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18/12/2001 - 09h22

Cientista critica reação a plano de metas

RAFAEL GARCIA
da Folha de S.Paulo

A discussão sobre estratégias científicas de longo prazo tem de se manter à margem das disputas políticas. Essa é a opinião do professor José Galizia Tundisi, coordenador da controversa comissão de avaliação das unidades de pesquisa do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), que concluiu seu relatório há três meses.

"O local para discutir é na academia, entre os pesquisadores. Quando você traz os políticos para dentro do processo, existem outros interesses que não os genuínos da pesquisa e da ciência", disse, criticando cientistas que buscaram apoio de parlamentares para protestar contra sugestões da comissão.

Tundisi, presidente do Instituto Internacional de Ecologia, de São Carlos (SP), coordenou durante um ano a comissão que elaborou propostas de longo prazo para a política científica nacional. O grupo foi criticado por alguns pesquisadores, que vêem no Relatório Tundisi ameaças à estrutura de pós-graduação dos institutos do MCT e a depreciação da pesquisa básica, para favorecimento da pesquisa aplicada.

A maior parte das críticas partiu do ON (Observatório Nacional), do CBPF (Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas) e do Mast (Museu de Astronomia e Ciências Afins). "Com relação a esses três institutos, nós achamos que seria muito mais rentável para a pós-graduação que essas áreas tivessem uma interação com as universidades. Se os institutos de pesquisa têm cursos de pós que não são "top" de linha no Brasil, precisam ser reformulados", diz.

"Nós queremos que o CBPF seja o CBPF que foi 30 anos atrás, com papel de alta relevância."

O professor afirma que a transferência de cursos não significa que as unidades de pesquisa do MCT vão deixar de formar recursos humanos. "Eles podem abrir espaço de laboratório para estudantes que estejam fazendo pós nas universidades. Isso é comum na Europa. Jamais a comissão escreveu que não se deve fazer pós-graduação nos institutos", diz.

Segundo ele, a mudança de cursos para a universidade não foi a solução apontada em todos os casos. "Por que nós não recomendamos, por exemplo, transferir a pós do Impa [Instituto de Matemática Pura e Aplicada] para a universidade? Porque é o melhor curso da América Latina", diz.

"Alguns cursos dos institutos têm réplicas na universidade, mas eles têm o papel de fornecer outro tipo de formação, que a universidade não está oferecendo: cursos de especialização avançados nas fronteiras da ciência."

Ciência básica x aplicada

Outra reclamação comum dos cientistas é que a comissão teria servido aos planos do ministério de reduzir recursos da ciência básica para aumentar a verba destinada à ciência aplicada, relacionada a pesquisas com demanda mais imediata.

"Quando se fala em estratégia, podem pensar que você está direcionando todo o processo para o mercado e para pesquisas tecnológicas, mas não é verdade. Estratégias podem ser astronomia, área espacial, nanotecnologia ou biotecnologia. As áreas de prospecção do relatório dão muito mais peso à pesquisa básica do que à pesquisa aplicada", diz.

Para Tundisi, a reação é fruto da insatisfação de alguns pesquisadores por outros motivos. "O que há é uma confusão, talvez proposital, por parte de alguns que leram o relatório e dizem que, quando se fala em pesquisa estratégica, se considera que essa é pesquisa aplicada de interesse imediato para o país. É também, mas não é só isso."

Questionado se o motivo para a reação dos pesquisadores seria o fato de o relatório sugerir menor autonomia para alguns institutos, Tundisi negou. Para ele, o fato de encaixar o CBPF, por exemplo, nos moldes de um instituto com metas definidas pelo ministério não vai restringir a área de ação de seus pesquisadores.

Tundisi nega que o relatório tenha como intenção extinguir áreas de ciência básica, como a astronomia, como afirmam alguns pesquisadores do Observatório Nacional. "Vários astrônomos do ON estão manifestando interesse em sair. Então, quem é que quer tirar a astronomia do ON?", afirma o professor.

"A questão da liberdade de pesquisa é relativa, porque você pode ter um grande tema de pesquisa assinalado pelo instituto e dentro dele caber o trabalho de muitos pesquisadores. Não haveria interferência em pesquisas individuais", diz. "O que não dá para pensar é que todo instituto do ministério faça exatamente o que achar que deve fazer. Para isso, existe a universidade."

Defasagem de salários

Segundo ele, a polêmica criada em institutos onde alguns pesquisadores são contra sugestões "pontuais" ofuscou as recomendações mais importantes do relatório. "Há a questão da defasagem de salários, que é séria. Há a questão da idade média dos pesquisadores, porque é preciso ter um fluxo de pesquisadores jovens. Em muitos casos tem de recompor o orçamento dos institutos."

Para Tundisi, outro problema grave que o país ainda tem de resolver é a falta de pesquisadores em áreas estratégicas, como a Amazônia e partes do litoral.
 

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