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23/02/2007 - 10h08

Datação enterra tese sobre o 1º americano

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CLAUDIO ANGELO
Editor de Ciência da Folha de S.Paulo

O caixão da teoria mais longeva já proposta sobre a ocupação das Américas acaba de receber seu último prego. Um estudo publicado hoje mostra que os chamados sítios Clovis, nos EUA, não só não são a mais antiga evidência da presença humana no continente como nem ao menos têm a idade que se achava que tivessem: são quase meio milênio mais novos.

O paradigma Clovis First ("primazia de Clovis", em inglês) foi proposto por arqueólogos dos EUA a partir da década de 1930. O modelo sustentava que os avós dos índios eram caçadores de mamute que vieram a pé da Ásia durante a Era do Gelo --quando havia uma ponte terrestre entre os dois continentes-- e se dispersaram rápido pela América do Norte e depois pela América do Sul.

A travessia teria ocorrido há cerca de 11.500 anos, data de um sítio no Novo México (EUA) onde pontas de lança de pedra características foram achadas associadas a ossos de mamute. O nome do sítio, Clovis, acabou batizando o povo que teria inventado aquelas pontas de projétil.

A falta de sítios mais antigos que Clovis na América do Norte e um certo imperialismo acadêmico dos arqueólogos americanos em rejeitar evidências apresentadas por pesquisadores sul-americanos acabou transformando a história dos caçadores especializados de mamute em paradigma.

O modelo jazia insepulto pelo menos desde o fim da década de 1990. Naquela época, arqueólogos dos próprios EUA começaram a reconhecer a validade de sítios mais antigos que Clovis na América do Sul e até mesmo nos EUA.

Um deles, Monte Verde (na Patagônia Chilena), tem 12.500 anos e é hoje universalmente reconhecido como a mais antiga ocupação humana das Américas, embora outros ainda mais antigos continuem disputando esse posto.

Não é preciso ser um grande matemático para perceber que, se os humanos alcançaram a Patagônia (a última porção de continente a ser ocupada pelo Homo sapiens) há 12.500 anos, a primeira ocupação não poderia datar de 11.500 anos.

"Há claramente uma mudança, [mas] o paradigma ainda tem alguns proponentes que não largam o osso", disse à Folha Tom Dillehay, arqueólogo da Universidade Vanderbilt (Tennessee, EUA) que estudou e datou Monte Verde.

Revisão

Mas mesmo esses proponentes indemovíveis deverão ter dificuldade para se explicar depois do estudo que os americanos Michael Waters e Thomas Stafford Jr. publicam na capa da edição de hoje da revista científica americana "Science".

Waters, da Universidade A&M do Texas, e Stafford, dono do laboratório de datação mais respeitado dos EUA, resolveram revisitar os sítios Clovis e datar seus materiais com precisão, por meio de duas técnicas (medição do carbono-14 e espectrometria de massa).

A dupla obteve datações para 25 sítios escavados nos anos 1960 e 1970, quando a tecnologia ainda não era tão avançada.

O tira-teima revelou, primeiro, que a cultura Clovis é bem mais jovem do que se imaginava: ela começou há 11.050 anos. E não durou mais do que 300 anos, tendo se extinguido por volta de 10.800 anos atrás.

Migração de idéias

Segundo Waters, uma duração tão curta tornaria impossível a essa cultura ter se dispersado por 14.000 km de continente americano.
"Não faz nenhum sentido antropológico que esse povo pudesse se mover tão depressa", afirmou Waters em um comunicado à imprensa. "Isso sugere que populações humanas já estavam no Novo Mundo antes de Clovis", escreveu.

Waters propõe que a dispersão rápida dos artefatos Clovis tenha sido análoga à de outras grandes invenções americanas, como o jeans e o iPod: o produto original (no caso, uma tecnologia para fabricar pontas de lança que eram superiores às existentes antes de Clovis) era tão bom que simplesmente passou a ser fabricado em outras regiões --sem que seus inventores precisassem, eles próprios, ocupar a América toda.

Dillehay diz que considera o estudo bem-vindo, mas que seus autores não fizeram nada mais do que se curvar aos fatos. "Depois que a preponderância dos dados alcançou Waters e Stafford, eles quiseram dar um passo à frente e dizer o que outros têm dito e demonstrado há 30 anos", alfineta.

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