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Atenção,
candidatos: uma idéia óbvia para combater a
violência
Metade
das mortes entre jovens de São Paulo, Rio de Janeiro
e Pernambuco são provocadas por assassinatos; a média
nas capitais, nessa faixa etária, é de 43%.
Esse dado faz parte de estudo divulgado na semana passada
pela Unesco, realizado com base nas estatísticas de
mortalidade dos últimos dez anos, nas quais se mostra
o crescimento acelerado do massacre na faixa dos 15 aos 24
anos de idade. Tradução: a delinquência
juvenil está fora de controle.
O artigo
de hoje é a única sugestão concreta que
me sinto em condições de oferecer aos candidatos
para minorar esse problema. Pretendo mostrar -com base na
minha experiência pessoal de envolvimento com jovens
e com crianças marginalizadas e como observador de
políticas públicas e ações de
entidades não-governamentais- que existe uma saída
tão viável quanto óbvia para atenuar
o risco de violência. Chama-se bolsa-jovem, inventada
por muita gente, em diferentes lugares, mas dispersa.
Não
é necessário criar nada novo; basta articular
melhor e com mais profundidade o que já funciona. Nem
se propõe a "cura" ou uma solução
miraculosa; todos sabemos que, sem crescimento econômico,
qualquer ação social é limitada. Assim
como sabemos que o crescimento por si só não
produz distribuição de renda.
Os três
níveis de governo (federal, estadual e municipal),
em conjunto com a sociedade, conseguiriam evitar a entrada
de milhões de brasileiros na delinquência se
aplicassem um programa de renda mínima para adolescentes
a partir dos 15 anos nos guetos de violência.
Tomam-se
aqui emprestadas, em parte, duas idéias bem-sucedidas:
a bolsa-escola, que chega hoje a 10 milhões de crianças,
e o programa para retirar os menores do trabalho (Peti), que
já tem 700 mil beneficiários.
Esse mesmo
princípio deveria ser reproduzido para os jovens, que
ganhariam um salário mínimo e continuariam na
escola. Em contrapartida, eles se comprometeriam a melhorar
o bairro em que moram: leriam histórias para crianças,
cuidariam de jardins, fariam oficinas de grafitagem nas escolas,
cantariam rap ou promoveriam shows de música, teatro,
dança, por exemplo. Poderiam atuar como agentes de
saúde, de esporte, de ambiente ou de educação.
Para realizar
tais tarefas, eles seriam tutorados pelas mais diferentes
entidades com influência no bairro, devidamente capacitadas.
A contrapartida faria deles líderes comunitários
e, mais que isso, indivíduos em processo contínuo
de aprendizado complementar à escola.
Quem duvida
do efeito desse tipo de atividade na vida do jovem veja as
notáveis conquistas de programas como Agente Jovem
e Capacitação Solidária, ambos criados
pelo governo federal. O PT desenvolveu, em São Paulo,
ações para mesclar trabalho com educação
entre os jovens - e, mais uma vez, foram obtidos resultados
palpáveis. Vários governos estaduais, entre
eles o do PSDB também de São Paulo, estão
oferecendo recursos para o primeiro emprego, combinados com
ações culturais de valorização
do espaço público.
Em todos
esses planos, o objetivo que se persegue é assegurar
ao jovem condições de descobrir e exercer seu
talento. Todos (vou repetir, todos) os que acompanham tais
experiências sabem como a música, a dança,
o teatro, as artes plásticas, a informática
e os esportes podem ser instrumentos para produzir auto-estima.
A solução
óbvia é escolher os principais guetos de violência
e beneficiar pelo menos 3 milhões de jovens, que significam
no mínimo a metade dos jovens entre 15 e 19 anos que
vivem nos bolsões de violência de todo o país.
A partir
dos cálculos de programas, em menor escala, em execução,
cada bolsa-jovem sairia por R$ 2.000, levando em conta o custo
da tutoria. Isso significa um gasto de R$ 6 bilhões
por ano, a serem rateados entre a União, os Estados,
os municípios e o chamado terceiro setor. Boa parte
desse dinheiro já está aí mesmo, como
as verbas do Fundo de Amparo ao Trabalho (FAT), do BNDES,
recurso ministerial destinado a ações que atendam
a juventude, além das centenas de programas de renda
mínima realizados com verbas estaduais e municipais.
Governadores
e prefeitos têm condições de melhorar
aqueles bolsões com obras de infra-estrutura e oferta
de mão-de-obra qualificada. Isso viabilizaria o funcionamento
de escolas nos fins de semana, transformadas em centros comunitários
(algo que já ocorre em várias cidades brasileiras
-e com sucesso), o aprimoramento do programa de médicos
de família, que pode dar mais atenção
à prevenção das drogas, a construção
de quadras esportivas, a serem administradas por educadores
ou por assistentes sociais e a disseminação
do policiamento comunitário.
Basta
apenas que se formule uma política nacional para a
juventude e que o próprio presidente da República
crie um fórum de articulação de programas
que envolva, a começar de seus ministros, a sociedade,
os prefeitos e os governadores. Seria, assim, lançada
uma ofensiva de gueto em gueto. Essa é a verdadeira
política de segurança.
PS - Este
artigo resulta da observação de várias
experiências dentro e fora do Brasil. Basta ver, em
São Paulo, como centenas de grafiteiros, orientados
por artistas plásticos, já se transformaram
em agentes comunitários de artes.
Mas o
que o deflagrou ocorreu na quinta-feira à noite, quando
vi a apresentação de uma peça de teatro
de jovens da periferia de Salvador. Em todo o processo de
aprendizado para a apresentação, eles se modificaram,
mudaram de atitude e de interesse, passaram a projetar o futuro.
E agora recebem salário mensal para encenar em comunidades
pobres e escolas públicas e discutir temas como violência,
sexo, drogas, miséria. Não há nenhum
motivo para que tal experiência não seja reproduzida
por milhões de jovens.
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