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Empresas
ajudam mulheres a conciliar filhos e trabalho
Mulheres que trabalham fora e têm filhos de até 5 anos
de idade estão conseguindo driblar um velho dilema enfrentado
por várias gerações: investir na maternidade
ou na carreira profissional. Munidas de laptop conectado à
Internet e telefone celular, aopiadas por empresas que negociam
relações de trabalho flexíveis, elas levam
o trabalho para perto dos filhos.
Segundo dados
de 1998 da Fundação Carlos Chagas, 48,3% das mães
brasileiras trabalham. A psicóloga Maria Clara Nassif sugere
que as mulheres programem seu novo ritmo de trabalho pós-parto
desde a gravidez. "Com um laptop, por exemplo, ela pode levar
trabalho para casa e ficar menos horas na empresa". E isso
deve ser negociado com antecedência.
Mas as empresas
não ficaram condescendentes com as mães de uma hora
para outra. Elas sabem que, se não ajudarem as funcionárias,
poderão perdê-las. Uma pesquisa da organização
Families and Work Institute (Instituto Família e Trabalho),
em Nova York, constatou que metade dos pais de crianças de
0 a 3 anos que trabalham, termina o dia sentindo que passou menos
tempo com seus filhos do que gostaria. Resultado: profissionais
estressados e desmotivados no trabalho. E queda na produtividade.
As políticas
de benefícios oferecidas pelas empresas preocupadas em facilitar
a vida das funcionárias que têm criança pequena
em casa já estão chegando ao Brasil. Acordos de horários
flexíveis, programas como auxílio-creche, auxílio-babá
e auxílio-amamentação, são alguns dos
benefícicos oferecidos.
As
informações são da Gazeta Mercantil
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Perto
das crianças e do computador
Maria Eduarda é consultora financeira e tem MBA (Masters
of Business Administration, uma pós-graduação)
nos Estados Unidos. Deborah é assessora comercial de uma
empresa de telecomunicações. Maria Christina é
médica radiologista. Cláudia é tradutora e
professora de inglês. Bettina é fonoaudióloga.
Além disso, elas são as mães de Tomás,
Vitória, Lara, Nina, Caio, Fernanda e Eduardo - além
dos bebês que ainda estão na barriga de Maria Eduarda
e Deborah.
Essas mães,
que têm entre 29 e 37 anos, e filhos de até 5, conseguem
lidar com um problema que aflige gerações de mulheres:
conciliar filhos com carreira profissional. Para isso, aproveitaram
a situação que apenas as mulheres de sua época
encontram: empresas mais abertas a negociar relações
de trabalho flexíveis e facilidades trazidas pela tecnologia.
Com laptop, celular, internet e o consentimento do chefe, elas levam
o trabalho para perto dos filhos. E conseguem - com um certo malabarismo
- desempenhar as duas funções: ser mãe e desenvolver
sua vida profissional. Quase sem sentir culpa.
Elas fazem parte
do índice encontrado pela Fundação Carlos Chagas,
com dados de 1998: 48,3% das mães brasileiras trabalham.
É delas a tarefa de resolver a equação: de
um lado as afirmações dos médicos, de que são
essenciais os estímulos dados à criança em
seus primeiros anos de vida. De outro, o trabalho. Conforme a profissão,
não conseguem se ausentar do trabalho nem pelo tempo de licença-maternidade
previsto por lei.
"O afastamento
entre a mãe e a criança tem de ser gradual e de forma
cautelosa", sugere a psicóloga Maria Clara Nassif, que
há 30 anos tem uma clínica, onde atende pais e filhos.
"Quando a criança nasce, reconhece o cheiro e a voz
da mãe. Se a mãe de repente some, isso pode gerar
um trauma".
O ideal, avalia
Maria Clara, é que a mãe-profissional já programe
seu novo ritmo de trabalho pós-parto desde a gravidez. "Com
um laptop, por exemplo, ela pode levar trabalho para casa e ficar
menos horas na empresa", sugere. E isso deve ser negociado
com antecedência. Pode ser difícil, mas a psicóloga
não tem dúvidas: "Na relação com
os filhos, há mais lucros que perdas, no caso das mães
que trabalham fora".
