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23/09/2001 - 13h01

Livro: Físico especula sobre futuro da ciência e da tecnologia

SALVADOR NOGUEIRA
da Folha de S.Paulo

Escrever sobre o futuro é sempre muito divertido -que o diga Steven Spielberg. Mas escrever com propriedade é tremendamente mais complicado do que redigir o roteiro de um filme de ficção científica. Para estabelecer o que antecipa para os próximos cem anos, Michio Kaku, físico do City College de Nova York e especialista na inovadora e até agora especulativa teoria das supercordas, não buscou inspiração em contos de ficção, mas nas expectativas de mais de 150 especialistas de diferentes áreas do conhecimento. Entre os consultados, gente de renome, como Walter Gilbert, Carl Sagan, Paul Ehrlich, Francis Collins e Freeman Dyson.

O resultado desses bate-papos de cientista para cientista é "Visões do Futuro: Como a Ciência Revolucionará o Século 21". No livro, Kaku busca dividir a evolução da ciência e suas aplicações tecnológicas subsequentes em três grandes "revoluções": a informática, a biomolecular e a quântica. Todas são unidas por um único fio -o crescente desvendamento das propriedades da nanoescala, ou seja, das coisas cuja ordem de grandeza se aproxima da atômica.

Além de esquadrinhar o avanço em três grandes áreas, o pesquisador também divide sua obra pelo tempo -cada uma das revoluções apresenta previsões divididas entre aquelas que valem para até 2020, as que ficam entre 2020 e 2050 e as que só surgirão na segunda metade do século 21. E o admirável nanomundo novo pintado pelo pesquisador é, provavelmente, bom demais para ser verdade.

Na área informática, diz Kaku, a miniaturização e o barateamento dos circuitos eletrônicos faria com que cada objeto que nos cerca se integrasse conosco e com os demais por meio de computadores minúsculos instalados em toda parte. Esses objetos trocariam informações uns com os outros o tempo todo e antecipariam as necessidades humanas. É a idéia da "casa inteligente", que cuida do seu dono, levada às últimas consequências.

No campo da biotecnologia, Kaku relata o potencial médico gerado pelo sequenciamento do genoma humano e o desenvolvimento da engenharia genética, com a criação de clones e transgênicos. A batalha contra as doenças seria travada no interior de cada célula, cortando o mal pela raiz, sem deixar vestígios. A tal da "medicina personalizada" entraria em cena, em que drogas feitas especialmente com base no genoma de alguém teriam efeito letal para as doenças, mas inócuo para o organismo. Na outra ponta, clones e transgênicos forneceriam produtividade sem precedentes para a agropecuária, numa revolução capaz de acompanhar o crescimento populacional sem precedentes.

Finalmente, no campo da física quântica, o cientista descreve as evoluções que levarão à expansão do homem no espaço, com novas e inovadoras tecnologias de propulsão, o que em última análise permitiria que a espécie sobrevivesse à destruição de seu próprio planeta -marcada para acontecer em 5 bilhões de anos, quando o Sol se tornar uma gigante vermelha e engolir os quatro planetas internos do Sistema Solar.

Além disso, o cientista fala das maravilhas da física teórica, como a possibilidade de buracos de verme (atalhos entre diferentes regiões do Universo) e viagens no tempo. Para completar, Kaku puxa a sardinha para seu lado ao analisar o impacto da teoria das supercordas, que daria aos seres humanos a condição de "senhores do espaço e do tempo".

Visões românticas Apesar da redação agradável e empolgante, nada devendo às mais criativas e divertidas especulações da ficção científica, duas coisas incomodam nas "visões" de Kaku. Primeiro, o otimismo exacerbado, para não dizer tendencioso. Na verdade, as três revoluções trazem tantos pesadelos para o homem quantos são os sonhos descritos pelo cientista.

Embora dedique certo espaço para comentar os problemas trazidos pelas novas tecnologias, ele em geral é reticente e superficial ao tratar delas, passando a impressão de que, de algum modo, esses problemas não serão incômodos no futuro. Veja o que ele tem a dizer sobre o impacto da clonagem humana, um dos grandes temores enfrentados pela sociedade atual: "Apesar da controvérsia gerada pela clonagem, o impacto social desses clones pode vir a ser desprezível. As pessoas aprenderão que os poucos clones existentes provavelmente não representarão uma ameaça à sociedade".

O segundo incômodo vem do fato de o livro, escrito em 1997, já apresentar, em apenas quatro anos, algumas previsões erradas, para mais ou para menos. A decodificação do genoma é prevista para 2005, e já foi concluída no ano passado; os genes humanos são estimados em 100 mil, e já se sabe que são pouco mais da metade disso; a Estação Espacial Internacional, segundo Kaku, fica pronta em 2002, e hoje se sabe que a data é, na melhor das hipóteses, 2004.

Apesar disso, o livro traz uma fonte rica de prováveis desdobramentos científicos dos próximos cem anos, muitos dos quais certamente vão acontecer. E trata-se de uma obra interessante e detalhada. Aos leitores fica só um conselho: nos trechos em que as "visões" são um tanto quanto míopes, use óculos.

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Visões do futuro de Michio Kaku
458 págs. R$ 50
Editora Rocco (rua Rodrigo Silva, 26, 5º andar, 20011-040, RJ, tel.: 0/xx/21/507-2000)
 

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