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05/04/2005 - 09h46

Grupos trocam farpas sobre dano a fóssil de "hobbit"

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REINALDO JOSÉ LOPES
da Folha de S.Paulo

Pelo visto, o "hobbit" de 18 mil anos cuja existência foi revelada ao público no ano passado passou por tantas peripécias quanto os personagens homônimos da saga "O Senhor dos Anéis". O fóssil acaba de voltar às mãos de seus legítimos descobridores, mas a equipe está acusando um laboratório rival de ter danificado partes preciosas do espécime.

A criatura, que atende pelo nome científico de Homo floresiensis, é um hominídeo de apenas 1 m da altura (daí sua comparação com o povo pequeno de "O Senhor dos Anéis") e habitou a ilha de Flores, na Indonésia, onde pode ter até convivido com seres humanos modernos durante milhares de anos.

A descrição de sua anatomia singular, feita por uma equipe liderada pelo paleoantropólogo Peter Brown, da Universidade da Nova Inglaterra em Armidale (Austrália), foi publicada em outubro último na revista científica britânica "Nature" e despertou o interesse unânime dos estudiosos da evolução humana.

Afinal, se Brown e seus colegas estivessem certos, a criatura seria não apenas o último hominídeo a desaparecer da Terra antes do domínio completo do Homo sapiens, mas também o primeiro a sofrer o fenômeno do encolhimento por ter ficado restrito a uma pequena ilha (é algo registrado em várias outras espécies de mamífero).

Além disso, restos de fogueiras, artefatos e mastodontes-pigmeus (uma forma anã do elefante primitivo Stegodon) indicam que o cérebro do H. floresiensis, embora tivesse o tamanho do de um chimpanzé moderno, foi suficiente para que ele fabricasse instrumentos complexos e caçasse em grupo.

Esqueleto "emprestado"

A euforia da equipe de Brown foi por água abaixo em novembro, quando entrou em cena Teuku Jacob, 75, o mais importante paleoantropólogo indonésio e pesquisador da Universidade Gadjah Mada em Yogyakarta.

Depois de criticar as conclusões dos descobridores do fóssil e argumentar que se tratava apenas de um humano normal com microcefalia (doença que causa cérebros diminutos), Jacob levou os restos do "hobbit" e dos outros indivíduos da mesma espécie para o próprio laboratório --segundo o grupo, sem permissão.

Armou-se uma verdadeira novela em torno da devolução do fóssil, até que Jacob permitiu que ele fosse levado de volta ao Centro Indonésio de Arqueologia, em Jacarta, no fim de fevereiro.

Agora, Brown e seu colega, o arqueólogo Michael Morwood, declararam à revista "Science" que a passagem pelo laboratório do indonésio danificou seriamente a pelve (os ossos do quadril) e o crânio do hominídeo.

Segundo Morwood, parte da pelve foi "esmigalhada", enquanto, numa tentativa de fazer um molde do crânio e da mandíbula do espécime, houve fragmentação e perda de detalhes anatômicos.

Muito frágil, o fóssil foi preservado em terreno pantanoso e é mole. Morwood afirma que Jacob também tentou fazer um molde de uma segunda mandíbula, que "se quebrou durante o processo e foi colada de forma errada, desalinhada e com perda significativa de osso". O indonésio nega.

"Temos fotografias, tiradas durante o último dia, e [os fósseis] não estão danificados", disse Jacob à "Science", sugerindo que os problemas surgiram durante o transporte dos fósseis.

Especialistas ouvidos pela Folha saíram em defesa do cientista indonésio: "Ele é um dos mais experientes paleoantropólogos do mundo. Portanto, essas alegações são calúnia pura", avalia Christoph Zollikofer, da Universidade de Zurique (Suíça), especialista em reconstruções virtuais de hominídeos.

"De fato, os fósseis são muito frágeis, e é impensável que Jakob não soubesse disso. Um dos problemas é que, depois da descoberta, nem todas as medidas possíveis foram tomadas para preservar esses achados."

"Duvido que o dano tenha sido intencional. Mas é claro que é justificável que fiquemos revoltados com o que aconteceu a esse espécime", diz o paleoantropólogo Scott Simpson, da Universidade Case Western Reserve (EUA).

Independente de onde ou como aconteceu, Peter Brown lamenta: "O mais importante é que, desde o começo, o fóssil era frágil demais para ser removido. Nunca deveria ter saído de Jacarta", diz o pesquisador australiano.

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