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04/01/2002 - 04h38

Brasileiros rompem fio de ouro virtual

SALVADOR NOGUEIRA
da Folha de S.Paulo

Usando simulações de computador, três pesquisadores brasileiros conseguiram fornecer a mais detalhada perspectiva do processo de formação de uma corrente de ouro composta por uma única fileira de átomos. Aos olhos de cientistas, nunca o ouro teve tanto valor, ainda que virtual.

A façanha rendeu aos brasileiros, no último dia 17, a capa da "Physical Review Letters", mais importante publicação especializada de física.
Alguns dos resultados desse trabalho já haviam sido apresentados em julho pelo líder da pesquisa, Adalberto Fazzio, durante a reunião anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), em Salvador, como noticiou na época a Folha.

"O artigo que sai agora na "PRL" contém mais resultados do que os que foram apresentados em Salvador", diz Antônio José Roque da Silva, que trabalha com Fazzio na USP. A dupla pesquisou com Edison Zacarias da Silva, do Instituto de Física da Unicamp.

O estudo detalha como se comportam os átomos de ouro quando esticados até formar um único fio, que só se rompe após formar uma cadeia de até cinco átomos enfileirados.

Pode parecer mera curiosidade desvendar os passos exatos desse processo, mas o trio de pesquisadores aposta que tal conhecimento será fundamental para o futuro desenvolvimento da nanotecnologia (equipamentos cujo tamanho é medido em nanômetros, ou milionésimos de milímetro, e que poderiam, em princípio, atuar até mesmo dentro de células vivas).

Esquentar e bater
A idéia é usar o aprendizado obtido nas simulações para desenvolver novos materiais, evitando assim o custoso e lento processo de tentativa e erro. "A metalurgia usava o método de misturar os componentes, esquentar, bater, esticar etc., que em inglês se chama "heat and beat".
Hoje podem-se projetar virtualmente, no computador, novos materiais e depois ir ao laboratório produzi-los", dizem os pesquisadores brasileiros.

Para nanomateriais, que envolvem o comportamento de átomos individuais, a situação é um pouco mais complicada. "É preciso ter muita confiança de que as leis básicas da mecânica quântica realmente têm poder preditivo."

O que as simulações com nanofios de ouro mostram é que a mecânica quântica tem esse poder. Os resultados que eles obtiveram no computador são muito semelhantes aos obtidos experimentalmente em laboratório, embora nenhum dos dados obtidos pela prática tenha sido usado como parâmetro para a simulação.

"Na simulação, não incluímos nenhum dado experimental", diz Antônio da Silva. "Os únicos ingredientes são os tipos de átomo que participam do problema."

Comportamento detalhado
A simulação brasileira tem outro destaque: ela faz uso de descrições do comportamento dos elétrons, coisa que normalmente os físicos não usam, a fim de simplificar o trabalho matemático.

"Tradicionalmente essa informação é descrita de forma aproximada, com a dinâmica dos elétrons embutida nela. Ou seja, rearranjos eletrônicos que ocorrem quando os átomos estão se movendo não são descritos", diz.

"Na nossa simulação, o problema eletrônico é resolvido a cada passo, e as forças quânticas, calculadas. Isso dá informação mais detalhada e mais rica sobre o comportamento do sistema."

Numa simulação é mais fácil manipular variáveis e obter resultados diferentes, ou mesmo reduzir ou acelerar o "tempo virtual", para observar o que acontece. Esse seria um passo crucial para entender melhor o comportamento das partículas e desenvolver nanomateriais no computador.

"Nós identificamos o mecanismo que leva à constrição e depois à quebra do nanofio, uma contribuição que pode ajudar os [físicos] experimentais a entender melhor processos envolvidos na evolução de um nanofio sob tensão", diz Edison Zacarias da Silva.

Criar moléculas em computador antes de produzir no mundo não é exatamente uma novidade. Ao aplicar isso à nanotecnologia, os cientistas apostam no modelo que deu certo na farmacologia.

"Nessa área, o projeto virtual de novos fármacos encurtou o processo de desenvolvimento de certos remédios em alguns anos. Alguns remédios do coquetel usado para pacientes com HIV são um exemplo recente disso", diz.

O estudo de nanofios de ouro, em especial, parece promissor. O trio especula que eles poderão ser a base para a construção de contatos elétricos para nanomáquinas.
 

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