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10/10/2002 - 08h07

Prêmio Nobel sai para "fotos" de proteínas

SALVADOR NOGUEIRA
da Folha de S.Paulo, no Rio

As pesquisas que renderam o Prêmio Nobel de Química para John Fenn, Koichi Tanaka e Kurt Wüthrich não responderam a nenhuma questão fundamental da ciência. Mas ofereceram técnicas que tornam a busca por essas respostas tangível. Seus avanços estão permitindo desvendar nada menos que a mais complexa rede de interações químicas conhecida, a que compõe o fenômeno conhecido como vida.

O americano Fenn, da Virginia Commonwealth University, e o japonês Tanaka, da empresa Shimadzu Corp., dividiram metade do prêmio (que corresponde, no total, a cerca de US$ 1 milhão) por desenvolverem dois métodos diferentes, mas bem parecidos, para identificar determinadas proteínas em uma solução pela medição do peso das moléculas.

O suíço Wüthrich, do Instituto Federal de Tecnologia da Suíça, faturou sozinho os outros US$ 500 mil, por ter inventado um modo de determinar o formato exato de uma proteína -que não é exatamente simples, como se pode ver no quadro à direita.

A palavra mágica dos três trabalhos é uma só: "proteínas". Não por acaso. Afinal, as proteínas são as complexas moléculas responsáveis por praticamente tudo que acontece em organismos vivos, desde a formação e a composição até a regulação e o funcionamento. Elas são montadas dentro do corpo com base na informação contida nos genes, e é a forma específica que adquirem depois de construídas que determina como (e se) vão atuar na célula.

A identificação da presença de proteínas específicas de um câncer, por exemplo, pode denunciar a ação de um tumor bem antes que ele se torne um problema incontornável. Isso sem falar nos possíveis usos no estudo de substâncias potencialmente nocivas ao organismo e no desenvolvimento de novos remédios. Fenn e Tanaka foram os responsáveis por tudo isso ser possível.

O peso das proteínas
Os dois criaram um método para tornar as proteínas "pesáveis". Como cada uma deve ter um peso mais ou menos particular, dependendo dos átomos que a compõem, por esse índice é possível identificar qual delas é qual.

Meios de "pesar" moléculas já eram velhos conhecidos dos cientistas. Eles faziam isso por meio da técnica conhecida como espectrometria de massa, que consiste em ionizar a molécula a ser "pesada" (arrancar ou doar elétrons, dando a ela carga positiva ou negativa) e então submetê-la a um campo elétrico, que faz com que ela se desloque. Graças a essa "assinatura", composta por quanto ela interage com o campo elétrico e pela velocidade com que se desloca, é possível identificá-la.

Acontece que a técnica não funcionava bem com proteínas, pois ninguém sabia como ionizá-las sem ao mesmo tempo destruí-las. A inovação de Fenn, em 1988, foi conseguir o efeito de ionização recobrindo superficialmente a proteína de uma substância ácida a partir de um jato líquido "disparado" por um campo elétrico. A técnica é conhecida como ionização por eletrospray.

No mesmo ano, Tanaka obteve o mesmo efeito de ionização, mas, em vez de usar um spray líquido, usou um gás. E, para dispará-lo, em vez de um campo elétrico, usou a energia de um laser.

Já Wüthrich fez algo que parecia ainda mais complicado: definir a complexa forma de um proteína sem ser capaz de vê-la. Ele obteve esse resultado usando ressonância nuclear magnética. Inventou um método que usava o estudo dos sinais emitidos pela interação de átomos em uma molécula para determinar em que lugar, na proteína, estava cada átomo de hidrogênio. A partir dessa informação, com um modelo matemático, tornou possível prever a forma completa da molécula -o que foi feito pela primeira vez em 1985.

As técnicas premiadas apontam todas uma única direção: a proteômica. Considerada o futuro da biologia molecular, essa ciência pretende investigar as interações entre as proteínas do organismo. Em vez de estudar o código dos genes, melhor é investigar o que eles codificam, em plena ação, defendem os entusiastas da proteômica. Muitos a apontam como o próximo passo, depois do furor genômico dos últimos anos.

Para isso, as ferramentas de Fenn, Tanaka e Wüthrich são fundamentais. "O impacto que Galileu teve com seu telescópio no entendimento do Sistema Solar é o que essas ferramentas devem ter, no nível da biologia molecular", diz Carlos Bloch, pesquisador da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária).

"Eu entendo que essa área é a que vai revolucionar as ciências da vida", diz Jorge Guimarães, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, presidente da Sociedade Brasileira de Bioquímica e Biologia Molecular.

 

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