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21/08/2006
-
09h06
CLAUDIO ANGELO
Editor de Ciência da Folha de S.Paulo
Pergunte ao físico André Geim o que o levou a criar o grafeno, uma nova forma de carbono descoberta há apenas dois anos e que já promete revolucionar a microeletrônica. Sem um pingo de constrangimento, o diretor do Centro de Nanotecnologia da Universidade de Manchester, no Reino Unido, responderá: despeito.
"Não é um sentimento bonito, certo? Mas nós olhamos para as pessoas que fazem nanotubos de carbono, que conseguem resultados tão bacanas e tanto dinheiro por eles, e pensamos: será que podemos fazer alguma coisa só por despeito, só para irritá-los?" --recorda-se.
Dessa brincadeira nasceu um material que todas as previsões teóricas julgavam impossível de obter: uma folha de dimensões nanoscópicas (um nanômetro é um milionésimo de milímetro) composta só de átomos de carbono e com propriedades quase mágicas, que agora começam a ser estudadas.
"As teorias diziam que um filme de carbono com um átomo de espessura jamais poderia ser estável", diz Geim. "Mas, se acreditássemos em tudo o que os teóricos dizem, não teríamos chegado aonde chegamos."
O grafeno, filme de carbono ultrafino, foi descrito em outubro de 2004 por Geim e sete colegas num estudo na revista "Science". Já existem pelo menos 20 grupos de pesquisa experimental dedicados a ele no mundo. A última de suas peripécias acaba de ser revelada: foi observado nesse material um fenômeno que se achava que só acontecesse em buracos negros.
Mesmo sendo tão jovem, o grafeno já é um dos materiais mais cotados para substituir o silício na fabricação dos chips de computador no futuro.
Não só o silício: por ser de obtenção barata, ele também pode aposentar precocemente os nanotubos de carbono, considerados o material-maravilha da nanotecnologia --e que têm rendido os tais resultados bacanas que Geim tanto despeitava.
"O que quer que você possa fazer com os nanotubos você pode fazer com o grafeno", afirmou o cientista à Folha.
Por aí passa principalmente a fabricação de circuitos que possam fazer a indústria microeletrônica continuar por mais um tempo seguindo a lei de Moore --segundo a qual o número de transistores em um chip dobra a cada 18 meses. Essa regra vem sendo cumprida desde os anos 1960 pelos fabricantes de chips de silício. Mas o silício não é infinitamente miniaturizável: ele perde estabilidade na escala nanoscópica.
Os nanotubos de carbono foram durante algum tempo considerados uma alternativa promissora da nanotecnologia ao silício, por funcionarem bem quando este rateia.
O problema é que a tecnologia para produzir os tubinhos é sofisticada e cara demais. Além disso, é difícil fazer nanotubos homogêneos, condição necessária para a produção de chips.
O grafeno tem uma vantagem sobre o silício de funcionar melhor quanto menor a folha. Apesar de ser feito apenas de carbono, o material se comporta como um metal, conduzindo eletricidade virtualmente sem perdas --ao passo que, no silício e em outros semicondutores, os elétrons se chocam uns contra os outros, dissipando energia em forma de calor. "Essa é uma das descobertas mais notáveis sobre o grafeno: ele permanece um metal mesmo na ausência de portadores de carga [elétrons]", diz.
O efeito faz parte das esquisitices da física quântica, que rege o mundo do muito pequeno. E pode significar tanto uma bênção quanto uma desvantagem para o novo material. Afinal, transistores precisam ligar e desligar para produzir os "zeros" e "uns" que codificam a informação num chip. O grafeno, por sua vez, não desliga nunca.
"Nada pode bater o silício nos próximos 15 anos", afirma Geim. "Mas podemos cortar o nanofios de grafeno para fazer um semicondutor, por exemplo", diz. "Não há nenhuma barreira fundamental. É só uma questão de trabalho."
