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30/10/2005
-
09h23
FREDERICO VASCONCELOS
da Folha de S.Paulo
Juízes federais paulistas afastados do cargo na Operação Anaconda estão se livrando de ações penais em meio a forte tiroteio, numa guerra surda que envolve troca de acusações e ofensas entre membros do Supremo Tribunal Federal e do Ministério Público.
Ao votar pelo fim de uma ação criminal contra o juiz federal Casem Mazloum, o ministro Gilmar Mendes, do STF, citou vários processos da Anaconda e escreveu que o recebimento de "denúncias ineptas e aventureiras pelos Tribunais Regionais Federais e confirmadas pelo Superior Tribunal de Justiça" revela "uma típica covardia institucional".
"É uma ofensa inaceitável e sem precedentes ao STJ, ao TRF e ao Ministério Público Federal", reagiu Janice Ascari, que liderou o trio de procuradoras da República da Operação Anaconda.
Mazloum fora denunciado com os juízes federais João Carlos da Rocha Mattos, Adriana Pileggi de Soveral e três policiais federais pelo uso irregular, em veículos particulares e de parentes, de chapas reservadas, exclusivas para uso em operações da polícia.
"É impensável, para quem os conhece, que a desembargadora Therezinha Cazerta e os membros do TRF sejam covardes porque deram início a uma ação penal. É inadmissível dizer que os ministros José Arnaldo Fonseca, Gilson Dipp e Laurita Vaz, que confirmaram a decisão no STJ, sejam covardes", afirmou Ascari.
Para a procuradora regional da República Luiza Cristina Frischeisen, Mendes estaria sendo "arrogante" porque decidiu sem ter tido acesso ao inteiro teor dos processos e das provas. "Julgar fatos sem conhecer as provas, o que não é viável em habeas corpus, só pode dar em impunidade", diz a procuradora Ana Lúcia Amaral.
Ela alega que matéria criminal não é a especialidade de Mendes, que em seus votos "tem demonstrado um rancor desmedido" em relação ao MPF, "possivelmente por ter sido acionado por improbidade administrativa".
A Folha transmitiu a Gilmar Mendes as principais críticas das procuradoras. O ministro preferiu não fazer comentários. O TRF-3 não quis se manifestar.
Placas
O encerramento da ação penal no caso das placas foi decidido por maioria pela 2ª Turma do STF. Em votação anterior, por unanimidade, a turma negara o trancamento de ação igual contra a juíza Adriana Soveral.
Agora, ao julgar o pedido de Casem Mazloum, aceitou que não houve adulteração das placas, mas uso indevido de placas fornecidas pelo Detran. O benefício concedido a Mazloum foi estendido a todos os réus. "A decisão repõe as coisas nos seus devidos lugares, afastando o arbítrio", disse o advogado Alberto Zacharias Toron, que fizera a defesa oral da juíza Soveral.
No julgamento anterior, Mendes entendera que o fato tipificava crime, e acompanhara a ministra relatora, Ellen Gracie.
A relatora sustentou que o TRF e o STJ haviam admitido que "a substituição de placas comuns por placas reservadas configura alteração de sinal identificador externo do veículo automotor". Ou seja, que a conduta se ajusta ao crime previsto no artigo 311 do Código Penal" [reclusão de três a seis anos e multa, pena aumentada em um terço quando cometido por servidor público].
"A julgar pelas palavras do ministro Mendes, a relatora é 'covarde', pois tem reafirmado tratar-se de conduta típica retirar-se a placa do veículo, lacrado pelo Detran, e colocar outra, o que permite cometer infrações de trânsito e até crimes sem que se possa identificar o condutor", diz Ana Lúcia.
Mendes citou os desembargadores Peixoto Júnior e Alda Basto, do TRF-3, ao acolher a alegação de que Casem Mazloum "não remarcou nem adulterou placas".
