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06/03/2004
-
06h18
REINALDO JOSÉ LOPES
da Folha de S.Paulo
Pesquisadores da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) deram o primeiro passo para desenvolver uma terapia gênica contra o glaucoma, uma das mais importantes causas de cegueira no mundo. Com a ajuda de um trecho de DNA carregado por vírus, eles conseguiram proteger células da retina da degeneração que causa a moléstia.
Os testes ainda estão restritos ao tubo de ensaio, como faz questão de frisar o médico Rafael Linden, 52, do Instituto de Biofísica da UFRJ: "Ainda estamos longe de uma terapia gênica propriamente dita", afirma. No entanto, a equipe parece ter encontrado uma forma de prevenir a chamada apoptose, ou morte celular programada, dos neurônios da retina afetados pelo glaucoma.
A especialidade de Linden e seus colegas é justamente o estudo da neurodegeneração --os processos que acabam mandando células nervosas desta para uma melhor numa série de doenças. Com sua intrincada rede de conexões nervosas, a retina é usada pela equipe para entender como tais mecanismos ocorrem.
Expulsão do núcleo
E foi ao investigar a morte dos neurônios que uma então aluna de doutorado de Linden topou com algumas proteínas, conhecidas coletivamente como fatores de transcrição, que eram expulsas do núcleo dessas células durante o processo de apoptose.
Os fatores de transcrição são peças fundamentais da maquinaria das células e poderiam ser comparados (para quem ainda se lembra dessas coisas) à agulha que passa sobre um disco de vinil. Nesse caso, no entanto, em vez da informação musical contida nos sulcos do disco, os fatores de transcrição permitem que a informação genética do DNA seja passada para sua molécula-irmã, o RNA mensageiro, e daí para as proteínas, que realmente fazem as coisas acontecerem nas células.
"O que nós descobrimos é que um desses fatores de transcrição, chamado max, era expulso no comecinho da apoptose, sai do núcleo muito cedo. Aparentemente, essa expulsão não é uma conseqüência, mas um dos fatores que causam todo o processo de morte celular", explica Linden. A conseqüência era clara: será que uma overdose de max não impediria o gatilho fatal do processo?
Foi o que o grupo passou a tentar explorar, com a ajuda de um vírus conhecido como adeno-associado, muito usado em diversos testes de terapia gênica porque é incapaz de provocar doenças ou de infectar sistemicamente o organismo. Esse cavalo-de-tróia molecular carregava o trecho de "letras" químicas de DNA que é a receita para a produção do max.
Os pesquisadores inocularam o vírus na retina de camundongos sadios e, depois de 15 dias, sacrificaram os animais e passaram a examinar o que acontecia com as células ganglionares, as mais afetadas pelo glaucoma, cuja função é carregar o estímulo visual da retina para o cérebro através do chamado nervo óptico.
"A superexpressão [produção aumentada] do max foi capaz de proteger essas células da degeneração in vitro", conta Linden. Quando comparadas com os neurônios de camundongos que não tinham recebido o tratamento genético, as células ganglionares modificadas morriam menos e não tinham alterações físicas.
A médio prazo, diz Linden, os resultados são animadores o suficiente para se pensar numa terapia gênica experimental. O próximo passo dos pesquisadores é aplicar o protocolo em camundongos vivos que tenham desenvolvido uma forma de glaucoma e repetir o processo na retina de porcos, que são considerados bons modelos experimentais para uma série de males humanos.
Só então é que pacientes humanos poderiam participar da pesquisa, alerta o pesquisador. Outra questão que precisa ser pensada com o máximo de calma é a da segurança. Sempre há o risco de que a inserção de DNA na célula se dê de forma a criar problemas para o genoma (o conjunto dos genes) e até causar novas doenças.
UFRJ aposta em geneterapia para glaucoma
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da Folha de S.Paulo
Pesquisadores da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) deram o primeiro passo para desenvolver uma terapia gênica contra o glaucoma, uma das mais importantes causas de cegueira no mundo. Com a ajuda de um trecho de DNA carregado por vírus, eles conseguiram proteger células da retina da degeneração que causa a moléstia.
Os testes ainda estão restritos ao tubo de ensaio, como faz questão de frisar o médico Rafael Linden, 52, do Instituto de Biofísica da UFRJ: "Ainda estamos longe de uma terapia gênica propriamente dita", afirma. No entanto, a equipe parece ter encontrado uma forma de prevenir a chamada apoptose, ou morte celular programada, dos neurônios da retina afetados pelo glaucoma.
A especialidade de Linden e seus colegas é justamente o estudo da neurodegeneração --os processos que acabam mandando células nervosas desta para uma melhor numa série de doenças. Com sua intrincada rede de conexões nervosas, a retina é usada pela equipe para entender como tais mecanismos ocorrem.
Expulsão do núcleo
E foi ao investigar a morte dos neurônios que uma então aluna de doutorado de Linden topou com algumas proteínas, conhecidas coletivamente como fatores de transcrição, que eram expulsas do núcleo dessas células durante o processo de apoptose.
Os fatores de transcrição são peças fundamentais da maquinaria das células e poderiam ser comparados (para quem ainda se lembra dessas coisas) à agulha que passa sobre um disco de vinil. Nesse caso, no entanto, em vez da informação musical contida nos sulcos do disco, os fatores de transcrição permitem que a informação genética do DNA seja passada para sua molécula-irmã, o RNA mensageiro, e daí para as proteínas, que realmente fazem as coisas acontecerem nas células.
"O que nós descobrimos é que um desses fatores de transcrição, chamado max, era expulso no comecinho da apoptose, sai do núcleo muito cedo. Aparentemente, essa expulsão não é uma conseqüência, mas um dos fatores que causam todo o processo de morte celular", explica Linden. A conseqüência era clara: será que uma overdose de max não impediria o gatilho fatal do processo?
Foi o que o grupo passou a tentar explorar, com a ajuda de um vírus conhecido como adeno-associado, muito usado em diversos testes de terapia gênica porque é incapaz de provocar doenças ou de infectar sistemicamente o organismo. Esse cavalo-de-tróia molecular carregava o trecho de "letras" químicas de DNA que é a receita para a produção do max.
Os pesquisadores inocularam o vírus na retina de camundongos sadios e, depois de 15 dias, sacrificaram os animais e passaram a examinar o que acontecia com as células ganglionares, as mais afetadas pelo glaucoma, cuja função é carregar o estímulo visual da retina para o cérebro através do chamado nervo óptico.
"A superexpressão [produção aumentada] do max foi capaz de proteger essas células da degeneração in vitro", conta Linden. Quando comparadas com os neurônios de camundongos que não tinham recebido o tratamento genético, as células ganglionares modificadas morriam menos e não tinham alterações físicas.
A médio prazo, diz Linden, os resultados são animadores o suficiente para se pensar numa terapia gênica experimental. O próximo passo dos pesquisadores é aplicar o protocolo em camundongos vivos que tenham desenvolvido uma forma de glaucoma e repetir o processo na retina de porcos, que são considerados bons modelos experimentais para uma série de males humanos.
Só então é que pacientes humanos poderiam participar da pesquisa, alerta o pesquisador. Outra questão que precisa ser pensada com o máximo de calma é a da segurança. Sempre há o risco de que a inserção de DNA na célula se dê de forma a criar problemas para o genoma (o conjunto dos genes) e até causar novas doenças.
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