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27/10/2001
-
08h06
editor de Ciência da Folha de S.Paulo
Para quem acha que ciência nada tem a ver com cultura, o teatro contemporâneo pode oferecer uma boa medida do erro cometido. Depois do sucesso da peça "Copenhague", sobre os físicos Niels Bohr e Werner Heisenberg, estréia hoje em Londres "Oxigênio", escrita pelos químicos Carl Djerassi e Roald Hoffmann.
Djerassi tem chance de ser mais conhecido do público que nada sabe sobre o mundo da pesquisa, muito menos sobre química. Ele é o "pai" da pílula anticoncepcional. E também romancista de sucesso (teve lançado no Brasil, pela editora Nova Fronteira, "O Dilema de Cantor", uma boa narrativa sobre competição e confiança no recesso dos laboratórios).
Já de Hoffmann poucos se lembrarão, pois faz 20 anos que ganhou o Prêmio Nobel de Química (com Kenichi Fukui), por suas teorias sobre o transcurso das reações. Mas há uma conexão com o Brasil: Hoffmann é o responsável pela reiterada indicação do bioquímico tcheco-brasileiro Otto Richard Gottlieb ao Nobel.
Disputa pela precedência
É dessa láurea, aliás, que trata "Oxigênio", peça que já teve uma leitura pública no Brasil (em 18 de setembro, no Rio). O enredo é imaginoso, ainda que inverossímil: no centenário da criação do Nobel (este ano, 2001), seus organizadores decidem conceder um prêmio retroativo de Química, a ser escolhido por um grupo de quatro cientistas suecos (três homens e uma mulher).
O comitê decide premiar a descoberta do oxigênio, e aí começam os problemas. Surgem logo três nomes: o pastor britânico Joseph Priestley (1733-1804), o boticário sueco Carl Wilhelm Scheele (1742-1786) e o químico francês Antoine-Laurent Lavoisier (1743-1794), também um especialista em impostos que morreria executado durante a fase do Terror da Revolução Francesa.
Lavoisier é considerado o iniciador da química moderna, entre outras razões pelo princípio da conservação (aquele segundo o qual na natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma). Na peça, ele é suspeito de ter usado informação não-publicada de Scheele para produzir o "gás do fogo", que depois batizaria como "oxigênio" (da raiz grega para "ácido", no qual Lavoisier acreditava haver sempre o elemento).
O comitê se debate com o problema da precedência para decidir se premia todos ou só um ou dois deles. A ação no palco se divide com uma suposta reunião dos três em 1777, na Suécia, em que cada um deve tentar convencer o rei de que fora o autor da descoberta. Como na reunião de Bohr e Heisenberg em "Copenhague", presenciada por Margaretha, suas mulheres têm função central na trama da peça.
No Brasil
A leitura na Casa da Ciência da UFRJ, em setembro, foi organizada pelo produtor e ator Carlos Palma, que já havia encenado "Copenhague", "Einstein" (em que atuou como o próprio) e "Da Vinci" (um espetáculo infantil), tendo como co-produtora Adriana Caruí. Só "Einstein" teve público de mais de 40 mil pessoas, em três anos.
Palma não se decidiu ainda quanto a montar "Oxigênio", na qual vê "dificuldades dramatúrgicas". Com efeito, a leitura da versão traduzida por Fernando Paz revela que o texto só se torna mais interessante a partir da metade. "Em teatro, [você" tem de provocar as pessoas, para elas ficarem atentas", diz Palma, 47. "[A peça" demora para acontecer. Depois de "Einstein" e "Copenhague", a gente precisa ter muito critério."
Apesar disso, vê qualidades no texto. "A temática é muito legal, novidade. A questão da vaidade dos cientistas, isso nos interessa. Mas são seis atores, fica caro." Palma calcula que a produção consumiria perto de R$ 300 mil, como "Copenhague".
Os outros espetáculos que está considerando também se relacionam com ciência. Um é "Arcadia", de Tom Stoppard, que aborda a teoria do caos. Outro é um texto sobre Charles Darwin que está sendo escrito por Murilo Dias César, um autor paulista. "No Brasil, poucas pessoas escrevem sobre ciência", queixa-se Palma.