"Não se está aqui a apoiar atuação irregular de magistrado", afirmou Mendes, ao dizer que os atos poderiam configurar irregularidade administrativa, não justificando ação penal. No voto, pediu "escusas" por haver negado habeas corpus, antes, à juíza Soveral.
Gravações
Nos diálogos gravados da Operação Anaconda, Rocha Mattos orienta policiais para forjar respostas em sindicância da Polícia Federal sobre as placas. O juiz pediu ao agente federal César Herman Rodriguez cópia de recurso contra multas, explicando que não tinha mais placa reservada.
Interrogado no TRF, Rocha Mattos disse que, ele mesmo, quebrava o lacre do Detran, "coisa de bandido", segundo sua mulher.
Em dezembro de 2004, Ascari, Frischeisen e Amaral já haviam considerado um "desrespeito" ao TRF e ao STJ o fato de o Supremo, a partir de voto de Mendes, haver excluído o juiz Ali Mazloum do processo da Anaconda no dia em que o caso estava sendo julgado em São Paulo. O habeas corpus fora impetrado quatro meses antes e a denúncia havia sido mantida, por unanimidade, pelo STJ.
Mendes considerou que havia "imputações vagas" na denúncia contra Ali Mazloum --acusado de usar serviços prestados pela quadrilha da Anaconda para obter vantagens. O ministro concordou com a alegação da defesa de que a denúncia era "genérica", por atribuir ao magistrado "participação peculiar na quadrilha".
Em seu voto, Mendes citou outros casos da Anaconda, "cuja lembrança chega a ser constrangedora". O primeiro, "uma denúncia que beirava às raias da total irresponsabilidade e que o ministro Celso de Mello classificou de 'bizarra': o MPF denunciara Casem Mazloum por falsidade porque, numa declaração de renda à Receita Federal, dizia possuir US$ 9 mil no Afeganistão, enquanto na cópia entregue ao tribunal informava que o dinheiro estava no Brasil. O STF aceitou a alegação de "erro de digitação", tese rejeitada pelo TRF e pelo STJ.
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da Folha de S.Paulo
Juízes federais paulistas afastados do cargo na Operação Anaconda estão se livrando de ações penais em meio a forte tiroteio, numa guerra surda que envolve troca de acusações e ofensas entre membros do Supremo Tribunal Federal e do Ministério Público.
Ao votar pelo fim de uma ação criminal contra o juiz federal Casem Mazloum, o ministro Gilmar Mendes, do STF, citou vários processos da Anaconda e escreveu que o recebimento de "denúncias ineptas e aventureiras pelos Tribunais Regionais Federais e confirmadas pelo Superior Tribunal de Justiça" revela "uma típica covardia institucional".
"É uma ofensa inaceitável e sem precedentes ao STJ, ao TRF e ao Ministério Público Federal", reagiu Janice Ascari, que liderou o trio de procuradoras da República da Operação Anaconda.
Mazloum fora denunciado com os juízes federais João Carlos da Rocha Mattos, Adriana Pileggi de Soveral e três policiais federais pelo uso irregular, em veículos particulares e de parentes, de chapas reservadas, exclusivas para uso em operações da polícia.
"É impensável, para quem os conhece, que a desembargadora Therezinha Cazerta e os membros do TRF sejam covardes porque deram início a uma ação penal. É inadmissível dizer que os ministros José Arnaldo Fonseca, Gilson Dipp e Laurita Vaz, que confirmaram a decisão no STJ, sejam covardes", afirmou Ascari.
Para a procuradora regional da República Luiza Cristina Frischeisen, Mendes estaria sendo "arrogante" porque decidiu sem ter tido acesso ao inteiro teor dos processos e das provas. "Julgar fatos sem conhecer as provas, o que não é viável em habeas corpus, só pode dar em impunidade", diz a procuradora Ana Lúcia Amaral.
Ela alega que matéria criminal não é a especialidade de Mendes, que em seus votos "tem demonstrado um rancor desmedido" em relação ao MPF, "possivelmente por ter sido acionado por improbidade administrativa".
