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23/01/2003 - 09h41

Dino de quatro "asas" explica vôo nas aves

CLAUDIO ANGELO
Editor-assistente de Ciência da Folha de S.Paulo

Um dinossauro esquisito de 130 milhões de anos e quatro "asas" pode ser a resposta para a questão da origem do vôo nas aves. A aposta é de cientistas chineses, que apresentam o achado hoje.

O animal, cujos fósseis foram encontrados num estado excepcional de preservação, não impressiona pelo tamanho: com apenas 77 centímetros de comprimento, recebeu o apropriado nome de Microraptor gui.

A grandeza do fóssil está no fato de ele ter penas adaptadas para o vôo tanto nas patas da frente quanto nas de trás, uma característica inédita, que sugere ter sido ele o primeiro dino capaz de voar —planando entre árvores.

"Tenho descrito muitas espécies de dinossauro com penas, mas fiquei realmente animado com esse. Era um animal completamente inesperado", disse à Folha, por telefone, o paleontólogo Xing Xu, da Academia Chinesa de Ciências. Ele e quatro colegas apresentaram o novo dinossauro hoje, na revista científica "Nature" (www.nature.com). No trabalho, comunicam ainda a descoberta de cinco outros fósseis. "Todos têm quatro asas", disse Xu.

Idéia antiga

O fóssil do M. gui foi comprado pelo grupo de Xu em 2001, durante uma expedição à província de Liaoning. A região teve diversos vulcões no passado, o que facilitou a preservação dos fósseis —os animais eram aprisionados nas cinzas. Ali têm sido descobertos vários restos de dinossauros emplumados, o que ajudou a confirmar a tese de que as aves modernas evoluíram a partir de um grupo de dinossauros bípedes, o dos dromeossaurídeos.

O que ninguém sabia, no entanto, era como o grupo começou a voar. O fóssil da ave mais primitiva do mundo, o Archaeopteryx, sugeria que o vôo tivesse se originado "de baixo para cima", ou seja, de animais corredores cujas patas dianteiras viraram asas.

Uma hipótese concorrente foi proposta em 1915 pelo ornitólogo e explorador americano William Beebe, mais famoso por ter sido o primeiro homem a mergulhar no oceano a bordo de uma esfera oca de metal (em 1930).

Beebe propôs que os ancestrais das aves tivessem sido seres de quatro "asas", que, em vez de ter vôo autônomo, planavam entre as árvores como fazem hoje algumas espécies de esquilo. Para ele, o vôo teria surgido "de cima para baixo". Foi preciso esperar 88 anos para que se encontrasse uma evidência a favor da hipótese.

"Nem os dromeossauros basais [mais primitivos, portanto, mais próximos das aves], nem o próprio Archaeopteryx tinham penas nas pernas, o que favorecia a hipótese do vôo de baixo para cima", afirmou o paleontólogo Max Langer, da USP de Ribeirão Preto.

Segundo Xu, o esqueleto do Microraptor gui não deixa dúvidas: o animal tinha penas longas e de tamanhos diferentes tanto nas patas traseiras quanto nas dianteiras (veja foto no alto, à direita). Essa assimetria, presente nas asas das aves modernas —mas não nas patas de outros dinos— é um indicativo de que as penas fossem realmente usadas pelo animal para algo parecido com vôo.

"A primeira coisa que pensei ao vê-las foi: 'É de verdade?' Achei que se tratasse de um problema de preparação do fóssil", disse o pesquisador chinês.

Para ele, o achado indica que o ancestral comum das aves e dos dromeossauros era um animal pequeno, de quatro patas, que morava em árvores e planava usando quatro falsas asas. Durante a evolução, os pássaros perderam as penas nas pernas e desenvolveram asas verdadeiras.

Caso único?

Apesar de se dizer empolgado com a descoberta, Langer não vai tão longe. Para o brasileiro, o fato de uma espécie ter essa adaptação para planar não significa que todas as aves tenham evoluído a partir de um dinossauro de quatro "asas". "Ele parece uma linhagem à parte. Não indica que os ancestrais diretos das aves tenham tido penas nas pernas", afirmou.

Ainda segundo Langer, no entanto, o fóssil do Microraptor gui é emblemático pelo seu comportamento: trata-se de um dromeossaurídeo primitivo que morava em árvores —um habitat insuspeito para dinossauros, que eram animais terrestres.

"Todos os dromeossauros basais que se conhece eram corredores. Encontrar um bicho claramente arborícola traz a necessidade de uma reinterpretação."
 

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