Há três
anos, quando a analista de sistemas Deborah Vintecinco, de 36 anos,
pleiteava uma vaga na área de vendas da Nextel Telecomunicações,
foi surpreendida com uma pergunta durante a dinâmica de grupo:
"Qual é seu projeto de vida?" Mãe de Vitória,
na época com um ano, Deborah não titubeou: "Ter
mais um filho". Entre as nove pessoas que concorriam à
mesma vaga, ela foi a escolhida. "Acho que foi pela sinceridade",
diz. Em dezembro do ano passado, ficou grávida. Rapidamente
contou para seu supervisor e seu gerente. Recebeu os parabéns
e a recomendação de que tomasse cuidado, ficando em
casa se necessário.
Satisfeita com
o apoio da empresa, Deborah sabe que não será possível
gozar de toda a sua licença-maternidade. "Volto a trabalhar
depois de um mês e pouco", diz. Em contrapartida, pretende
montar um esquema de horários mais flexíveis. "Amamentei
minha primeira filha por 11 meses. Espero fazer o mesmo com o segundo
filho". Para Deborah, "a hora de fazer essas conquistas
é agora". "A empresa é nova e tem a filosofia
de valorizar os funcionários que dão bons resultados",
diz ela, que está entre os dez melhores vendedores do ano
passado. No final da gestação, ela já deve
começar a trabalhar com laptop e e-mail, aparecendo esporadicamente
na empresa.
A consultora
financeira Maria Eduarda Sawaya, de 29 anos, também fez um
acordo com sua empresa, a Booz-Allen & Hamilton, para conquistar
um horário de trabalho flexível. Assim fica mais tempo
ao lado de Tomás, de 1 ano e nove meses, e, daqui a seis
meses, do outro filho que está esperando. Ela diz que o acordo
"dá certo em 60% das vezes". "Quando estou
envolvida em algum projeto maior não dá para terminar
tudo no meu horário". Nesses casos, ela sai da empresa
no fim da tarde, vai para casa, fica com Tomás, brinca, janta,
dá banho e, quando ele vai dormir, ela volta para a Booz-Allen.
E fica até acabar o trabalho.
Para cuidar
do próximo filho, Maria Eduarda pretende continuar no seu
trabalho, "talvez com um horário ainda mais flexível".
"Andei conversando com a Booz-Allen e acho que será
isso mesmo que vai acontecer, pois, mais uma vez, eles estão
me dando todo o apoio", diz.
Mas as empresas
não ficaram condescendentes com as mães de uma hora
para outra. Os empregadores sabem que, se não ajudarem as
mães, perderão as funcionárias. A organização
Families and Work Institute (Instituto Família e Trabalho),
sediada em Nova York, fez uma pesquisa e constatou que, entre os
pais de crianças de 0 a 3 anos que trabalham, metade termina
o dia com a sensação de que passou menos tempo com
seus filhos do que gostaria. Resultado: profissionais estressados,
culpados e desmotivados no trabalho. Para as empresas, queda na
produtividade.
"Family-friendly
employment policies". É assim que os americanos estão
chamando as políticas de benefícios oferecidas pelas
empresas preocupadas em facilitar a vida das funcionárias
que têm criança pequena em casa. E, conseqüentemente,
fazê-las trabalhar melhor. Alguns desses benefícios
já chegaram ao Brasil. Os acordos de horários flexíveis
já são viáveis em várias empresas e
muitas oferecem programas como auxílio-creche, auxílio-babá
e auxílio-amamentação, colocando à disposição
um carro para levar a funcionária até sua casa para
dar de mamar nos horários certos.
E os filhos?
Será que esse meio-termo, encontrado pelas mães para
não se ausentar por tanto tempo de casa, é o suficiente,
do ponto de vista médico, para o bom desenvolvimento da criança?
"Eu diria que o ideal, pensando na formação da
criança, seria que a mãe estivesse ao seu lado até
os 2 anos de idade", diz o pediatra Clóvis Gomes, reconhecendo
que isso nem sempre é possível. Ele explica que esse
é o prazo para a formação total do sistema
imunológico da criança. "Antes disso a criança
fica muito suscetível a doenças, precisa ficar em
um ambiente protegido".
