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10/10/2001 - 07h35

Cientista da USP tenta produzir técnica que rendeu Nobel a físicos

CLAUDIO ANGELO
da Folha de S.Paulo

O físico Sérgio Ricardo Muniz, do Departamento de Óptica da USP de São Carlos, está comemorando o Nobel de Física quase tanto quanto os seus três ganhadores. Ex-aluno de Eric Cornell em Boulder, Muniz deve se tornar, até o começo do ano que vem, o primeiro pesquisador a produzir o condensado de Bose-Einstein no Brasil.

A obtenção desse estado esdrúxulo da matéria faz parte do projeto de doutorado de Muniz. É um passo complicado. Mas é só um passo. A idéia do físico é produzir um condensado misto de átomos de rubídio (gás usado pela equipe de Boulder) e de sódio (usado por Wolfgang Ketterle no MIT) e observar como os átomos se comportam nessa mistura. Ninguém fez isso até agora.

"Uma vez um professor meu comparou a condensação de Bose-Einstein à fusão a frio", lembra Muniz, 27, referindo-se a uma das maiores buscas da física, que nunca funcionou na prática. "É claro que ele estava errado. Mas aprendemos que esse é um sistema muito delicado, difícil de obter."

Para reproduzir o experimento que ganhou o Nobel, Muniz conta com uma ajuda de peso: seu orientador, Vanderlei Bagnato, foi um dos primeiros cientistas a prever a possibilidade de realizar a condensação em condições de laboratório, nos anos 80.

Bagnato, 42, é um dos pioneiros no estudo de átomos frios. Companheiro de Eric Cornell no MIT durante o doutorado, sua especialidade é confinar átomos em armadilhas magnéticas e de laser, princípio que está na base da condensação de Bose-Einstein.

Há quatro anos, aplicou as armadilhas ("atom traps", em inglês) para construir o primeiro relógio atômico brasileiro.

O físico brasileiro já estava o confinamento de átomos nos EUA as armadilhas foram criadas pelo grupo do americano William Phillips (Nobel de 1997).

Até então, a condensação de Bose-Einstein, prevista em 1924, era um fenômeno lindo, mas restrito aos livros. Seu principal pré-requisito era resfriar átomos de um gás a um bilionésimo de Kelvin (1 Kelvin corresponde a -273C). Só a essa temperatura extremamente baixa, próxima do zero absoluto, é que os átomos atingiriam o chamado estado de transição, quando passariam a oscilar da mesma maneira -comportando-se como um único átomo. E nem o mais delirante dos físicos imaginaria poder fazer isso.

Barril de melaço

Com a armadilha de lasers, no entanto, abria-se uma nova possibilidade para os físicos teóricos que buscavam o condensado. Espremendo os átomos entre feixes de laser seria possível acalmar suas vibrações, reduzindo, portanto, a sua temperatura.

"É mais ou menos como jogar uma pessoa que está se debatendo num barril de melaço", compara Muniz. Sem espaço para se mexer, os átomos acabam perdendo velocidade. "Aprisionando muitos átomos, você aumenta a densidade deles e abaixa a temperatura até o ponto inicial [do processo de condensação]", afirma.

Bagnato se deu conta disso e, em 1987, publicou um artigo com dois outros pesquisadores, onde previa as potenciais propriedades de um gás condensado e dizia que a condensação de Bose-Einstein poderia ser obtida em laboratório, graças à ferramenta desenvolvida por Phillips, Steven Chu e Claude Cohen-Tannoudji. O artigo foi citado por Cornell, Wieman e Ketterle em seus trabalhos originais sobre a condensação.

Em 1996, num outro trabalho teórico, Bagnato e colegas ajudaram a determinar o ponto em que os átomos frios passam a se comportar como um condensado.

Como não dá para pôr um termômetro dentro da amostra, é preciso avaliar a velocidade e o estado de agrupamento dos átomos para inferir a sua temperatura. A condensação se dá a partir de um certo estado de agrupamento. Usando -mais uma vez- um laser, é possível fazer a imagem do perfil do estado de agrupamento e dizer se houve condensação.

"É como lançar um flash sobre a amostra", exemplifica Muniz. O laser vai registrar a imagem de uma curva com a forma de um pico, cuja altura indica o estado de agrupamento. O que Bagnato e seus colegas fizeram foi calcular o perfil dessa curva -a "assinatura" do condensado de Bose-Einstein- e como varia a distribuição dos átomos nos diferentes estágios de agrupamento.

Bagnato afirmou que o Nobel de 2001 é uma continuação do de 1997. "Eu me sinto valorizado com o prêmio", afirmou Bagnato. "Posso dizer que minha área de pesquisa foi contemplada com dois prêmios Nobel em quatro anos", disse o físico à Folha. "Entender o átomo não é algo velho."
 

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