Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
03/02/2002 - 15h04

Répteis do Mesozóico eram considerados canibais desde século 18

JOSÉ REIS
especial para a Folha de S.Paulo

Da Universidade de Bristol e autor de recente tratado sobre paleontologia dos vertebrados, Michael Benton afirma que os naturalistas vitorianos pintavam os ictiossauros como terríveis feras com acentuada tendência para o canibalismo. Os ictiossauros eram répteis aquáticos externamente parecidos com golfinhos e viveram durante o Mesozóico, entre 243 e 65 milhões de anos passados. Foi a era do esplendor dos grandes répteis, inclusive os dinossauros.

A difundida idéia do canibalismo dos ictiossauros ganhou força quando em 1749 Georg Friedrich von Jaeger descobriu o primeiro desses fósseis com um fóssil muito menor dentro de sua caixa torácica, que ele mesmo não percebeu. Os paleontólogos dividiram-se quanto à natureza do pequeno fóssil incluso, entendendo uns que se tratava de mera presa, enquanto outros o encaravam como filhote do fóssil maior. Neste último caso os ictiossauros seriam vivíparos, isto é, não poriam ou chocariam ovos, mas criariam dentro de um oviduto os seus filhotes. Na maioria dos répteis a procriação ocorre por meio de ovos postos e desenvolvidos na terra.

O primeiro ictiossauro com fóssil menor enclausurado dentro da caixa das costelas provinha de Holzmaden, perto de Stuttgart, na Alemanha. Essa região é muito rica nesse tipo de fósseis com formas novas incluídas. Um naturalista alemão, Wilhelm von Branca, publicou em 1908 uma tentativa de explicação das formas inclusas: elas deveriam ser animais capturados pelo ictiossauro predador. Essa idéia teve grande aceitação e se espalhou largamente entre os naturalistas e o público, sendo ainda acolhida nos livros de história natural.

Estudo recente de Roland Böttcher, do museu de história natural de Stuttgart, parece ter vindo encerrar o domínio dessa hipótese. Böttcher deve ter desferido golpe mortal na idéia do canibalismo. As formas jovens, incluídas nos ictiossauros, são para ele indubitavelmente filhotes nascidos e criados no interior das fêmeas, concluiu ele após minuciosos exames especializados.

São muito raros os indícios de que os antigos répteis devorassem membros de sua própria espécie. Só se conhece um exemplo bem documentado desse fato: o esqueleto adulto de um Coelophysis descoberto no Novo México em 1947, com 220 milhões de anos de idade.

As investigações de Böttcher também não deixam dúvida quanto à viviparidade dos ictiossauros. Aliás, essa capacidade parece ter sido fundamental para eles, uma vez que, gerando os filhotes nas próprias entranhas, não poderiam tê-los na água, por estarem organizados para a vida aérea. Os filhotes morreriam afogados dentro das mães. Os répteis modernos de hábitos aquáticos põem os ovos na areia, para onde se dirigem na época da desova.

Imagina Böttcher que o oviduto dos ictiossauros provavelmente se dilatava durante a gestação e ocupava ambos os lados da caixa das costelas até perto da cintura escapular. Eles deviam alimentar-se de moluscos, como lulas e polvos, ficando o estômago, o coração e os pulmões perto da parte inferior do esqueleto. Os filhotes muito pequenos ficam enrolados, como se contidos na membrana de um ovo, enquanto os maiores ficam arrumados longitudinalmente ao longo da coluna vertebral e são alimentados pelo organismo materno através de uma placenta primitiva. É o que ensina Böttcher, baseado em suas muitas pesquisas.
 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página