O pediatra também
ressalta a importância da amamentação. "Não
dá para abrir mão: o leite materno é essencial
tanto para a saúde física como para a mental da criança",
diz. "A mãe tem de garantir pelo menos seis meses de
amamentação no peito". Além disso, ter
a mãe ao lado representa, para a criança, segurança.
Essencial para seu desenvolvimento psíquico. 'Ficar com a
mãe é sempre melhor, não dá para escamotear',
diz o médico.
Foi pensando
nisso que a tradutora Cláudia Helena Menezes, de 37 anos,
mudou a sua rotina de trabalho mesmo antes do nascimento de Caio,
hoje com dois meses. Coordenadora de uma escola de inglês
e professora particular, "passava o dia zanzando pela cidade",
como diz ela. Ao saber da gravidez, se organizou: saiu da escola
(sabia que o período de gestação terminaria
antes do final do ano letivo), manteve suas aulas particulares e
começou a realizar trabalhos de tradução, em
casa. "Já deixei tudo engatilhado para quando o período
equivalente à licença-maternidade terminar",
diz. Cláudia também melhorou sua estrutura doméstica:
mudou para um apartamento maior, com um escritório mais bem
equipado, com computador e acesso à internet de alta velocidade.
Assim, tanto ela como seu marido - que já está aproveitando
para adiantar uma parte do trabalho em casa - podem ficar mais tempo
ao lado de Caio. E quando o filho estiver na idade de ir para a
escola, Cláudia voltará a dar aulas fora de casa.
"Senão fico biruta", diz.
E fica mesmo.
Segundo Maria Clara Nassif, as maiores crises de angústia
são geradas quando os pais deixam de fazer algo que querem,
como um curso ou universidade, por exemplo, por causa dos filhos.
"A mãe tem de saber que uma função não
exclui a outra. Ela tem o direito de ser mãe e profissional,
em igual escala", diz. A opção por ser só
mãe, segundo a psicóloga, tem "um custo altíssimo.
Para os filhos".
A psicóloga
Maria Clotilde Rossetti Ferreira, especializada em desenvolvimento
humano e educação infantil, ressalta outro ponto:
"Ninguém garante que a mãe que passa o dia todo
com a criança interage melhor com ela". Para a psicóloga,
que estudou durante seu doutorado a interação mãe-criança,
a mãe que trabalha fora pode interagir até mais com
o filho, se dedicando com especial atenção durante
o tempo que tem para ficar com ele. É a velha questão
da qualidade de tempo versus quantidade de tempo, discutida desde
os anos 70.
O neurologista
Wanderley Manoel Domingues explica como os estímulos promovidos
pelos pais têm importância na formação
neurológica da criança. "É a estimulação
afetiva, motora e cognitiva, nos primeiros anos da vida, que vai
gerar o desenvolvimento do cérebro e suas funções",
diz. "Isso acontece por meio da estruturação
do número e maneiras de conexão entre os neurônios,
assim como sua estabilidade". Esse processo é chamado
de plasticidade neural. O Families and Work Institute explica, em
um de seus levantamentos, como a plasticidade neural funciona. É
como uma empresa que, empenhada em aumentar sua eficiência
e produtividade, elimina excessos, fazendo o chamando downsizing.
O cérebro humano realiza uma espécie de downsizing,
na segunda década de vida: elimina as conexões neurais
menos eficientes. Para que possa selecionar as melhores precisa,
portanto, de um repertório vasto, conseguido principalmente
nos primeiros anos de vida. Isso porque, nessa idade, a atividade
cerebral da criança corresponde ao dobro da de um adulto.
Então é muito mais flexível a receber os estímulos.
O contrário também é verdadeiro. Se receber
poucos estímulos, firmará menos conexões, o
que "traz como conseqüência o não desenvolvimento
adequado das estruturas e suas funções", diz
Domingues.
