Brasileiro
acredita que violência sucumbe criminalidade
Quais são
as melhores soluções para o combater a criminalidade?
Com medo do atuais índices violência, mais da metade
da população brasileira (51%) defende a pena de morte
(51%), a prisão perpétua (72%) e a convocação
dos Exército para combater a violência (84%). Isso
prova que a sensação de desamparo leva os indivíduos
à agressividade, num perigoso círculo vicioso que
alimenta a mesma violência que os preocupa.
Os dados fazem
parte da pesquisa sobre percepção da violência
divulgada pelo instituto Datafolha. Segundo o estudo, a recente
repercussão desses casos, aliada à descrença
na capacidade de reação do poder público e
a uma sensação de abandono, corroem a percepção
de segurança e alavancam a violência na lista das inquietações.
A reação
emocional soma-se, continuam especialistas, a um questionamento
objetivo da eficácia do sistema em vigor. Por isso, muitos
acabam se armando. O Datafolha indica que 12% das pessoas moram
em casas onde há armas de fogo -em meados de 99, o índice
era de 8%. Muitas delas são irregulares, já que há
no país apenas 2,91 milhões de armas cadastradas.
Leia
mais:
- Violência apavora mais os brasileiros
Leia
também:
- Constituição veta prisão perpétua
e execução
- Medo supera a confiança nas polícias
- Vítima defende pena de morte
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Violência
apavora mais os brasileiros
Os brasileiros
estão com medo. A violência é atualmente o maior
problema do país na opinião de 21% deles -chega a
27% entre paulistas e 29% entre paulistanos, segundo pesquisa feita
nos dias 20 e 21 de fevereiro pelo instituto Datafolha. É
um recorde -o maior índice desde 96.
A explosão
é recente. Dois meses antes, a violência afligia prioritariamente
10% dos entrevistados. Em 98, quando os atuais governantes foram
eleitos, esse grupo era de apenas 3%.
Historicamente,
a violência preocupa menos do que o desemprego -eterno líder
das aflições nacionais, com 32% das indicações.
Mas nunca se aproximara tanto dele na lista das mazelas.
Anos atrás,
perdera no ranking para a saúde, a miséria, a educação,
a economia e até a corrupção. Hoje, deixa todas
para trás.
Feita em fevereiro,
a pesquisa, por um lado, sucede uma certa estabilização
dos principais indicadores de violência -roubo, furtos e homicídios.
Por outro, vem após a explosão dos casos de sequestros
e a divulgação de eventos de forte repercussão,
como os 53 dias de cativeiro de Washington Olivetto e o assassinato
de Celso Daniel, prefeito de Santo André.
Ocorridos em
São Paulo, os episódios têm mais impacto social,
segundo estudiosos da violência urbana. Aliados à descrença
na capacidade de reação do poder público e
a uma sensação de abandono, corroem a percepção
de segurança e alavancam a violência na lista das inquietações.
"Isso ocorreu
no Estado do trabalho, do dinheiro. No inconsciente coletivo, o
trabalho não está vencendo o crime", diz o psiquiatra
Jorge Forbes, 50.
"A violência está muito presente no cotidiano.
Ficar uma hora e meia esperando o ônibus também é
uma violência. E isso faz o sujeito se sentir menos cidadão.
Daí, o medo. Ele se sente dependente dos outros para mudar
tudo", afirma o também psiquiatra Antonio Carlos Cesarino,
68.
Desamparados,
os brasileiros se armam. O Datafolha indica que 12% das pessoas
moram em casas onde há armas de fogo -em meados de 99, o
índice era de 8%. Muitas delas são irregulares, já
que há no país apenas 2,91 milhões de armas
cadastradas.
Para Cesarino,
isso prova que a sensação de desamparo leva os indivíduos
à agressividade, num perigoso círculo vicioso que
alimenta a mesma violência que os preocupa. "A impotência
e a frustração levam a posturas e discursos extremos.
Na psicologia isso é claro: quanto mais atingido, maior minha
agressividade interna."
E o discurso
dos brasileiros tende mesmo à agressividade. Dos entrevistados
pelo Datafolha, a maioria defende a pena de morte (51%), a prisão
perpétua (72%) e a convocação dos Exército
para combater a violência (84%).