A Folha transmitiu a Gilmar Mendes as principais críticas das procuradoras. O ministro preferiu não fazer comentários. O TRF-3 não quis se manifestar.
Placas
O encerramento da ação penal no caso das placas foi decidido por maioria pela 2ª Turma do STF. Em votação anterior, por unanimidade, a turma negara o trancamento de ação igual contra a juíza Adriana Soveral.
Agora, ao julgar o pedido de Casem Mazloum, aceitou que não houve adulteração das placas, mas uso indevido de placas fornecidas pelo Detran. O benefício concedido a Mazloum foi estendido a todos os réus. "A decisão repõe as coisas nos seus devidos lugares, afastando o arbítrio", disse o advogado Alberto Zacharias Toron, que fizera a defesa oral da juíza Soveral.
No julgamento anterior, Mendes entendera que o fato tipificava crime, e acompanhara a ministra relatora, Ellen Gracie.
A relatora sustentou que o TRF e o STJ haviam admitido que "a substituição de placas comuns por placas reservadas configura alteração de sinal identificador externo do veículo automotor". Ou seja, que a conduta se ajusta ao crime previsto no artigo 311 do Código Penal" [reclusão de três a seis anos e multa, pena aumentada em um terço quando cometido por servidor público].
"A julgar pelas palavras do ministro Mendes, a relatora é 'covarde', pois tem reafirmado tratar-se de conduta típica retirar-se a placa do veículo, lacrado pelo Detran, e colocar outra, o que permite cometer infrações de trânsito e até crimes sem que se possa identificar o condutor", diz Ana Lúcia.
Mendes citou os desembargadores Peixoto Júnior e Alda Basto, do TRF-3, ao acolher a alegação de que Casem Mazloum "não remarcou nem adulterou placas".
"Não se está aqui a apoiar atuação irregular de magistrado", afirmou Mendes, ao dizer que os atos poderiam configurar irregularidade administrativa, não justificando ação penal. No voto, pediu "escusas" por haver negado habeas corpus, antes, à juíza Soveral.
Gravações
Nos diálogos gravados da Operação Anaconda, Rocha Mattos orienta policiais para forjar respostas em sindicância da Polícia Federal sobre as placas. O juiz pediu ao agente federal César Herman Rodriguez cópia de recurso contra multas, explicando que não tinha mais placa reservada.
Interrogado no TRF, Rocha Mattos disse que, ele mesmo, quebrava o lacre do Detran, "coisa de bandido", segundo sua mulher.
Em dezembro de 2004, Ascari, Frischeisen e Amaral já haviam considerado um "desrespeito" ao TRF e ao STJ o fato de o Supremo, a partir de voto de Mendes, haver excluído o juiz Ali Mazloum do processo da Anaconda no dia em que o caso estava sendo julgado em São Paulo. O habeas corpus fora impetrado quatro meses antes e a denúncia havia sido mantida, por unanimidade, pelo STJ.
Mendes considerou que havia "imputações vagas" na denúncia contra Ali Mazloum --acusado de usar serviços prestados pela quadrilha da Anaconda para obter vantagens. O ministro concordou com a alegação da defesa de que a denúncia era "genérica", por atribuir ao magistrado "participação peculiar na quadrilha".
Em seu voto, Mendes citou outros casos da Anaconda, "cuja lembrança chega a ser constrangedora". O primeiro, "uma denúncia que beirava às raias da total irresponsabilidade e que o ministro Celso de Mello classificou de 'bizarra': o MPF denunciara Casem Mazloum por falsidade porque, numa declaração de renda à Receita Federal, dizia possuir US$ 9 mil no Afeganistão, enquanto na cópia entregue ao tribunal informava que o dinheiro estava no Brasil. O STF aceitou a alegação de "erro de digitação", tese rejeitada pelo TRF e pelo STJ.
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