Por tudo isso:
não bate um sentimento de culpa nos pais que saem para trabalhar
e deixam as crianças em casa? "Angústia toda
mãe tem. Mas tem de ser elaborada", diz Maria Clara
Nassif. Segundo ela, isso acontece porque as pessoas ainda estão
muito ligadas ao modelo antigo de família - do qual muitos
pais ainda fizeram parte. Era o caso daquelas casas onde a mãe
cuidava do lar e dos filhos, enquanto o pai trabalhava para prover
o sustento da família. "Os pais precisam assumir que
vivemos em outra época. Até porque é esta a
realidade com a qual a criança irá conviver",
diz.
Mas não
é fácil. A consultora Maria Eduarda reconhece: "Acho
que meu filho preferiria que eu passasse o dia todo com ele".
Ela conta que, durante estes meses de gravidez, teve de passar uns
dias em casa, em repouso, e acabou ficando mais tempo ao lado de
Tomás. "Ele ficou mais calmo, dormia a noite inteira",
conta a mãe. Mas ela também sabe: "Eu não
seria naturalmente tão carinhosa com meu filho se passasse
o dia todo com ele". Para se convencer ainda mais, lembra-se
do que ouviu da diretora da escola do filho, "o que toda a
mãe gostaria de ouvir": "Ela disse que Tomás
é o mais alegre da escola. Sinal de que ele está bem,
né?"
A grande armadilha,
para os pais, está no sentimento de culpa. "Às
vezes eles fazem concessões em nome da culpa, por se julgarem
devedores na relação. Aí é que nascem
os picos de conflitos mais intensos", diz Maria Clara Nassif.
Quando os pais caem na armadilha, cometem erros, como por exemplo
encher os filhos de presentes, ocupar toda o dia da criança
com atividades, considerando que, com uma agenda cheia, a criança
não sofra com a ausência dos pais. Viram "pequenos
executivos", como diz a psicóloga. Saem da natação
para o inglês, do tênis para o balé. E não
brincam.
"Criança
precisa brincar", diz Maria Clotilde Rossetti Ferreira. "É
assim que ela aprende". Portanto, deixar a criança livre
- bem assistida, claro -, enquanto os pais se dedicam ao trabalho,
pode ser até melhor para a formação da criança,
diz. Muitas vezes os pais encontram esse cenário nas escolinhas,
creches ou berçários.
"Fico totalmente
tranqüila enquanto estou trabalhando e as minhas filhas estão
na escolinha", diz a radiologista Maria Christina Nader Pucci,
de 33 anos. "Sei que lá elas estão recebendo
os estímulos certos, acompanhadas por educadores". No
período em que Lara, de 4 anos e meio, e Nina, de 3, não
estão na escola, ficam com a mãe. Isso porque, quando
a mais velha nasceu, Maria Christina fechou seu consultório,
que era a sua atividade das tardes, e passou a trabalhar meio-período
no hospital-escola da Santa Casa. '"Acho o ideal, assim não
perdi o pé da profissão e pude ficar com as minhas
filhas", diz ela. No final do ano passado ela se afastou da
Santa Casa. Mas não por causa das meninas. Resolveu fazer
um curso de especialização. "Não vou ficar
sem trabalhar", diz a médica.
A rotina semanal
do advogado Luiz Fernando Martins Castro, de 39 anos, e sua mulher,
a fonoaudióloga Bettina, de 37, é sempre agitada.
Para cuidar de Fernanda, de 5 anos, e Eduardo, de 2 e sete meses,
Bettina transferiu seu consultório para perto de casa. Assim,
entre uma consulta e outra, vai e volta, fica com os filhos em casa,
busca na escola, leva para as avós e para a natação.
Também tem uma atividade no Hospital das Clínicas,
em horários flexíveis. Luiz Fernando, que tem horários
mais rígidos em seu escritório de advocacia, leva
os meninos à escola três vezes por semana. Nos outros
dias conta com a ajuda de um motorista. É uma correria, mas
o esquema funciona. Com uma exceção: as festinhas
infantis de coleguinhas no meio da semana. Como se não bastasse
conciliar os horários de escolinha, natação,
avós, trabalho, pacientes e congressos, a fonoaudióloga
ainda tem de estar animada para acompanhar as crianças em
bufês infantis às cinco da tarde.
(Gazeta Mercantil)
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