"Do desespero
e do estresse decorre uma reação pós-traumática,
que faz com que eu queira me ver livre da ameaça do modo
que julgo mais curto", finaliza Cesarino.
A reação
emocional soma-se, continuam especialistas, a um questionamento
objetivo da eficácia do sistema em vigor.
"Todo mundo
sabe que não se descobre a autoria da maior parte dos crimes,
que os criminosos, quando presos, ou fogem ou são soltos
rapidamente. É um sistema de pânico", diz Marino
Pazzaglini Filho, 58, procurador de Justiça e presidente
do Instituto Milton Campos (ligado ao PPB).
As respostas,
porém, são vistas mais como um grito difuso por providências
do que como reflexo de uma desejo real. "A partir do momento
que a população se convencer de que o governo está
interessado em resolver o problema da segurança, essa opinião
vai mudar", diz Geraldo Cavagnari, 67, coronel da reserva e
coordenador do Núcleo de Estudos Estratégicos da Unicamp.
Por esse raciocínio,
não é de hoje que a população duvida
do empenho das autoridades. Em anos anteriores, o Datafolha havia
feito perguntas sobre a pena de morte e a presença do Exército.
A aprovação à punição capital
apresenta pequenas oscilações. Ao Exército,
está crescendo.
Para Nancy Cardia,
54, psicóloga social e coordenadora de pesquisas do Núcleo
de Estudos da Violência da USP, a presença do Exército
contra o crime é uma "fantasia pacificadora".
"É
como se dissessem: "vem aí o último recurso,
a cavalaria". Há pessoas que contemplam a idéia
de que o Exército é a única saída porque
é encarregado de guerrear e, se estamos em guerra, devemos
chamá-lo. É fantasia de verão, porque as pessoas
não sabem que eles não são treinados para isso."
O Datafolha
ouviu 3.857 pessoas em 153 municípios de todos os Estados.
A margem de erro é de 2 pontos percentuais.
(Folha de
S. Paulo)
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Constituição
veta prisão perpétua e execução
As medidas apoiadas
pela maior parte da população -pena de morte, prisão
perpétua e ação policial do Exército-
ferem a Constituição Federal. Além disso, não
encontram respaldo nas propostas de governo de partidos da direita
à esquerda do espectro político e, a julgar por estatísticas
internacionais, não garantem a redução da criminalidade.
Promulgada em
88, a Constituição prevê o direito à
vida e às penas não perpétuas como garantias
fundamentais. E essas garantias figuram entre as cláusulas
pétreas -intocáveis por emendas do Congresso.
Só seria
possível mudar essas regras, de acordo com advogados ouvidos
pela Folha, por dois caminhos: a convocação de uma
nova Assembléia Nacional Constituinte ou por uma emenda constitucional
feita depois de um plebiscito. No segundo caso, porém, o
Supremo Tribunal Federal ainda poderia derrubar a medida, alegando
inconstitucionalidade.
A Constituição
de 1937, a "Polaca", outorgada no governo Vargas, proibia
a prisão perpétua, mas previa a possibilidade de aplicação
da pena de morte para crimes contra a ordem nacional e homicídios
por motivo fútil e com requintes de perversidade. Uma lei
que a regulamentasse, porém, nunca foi publicada.
Nos Estados
Unidos, há controvérsia sobre os efeitos da pena de
morte como instrumento de contenção do crime. Em 1998,
o jornal "The New York Times" analisou os registros criminais
dos 50 Estados americanos e demonstrou que a taxa de homicídios
era menor nos que não adotavam a pena de morte.
Os defensores
da punição, porém, argumentam que os Estados
que não promovem execuções se caracterizam
pela escassez de grandes concentrações urbanas - e
que essa seria a verdadeira razão das baixas taxas de assassinato,
já que a violência costuma ser menor nas pequenas cidades.
(Folha de
S. Paulo)
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Medo
supera a confiança nas polícias
Os brasileiros
estão com medo. E não é só dos bandidos.
De acordo com a pesquisa do Datafolha, 59% deles afirmam ter mais
pavor do que confiança na polícia -o braço
armado do Estado que está nas ruas para protegê-los.
É uma
sensação que permeia todas as classes sociais e regiões
do país. Para os especialistas, as camadas mais baixas temem
pela vida. As altas, pelo patrimônio.
"Tenho
medo da polícia. Ela deveria ser mais amiga, passar cumprimentando.
