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21/11/2001 - 09h17

Enzima denuncia tendência à hipertensão, diz cientista brasileiro

RAFAEL GARCIA
da Folha de S.Paulo

As pessoas com hipertensão ou tendência a desenvolvê-la poderão ser identificadas por meio de um simples exame de urina, dentro de poucos anos, se um grupo de pesquisadores brasileiros comprovar a conclusão sugerida em uma série de estudos.

O método, idealizado pela pesquisadora Dulce Casarini, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), surgiu após a descoberta de que uma das variações da ECA (enzima conversora de angiotensina) estava presente em ratos hipertensos. O estudo está na capa deste mês da revista "Pesquisa" (revistapesquisa.fapesp.br), da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), que o financiou.

A ECA, uma das substâncias que regulam o processo bioquímico da pressão arterial, atua convertendo a proteína angiotensina 1 em angiotensina 2. Essa conversão contribui para que as artérias se contraiam. Normalmente, essa reação ocorre sob uma frequência controlada no organismo, ao lado de reações com outras enzimas que promovem a dilatação. Um desequilíbrio pode provocar a hipertensão.

Fazendo testes nos roedores, Casarini e sua equipe provaram que uma variedade específica da molécula aparecia em todos os indivíduos hipertensos. A pesquisa também envolve a Ufes (Universidade Federal do Espírito Santo).

A enzima que pode vir a servir como marcadora da hipertensão é a ECA de 90 kDa (kilodaltons, unidades de massa molecular). Não se sabe ainda, porém, qual é exatamente o papel dela no processo. "A hipertensão é uma doença multifatorial, e há muitos aspectos para analisar", diz.

De um jeito ou de outro, tudo indica que o estudo da pesquisadora caminha para mostrar que a molécula é uma forma segura e viável de identificar a tendência à hipertensão. "Existem diversos estudos que trabalham com outros marcadores. Esse [a ECA de 90 kDa" tem chance de ganhar uma importância grande na literatura médica", diz Casarini.

Contraprovas

A molécula estudada difere de outras duas ECAs, as de 65 e 190 kDa, presentes tanto em indivíduos comuns como em hipertensos. A ECA de 90 KDa seria, então, um diferencial.

Para provar que a lógica bioquímica observada nos ratos vale também para seres humanos, pesquisadores da Unifesp já começaram a analisar dados obtidos com amostras de urina retiradas de 1.600 pessoas, em Vitória (ES), e fazer novos experimentos com ratos. Apesar da incidência de 100% da molécula nos roedores hipertensos, ainda não é possível afirmar com segurança que ela seja um marcador.

"Parece loucura, mas é assim", diz o pesquisador José Eduardo Krieger, do Incor (Instituto do Coração), um dos parceiros de Casarini na pesquisa. Como forma de confirmação, Krieger conduz estudos de cruzamentos entre ratos para tentar obter um animal que produza a ECA de 90 kDa e não seja hipertenso. "Até agora, não conseguimos nenhum", diz.

Os pesquisadores também pretendem fazer estudos envolvendo amostra maior de voluntários (superior a 5.000 indivíduos) para conhecer a incidência da molécula na população em geral.

Patentes

Até agora, Casarini não enviou o resultado de seus estudos sobre a ECA para revistas científicas, a fim de evitar que suas descobertas sejam aproveitadas por outros pesquisadores antes que ela própria as tenha concluído. Só depois de encaminhar pedidos de patente para o teste de urina, que detecta a molécula como forma de identificar os hipertensos, é que a pesquisadora decidiu fazer uma divulgação preliminar pela imprensa não-especializada.

A pesquisa está reunida em oito trabalhos, seis dos quais já prontos (os outros devem ser concluídos no início de 2002). Depois disso, os trabalhos devem ser enviados para publicação em conjunto.

José Eduardo Krieger, que participou da pesquisa nas áreas de genética e biologia molecular, deve ser um ator-chave do projeto em suas próximas etapas. Para estudar o mecanismo bioquímico da ECA de 90 kDa, o pesquisador pretende usar uma linhagem de ratos transgênicos que produzam apenas essa variedade de ECA, para observar sua evolução.

Os animais geneticamente modificados devem ser criados em colaboração com Lygia da Veiga Pereira, do Instituto de Biociências da USP, criadora do primeiro animal geneticamente modificado do Brasil, um camundongo.

"Como a hipertensão é uma doença que envolve diversos fatores genéticos e ambientais, às vezes a contribuição de uma molécula para a doença, mesmo que ela seja um marcador, é pequena", diz Krieger. "Ainda não sabemos se a ECA de 90 kDA é um "ator" ou um "espectador" desse processo."
 

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