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28/06/2002 - 06h52

Transgênico pode afetar plantios a 3 km

SALVADOR NOGUEIRA
da Folha de S.Paulo

A primeira pesquisa que retrata os efeitos de plantios transgênicos de escala comercial sobre os campos adjacentes está sendo divulgada hoje, com uma boa e uma má notícia. Ela mostrou que pólen de canola com resistência a um tipo de herbicida pode se espalhar por um raio de até três quilômetros, mas sua presença acaba sendo bem pouco significativa.

Até para a União Européia, que tem regras estritas sobre a classificação de conteúdo transgênico, a contaminação em campos adjacentes à plantação geneticamente modificada seria desprezível.

Os europeus exigem, para classificar um produto como não-transgênico, que menos de 1% de seu conteúdo apresente traços de manipulação genética. No caso dos campos analisados agora na Austrália, o que sofreu maior impacto teve uma taxa de contaminação de 0,2%. Na média de todos os 63 campos analisados (dos quais 40 apresentaram alguma contaminação), o número é menor ainda: cerca de 0,07%.

Em compensação, se alguém ainda pretende defender que campos convencionais adjacentes estão 100% seguros ao lado de uma plantação transgênica, pode tirar o cavalinho da chuva. Os cientistas detectaram transferência de genes (pelo pólen das plantas) a até três quilômetros da plantação original. E pode até chegar mais longe que isso. "A distância que o pólen viaja depende de muitos fatores ambientais", diz Mary Rieger, da Universidade de Adelaide, uma das autoras do estudo, que teve financiamento das companhias gigantes de biotecnologia Monsanto e Aventis.

Não houve detecção de contaminação a mais de três quilômetros, mas o número de campos analisados além desse ponto foi limitado. "Teria sido bom medir mais campos a distâncias maiores, mas não foi possível", diz.

Apesar das limitações, o estudo foi um verdadeiro "tour de force" para os pesquisadores —mais de 48 milhões de plantas foram analisadas. "Levou cerca de 12 meses para coletar todos os dados e cultivar as plantas no campo. Comecei isso em 2000 e estou publicando na metade de 2002", afirma.

Gato escaldado
Originalmente, a pesquisadora pretendia publicar seus resultados na revista científica britânica "Nature". O tópico "transgênicos" andou quente no periódico nos últimos tempos, em razão de uma polêmica sobre a contaminação de milho convencional com DNA modificado no México, onde existe o maior número de variedades da planta. Um estudo foi publicado na revista apontando a contaminação. Alguns membros da comunidade científica atacaram os resultados com unhas e dentes, levando a "Nature" à atitude sem precedentes de rejeitar publicamente um estudo que ela mesma havia publicado.

Como gato escaldado tem medo de água fria, a revista britânica preferiu não abraçar essa nova pesquisa. "Eu tentei publicar a pesquisa na 'Nature', mas não tive sucesso", diz Rieger. "Mas como achei que a pesquisa era bem importante resolvi tentar em outras publicações de alto impacto." O estudo está sendo publicado hoje na "Science" (www.sciencemag.org), revista americana que rivaliza com a "Nature" em prestígio.

Parece, mas não é
Embora o estudo seja importante na análise do comportamento dos transgênicos em plantios comerciais, ele não foi feito com organismos desse tipo. As plantações de canola usadas como referência eram resistentes a um tipo de herbicida (ALS), mas a resistência foi gerada por mutagênese (a indução de mutações no DNA de um organismo) e não por transgenia (a transferência de um gene de outra espécie à planta, dando-lhe alguma característica que antes ela não tinha).

Mesmo assim, os pesquisadores consideram que dá na mesma para avaliar o quanto os genes derivados de transgênicos poderiam se espalhar por outras plantações. "Não há evidência científica de que plantios transgênicos e não-transgênicos se comportem de forma diferente", afirma Rieger.

De uma forma ou de outra, a principal utilidade do estudo é ser referência para que os órgãos reguladores estabeleçam limites mais seguros de separação entre plantios transgênicos e convencionais. "Eles também podem usar os dados para estabelecer os níveis de contaminação aceitáveis em plantios não-GM [geneticamente modificados]", diz Rieger.
 

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