600 mil com a qualificação em "programas coordenados pelo MST".

"Burocracia"

As descrições que acompanham os registros de pagamentos no Siafi foram atribuídas pelo secretário de Políticas Públicas de Emprego do Ministério do Trabalho, Remígio Todeschini, à burocracia. "Há uma série de documentos internos, e o menino da burocracia do Siafi pega qualquer coisa e põe lá", disse.

Segundo o secretário, o objetivo do programa é potencializar a produção dos assentados via organização de cooperativas e convênios do mesmo tipo foram celebrados durante o governo FHC.

As descrições dos projetos extraídas do Siafi seriam de autoria dos próprios trabalhadores rurais, afirmou Rolf Hackbart, presidente do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). Hackbart aparece como responsável pela liberação de recursos públicos para a prestação de serviços de assistência jurídica a trabalhadores rurais e a realização de encontros de assentados.

Um desses encontros apresenta como justificativa que a luta pela reforma agrária começou com a chegada dos portugueses ao Brasil. "O Brasil é considerado o país com maior injustiça social do mundo, sendo que a não realização da reforma agrária é uma das suas principais causas."

Parcerias

Hackbart atribuiu os repasses crescentes às entidades ligadas ao MST à necessidade de parcerias para implementar as políticas públicas. "O Estado brasileiro 'convenia' com todos os setores da sociedade. Os convênios têm como critérios a capacidade de execução do objeto, a disponibilidade orçamentária e o interesse público", disse o presidente do Incra.

O acesso aos registros mais detalhados do Siafi só é possível mediante senha. A pesquisa foi feita com o apoio dos gabinetes do deputado federal Eduardo Paes (PSDB-RJ) e do deputado distrital Augusto Carvalho (PPS).

Repasses

O volume de dinheiro repassado a entidades é muitas vezes menor do que os gastos do governo com a compra de terra e instalação das famílias nos assentamentos. A compra da fazenda Itamarati, do ex-rei da soja Olacyr de Moraes, em Mato Grosso do Sul, por exemplo, custou aos cofres públicos R$ 165 milhões no ano passado. Desse total, R$ 55 milhões foram pagos apenas pelas benfeitorias nas terras destinadas ao assentamento 1.700 famílias.

Um dos principais programas de entidades ligadas ao MST que receberam recursos públicos em 2004 --a alfabetização de jovens e adultos-- custou R$ 3,8 milhões. Com o mesmo objetivo de apoiar a educação de jovens e adultos nos assentamentos, o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) liberou R$ 925 mil à Anca no antepenúltimo dia útil do ano.

Quanto ao ritmo das despesas, os registros do Siafi indicam que os repasses a entidades cresceram de forma mais acelerada do que os gastos com o assentamento dos sem-terra. Esses repasses não pararam de crescer nem em 2003, quando os gastos com os assentamentos caíram em relação ao ano anterior.

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