Mas olha feio. Só assusta a população",
diz a costureira Maria da Paz, 44. "Não temos mais defesa.
Os policiais são desonestos e promíscuos. Por isso
tenho medo da polícia", completa a contadora Maria do
Rosário, 53.
Muitos dos especialistas
concordam. Vêem o medo como resultado de uma polícia
violenta e tecnicamente despreparada.
"Isso mostra
que esse modelo de segurança pública chegou ao limite.
A população tem razão de ter medo, porque a
polícia não faz repressão, mas combate inimigos",
diz o ex-ouvidor das polícias de São Paulo, o sociólogo
Benedito Domingos Mariano, 43.
O governo rebate.
"É um problema de comunicação. Quando
a mãe quer dar uma bronca no filho, fala: "Olha que
eu chamo a polícia". Chama a polícia para quê?
Se a autoridade da mãe é dizer que ela tem a possibilidade
de chamar a polícia, fica complicado trabalhar a imagem do
policial na sociedade. É lógico que tem condutas erradas,
atendimento ruim, uma série de coisas que vão melhorar,
mas acho que a imagem da polícia passa muito por esses mitos",
afirma Saulo de Castro Abreu Filho, 40, o secretário da Segurança
Pública de São Paulo.
Se o policial
é temido, não deve ser apontado como o único
culpado por isso, é o que avalia o psiquiatra Antonio Carlos
Cesarino.
"Os policiais
também estão assustados. Entram no mesmo processo
traumático dos cidadãos e respondem com violência."
A face mais
visível da falta de confiança na polícia é
a subnotificação dos crimes -64% das vítimas
de roubo e 71% das de furto não deram queixa à polícia.
"Não se confia que as coisas vão ser apuradas",
diz Marino Pazzaglini, do Instituto Milton Campos.
Outra demonstração
de descrédito é, para os especialistas, exatamente
o apelo pelo Exército.
"Isso é
a perda de confiança na polícia. A população
passa a ver o Exército como força competente porque
precisa buscar um porto seguro", afirma Jorge Zaverucha, 45,
cientista político e diretor do Núcleo de Estudo de
Instituições Coercitivas da Universidade Federal de
Pernambuco.
Temida, a polícia
não figura como a principal solução para a
violência urbana.
Para a maioria dos entrevistados pelo Datafolha (57%), a saída
é investir em educação e combater o desemprego.
Outros 38% apostam em policiais treinados e equipados.
"É
uma demonstração de amadurecimento. Isso significa
que acreditamos que existe uma coisa chamada prevenção
primária. Já se sabe que o desemprego tem um custo
muito alto para o indivíduo", diz Nancy Cardia, da USP.
Para os pesquisadores,
não há contradição entre as medidas
extremas aprovadas pela população e a defesa de investimentos
sociais como forma de combater efetivamente a criminalidade.
"As medidas
extremas, tanto quanto o medo da polícia, são manifestações
de um descontentamento difuso, um pedido de providência. A
população sempre dá respostas negativas para
avaliar o Estado e pede qualquer coisa a curto prazo. De forma definitiva,
porém, intui que a solução é social",
diz o ex-secretário da Segurança Marco Petrelluzzi,
45.
(Folha de
S. Paulo)
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Vítima
defende pena de morte
Até dois
anos atrás, Iris Moreira, 23, era contra a pena de morte.
Hoje, depois de ter sido vítima de 18 assaltos desde 1999,
mudou de opinião. "Sou totalmente a favor."
Iris se diz
tão cansada da violência que, por ela, haveria pena
de morte para estupradores, sequestradores e homicidas.
Quanto à
prisão perpétua, é contra. "O bandido
iria ficar a vida inteira sem trabalho, sendo sustentado."
Iris trabalha como comerciante no Capão Redondo (zona sul
de São Paulo). Junto do marido, administra uma padaria. Sua
renda familiar não chega a dez salários mínimos.
Por causa da
violência, alterou a rotina. "Não tenho coragem
de sair à noite", diz. Ela também admite evitar
pessoas estranhas e ruas escuras ou vazias. A hipótese de
a Justiça um dia errar e condenar inocentes à pena
de morte não muda a opinião dela. "Sei que o
risco existe, mas tudo vale a pena para diminuir a violência."
(Folha de
S. Paulo)
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