Veja imagens do grafeno no site onnes.ph.man.ac.uk
Especial
Leia o que já foi publicado sobre nanotubos de carbono
Material chamado grafeno desponta como candidato ao lugar do silício
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Editor de Ciência da Folha de S.Paulo
Pergunte ao físico André Geim o que o levou a criar o grafeno, uma nova forma de carbono descoberta há apenas dois anos e que já promete revolucionar a microeletrônica. Sem um pingo de constrangimento, o diretor do Centro de Nanotecnologia da Universidade de Manchester, no Reino Unido, responderá: despeito.
"Não é um sentimento bonito, certo? Mas nós olhamos para as pessoas que fazem nanotubos de carbono, que conseguem resultados tão bacanas e tanto dinheiro por eles, e pensamos: será que podemos fazer alguma coisa só por despeito, só para irritá-los?" --recorda-se.
Dessa brincadeira nasceu um material que todas as previsões teóricas julgavam impossível de obter: uma folha de dimensões nanoscópicas (um nanômetro é um milionésimo de milímetro) composta só de átomos de carbono e com propriedades quase mágicas, que agora começam a ser estudadas.
"As teorias diziam que um filme de carbono com um átomo de espessura jamais poderia ser estável", diz Geim. "Mas, se acreditássemos em tudo o que os teóricos dizem, não teríamos chegado aonde chegamos."
O grafeno, filme de carbono ultrafino, foi descrito em outubro de 2004 por Geim e sete colegas num estudo na revista "Science". Já existem pelo menos 20 grupos de pesquisa experimental dedicados a ele no mundo. A última de suas peripécias acaba de ser revelada: foi observado nesse material um fenômeno que se achava que só acontecesse em buracos negros.
Mesmo sendo tão jovem, o grafeno já é um dos materiais mais cotados para substituir o silício na fabricação dos chips de computador no futuro.
Não só o silício: por ser de obtenção barata, ele também pode aposentar precocemente os nanotubos de carbono, considerados o material-maravilha da nanotecnologia --e que têm rendido os tais resultados bacanas que Geim tanto despeitava.
"O que quer que você possa fazer com os nanotubos você pode fazer com o grafeno", afirmou o cientista à Folha.
Por aí passa principalmente a fabricação de circuitos que possam fazer a indústria microeletrônica continuar por mais um tempo seguindo a lei de Moore --segundo a qual o número de transistores em um chip dobra a cada 18 meses. Essa regra vem sendo cumprida desde os anos 1960 pelos fabricantes de chips de silício. Mas o silício não é infinitamente miniaturizável: ele perde estabilidade na escala nanoscópica.
Os nanotubos de carbono foram durante algum tempo considerados uma alternativa promissora da nanotecnologia ao silício, por funcionarem bem quando este rateia.
O problema é que a tecnologia para produzir os tubinhos é sofisticada e cara demais. Além disso, é difícil fazer nanotubos homogêneos, condição necessária para a produção de chips.
O grafeno tem uma vantagem sobre o silício de funcionar melhor quanto menor a folha. Apesar de ser feito apenas de carbono, o material se comporta como um metal, conduzindo eletricidade virtualmente sem perdas --ao passo que, no silício e em outros semicondutores, os elétrons se chocam uns contra os outros, dissipando energia em forma de calor. "Essa é uma das descobertas mais notáveis sobre o grafeno: ele permanece um metal mesmo na ausência de portadores de carga [elétrons]", diz.
O efeito faz parte das esquisitices da física quântica, que rege o mundo do muito pequeno. E pode significar tanto uma bênção quanto uma desvantagem para o novo material. Afinal, transistores precisam ligar e desligar para produzir os "zeros" e "uns" que codificam a informação num chip. O grafeno, por sua vez, não desliga nunca.
"Nada pode bater o silício nos próximos 15 anos", afirma Geim. "Mas podemos cortar o nanofios de grafeno para fazer um semicondutor, por exemplo", diz. "Não há nenhuma barreira fundamental. É só uma questão de trabalho."
Veja imagens do grafeno no site onnes.ph.man.ac.uk
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