"Oxigênio" dá novo fôlego a teatro científico
MARCELO LEITEeditor de Ciência da Folha de S.Paulo
Para quem acha que ciência nada tem a ver com cultura, o teatro contemporâneo pode oferecer uma boa medida do erro cometido. Depois do sucesso da peça "Copenhague", sobre os físicos Niels Bohr e Werner Heisenberg, estréia hoje em Londres "Oxigênio", escrita pelos químicos Carl Djerassi e Roald Hoffmann.
Djerassi tem chance de ser mais conhecido do público que nada sabe sobre o mundo da pesquisa, muito menos sobre química. Ele é o "pai" da pílula anticoncepcional. E também romancista de sucesso (teve lançado no Brasil, pela editora Nova Fronteira, "O Dilema de Cantor", uma boa narrativa sobre competição e confiança no recesso dos laboratórios).
Já de Hoffmann poucos se lembrarão, pois faz 20 anos que ganhou o Prêmio Nobel de Química (com Kenichi Fukui), por suas teorias sobre o transcurso das reações. Mas há uma conexão com o Brasil: Hoffmann é o responsável pela reiterada indicação do bioquímico tcheco-brasileiro Otto Richard Gottlieb ao Nobel.
Disputa pela precedência
É dessa láurea, aliás, que trata "Oxigênio", peça que já teve uma leitura pública no Brasil (em 18 de setembro, no Rio). O enredo é imaginoso, ainda que inverossímil: no centenário da criação do Nobel (este ano, 2001), seus organizadores decidem conceder um prêmio retroativo de Química, a ser escolhido por um grupo de quatro cientistas suecos (três homens e uma mulher).
O comitê decide premiar a descoberta do oxigênio, e aí começam os problemas. Surgem logo três nomes: o pastor britânico Joseph Priestley (1733-1804), o boticário sueco Carl Wilhelm Scheele (1742-1786) e o químico francês Antoine-Laurent Lavoisier (1743-1794), também um especialista em impostos que morreria executado durante a fase do Terror da Revolução Francesa.
Lavoisier é considerado o iniciador da química moderna, entre outras razões pelo princípio da conservação (aquele segundo o qual na natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma). Na peça, ele é suspeito de ter usado informação não-publicada de Scheele para produzir o "gás do fogo", que depois batizaria como "oxigênio" (da raiz grega para "ácido", no qual Lavoisier acreditava haver sempre o elemento).
O comitê se debate com o problema da precedência para decidir se premia todos ou só um ou dois deles. A ação no palco se divide com uma suposta reunião dos três em 1777, na Suécia, em que cada um deve tentar convencer o rei de que fora o autor da descoberta. Como na reunião de Bohr e Heisenberg em "Copenhague", presenciada por Margaretha, suas mulheres têm função central na trama da peça.
No Brasil
A leitura na Casa da Ciência da UFRJ, em setembro, foi organizada pelo produtor e ator Carlos Palma, que já havia encenado "Copenhague", "Einstein" (em que atuou como o próprio) e "Da Vinci" (um espetáculo infantil), tendo como co-produtora Adriana Caruí. Só "Einstein" teve público de mais de 40 mil pessoas, em três anos.
Palma não se decidiu ainda quanto a montar "Oxigênio", na qual vê "dificuldades dramatúrgicas". Com efeito, a leitura da versão traduzida por Fernando Paz revela que o texto só se torna mais interessante a partir da metade. "Em teatro, [você" tem de provocar as pessoas, para elas ficarem atentas", diz Palma, 47. "[A peça" demora para acontecer. Depois de "Einstein" e "Copenhague", a gente precisa ter muito critério."
Apesar disso, vê qualidades no texto. "A temática é muito legal, novidade. A questão da vaidade dos cientistas, isso nos interessa. Mas são seis atores, fica caro." Palma calcula que a produção consumiria perto de R$ 300 mil, como "Copenhague".
Os outros espetáculos que está considerando também se relacionam com ciência. Um é "Arcadia", de Tom Stoppard, que aborda a teoria do caos. Outro é um texto sobre Charles Darwin que está sendo escrito por Murilo Dias César, um autor paulista. "No Brasil, poucas pessoas escrevem sobre ciência", queixa-se Palma.
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