Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
17/08/2005 - 08h45

Paladar exigente extinguiu mastodontes, diz pesquisa

Publicidade

REINALDO JOSÉ LOPES
da Folha de S.Paulo

As mães que arrancam os cabelos na tentativa de fazer as crianças comerem de tudo acabam de ganhar um aliado melhor que o bicho-papão nessa tarefa: os mastodontes sul-americanos, que se extinguiram há mais de 10 mil anos. Segundo um novo estudo, esses paleoelefantes só não estão mais por aqui porque deixaram de comer de tudo e se fixaram em poucos tipos de guloseima.

A tese foi apresentada durante o 2º Congresso Latino-Americano de Paleontologia de Vertebrados, realizado na semana passada no Rio de Janeiro. "Claro, é só uma hipótese", admitiu à Folha José Luis Prado, da Universidade Nacional do Centro, na Argentina. "Mas certamente é mais promissora do que dizer que a extinção foi causada pela ação humana." A idéia é que os gigantes viraram fãs de um único tipo de planta e não conseguiram mudar a dieta quando a vegetação se modificou.

O jeito mais correto de se referir aos mastodontes sul-americanos é chamá-los de gonfotérios. Trata-se de um grupo aparentado aos elefantes atuais que colonizou vários continentes antes de se extinguir, no fim da Era do Gelo, ou Pleistoceno, como também é chamada pelos cientistas.

As formas sul-americanas --três espécies, conhecidas como Cuvieronius hyodon, comum nos Andes; Stegomastodon waringi, presente em regiões mais tropicais, como o Brasil; e S. platensis, mais sulina-- vieram parar aqui vindas da América do Norte. Prado e seus colegas avaliam que sua origem esteja, em última instância, na China. Todos tinham mais ou menos o tamanho de um elefante asiático moderno. O S. waringi brasileiro exibia, no entanto, presas quase retas.

Há basicamente duas maneiras de determinar a dieta de um animal extinto: por meio da forma e tamanho de seus dentes ou examinando a composição deles. Como o primeiro método parece estar mais sujeito a erro do que os pesquisadores gostariam, Prado e sua colega Maria Teresa Alberdi, do Museu Nacional de Ciências Naturais da Espanha, decidiram verificar a presença de determinados isótopos (variantes) do elemento químico carbono nos dentes dos bichos.

O processo pelo qual tais isótopos se acumulam ali é simples: o carbono que compõe o alimento de origem vegetal é usado para "construir" o dente do animal. Acontece, no entanto, que os isótopos de carbono vêm em duas formas principais, o carbono-12 e o carbono-13. Mais importante: a proporção das variantes muda de acordo com o tipo de planta.

De versátil a enjoado

A maioria dos vegetais em forma de árvore, assim como diversas gramíneas de folha mais macia, são apelidadas de plantas C3 de acordo com esse critério, enquanto as gramíneas tropicais e temperadas, mais "duras", são plantas C4. O que os pesquisadores viram é que, no começo do Pleistoceno, os mastodontes sul-americanos eram herbívoros sem frescura, consumindo ambos os tipos de planta, a julgar pela proporção dos isótopos nos dentes.

"Eram basicamente como um elefante africano, que come praticamente tudo o que vê", compara Prado. Os dados vieram de 68 espécimes dos bichos, oriundos do Brasil, do Chile, da Argentina, da Bolívia e do Equador.

Aliás, de acordo com Prado, foi isso que permitiu a migração dos animais para a América do Sul, enquanto os mamutes, seus parentes, continuaram restritos ao norte do istmo do Panamá. Ele diz acreditar que os mamutes eram pastadores especializados, o que lhes impediu de atravessar regiões de vegetação mais fechada. "Nesse caso, o Panamá teria funcionado como uma barreira", afirma.

No entanto, parece que os gonfotérios acabaram adotando a dieta pouco balanceada dos mamutes ao longo do Pleistoceno. "As formas mais tardias mostram uma especialização muito maior na dieta", diz. Quando as condições climáticas se alteraram de vez no fim desse período, a vegetação teria assumido uma feição diversificada, com pouca comida para os especialistas.

Para Prado, a chegada dos primeiros seres humanos ao continente (já havia pessoas no Chile há pelo menos 12,5 mil anos) pode ter contribuído para a extinção, mas certamente não foi o fator decisivo para sua ocorrência.

O congresso, que reuniu 300 pesquisadores de todo o mundo, foi organizado pelo Museu Nacional e patrocinado pela Petrobras.

Especial
  • Leia o que já foi publicado sobre mastodontes
  •  

    Publicidade

    Publicidade

    Publicidade


    Voltar ao topo da página