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09/10/2005 - 09h32

Metas funcionam pior no país, diz estudo

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MARCELO BILLI
da Folha de S. Paulo

Os países que adotaram o sistema de metas de inflação conseguiram elevar a taxa de crescimento da economia e, ao mesmo tempo, reduzir pela metade a taxa de inflação. A exceção é o Brasil, mostra estudo elaborado pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Por aqui, a inflação caiu pouco e a economia continuou com taxa anêmica de crescimento.

O estudo, apesar de não questionar a adoção do sistema de metas --outra constatação é que os países que não o adotaram registraram taxas de crescimentos menores--, critica a forma e o rigor com os quais ele foi implementado no Brasil. Mostra, ainda, uma série de problemas enfrentados pela política monetária brasileira.

A implementação do sistema de metas por aqui inaugurou um período de taxas de juros altas e de baixo crescimento. Enquanto nos quatro anos antes da adoção do sistema, em 1999, a taxa média de crescimento girava em torno de 2,5%, ela caiu para perto de 2% nos quatro anos posteriores.

Já a inflação oscilou de média de 10% para média próxima a 8%. Em outros 20 países analisados pelo estudo, a taxa média de crescimento girava em torno de 2,5% antes do sistema de metas e saltou para um pouco mais de 3% depois. A inflação caiu de taxas em torno de 11% para cerca de 4%.

Outra diferença: não há relação, nos demais países, entre a adoção das metas e altas taxas de juros. "Ele [o sistema de metas de inflação] não tem que andar de braços dados com juros altos", diz Paulo Francini, diretor da Fiesp.

Expectativas

O primeiro problema: o Banco Central usa as expectativas de inflação para avaliar se sobe ou não a taxa de juros para conter a inflação. Para isso, as estima fazendo pesquisa com instituições financeiras. A medida, no entanto, é precária. Considerando sempre o mês de junho de cada ano, mostra a pesquisa, o único ano em que as estimativas de mercado ficaram próximas ao que realmente ocorreu no ano seguinte foi em 2003. Naquele ano, o mercado estimava, em junho, inflação de 7,4% para 2004, ano em que a taxa ficou em 7,6%. Nos demais, as previsões ficaram longe da inflação registrada no ano seguinte.

A Fiesp não critica o erro das projeções, já que é realmente difícil estimar a inflação com prazos relativamente longos, principalmente em uma economia sujeita a choques, como a brasileira. O problema, diz o levantamento, está no fato de o BC reagir às expectativas, elevando os juros.

"Outros bancos centrais são mais cuidadosos com essas pesquisas. O da Nova Zelândia faz cinco pesquisas com diferentes grupos, inclusive fora do mercado financeiro. Ainda assim, a avaliação dos próprios técnicos de lá é que é uma medida precária, apesar de útil", diz o diretor da Fiesp.

Curiosamente, a expectativa do mercado nos meses de junho é sempre muito próxima à meta estabelecida pelo governo para o ano seguinte. Ou seja, na prática os analistas consideram que o BC ficará perto da meta e estimam uma taxa próxima a ela. As variações nas estimativas ficam mais por conta do cenário presente da inflação do que por uma avaliação sobre o futuro. Pelo menos quando o futuro ainda está mais de 12 meses à frente.

Produto potencial

Outro instrumento utilizado pelo BC é o chamado produto potencial, uma medida da capacidade de crescimento da economia. Na prática, o BC tenta estimar qual a taxa de crescimento que pode ser atingida pelo país, chegando a um potencial de crescimento. Se a economia cresce mais que o potencial, é sinal de que haverá pressões inflacionárias, com a chamada inflação de demanda: com o aquecimento, sobe a procura por bens e serviços, e seus preços aumentam porque a oferta não consegue acompanhar a alta.

O problema, diz a indústria, é que a autoridade monetária está subestimando a capacidade do setor de elevar sua produção e atender ao aumento de procura que o crescimento econômico mais acelerado causaria.

Pesquisa com mil indústrias de São Paulo, também elaborada pela Fiesp, mostra que, diante da aceleração da procura por seus produtos, as indústrias são capazes de aumentar a produção em 19% apenas utilizando horas extras. Outro aumento, de 29,75%, poderia ser conseguido com a adoção de turno adicional de trabalho. Investimentos pontuais, para atender a possíveis gargalos de produção, ajudariam a elevá-la em 28,9%. A comparação é sempre em relação ao pico histórico de produção já atingido pelas indústrias que participaram da pesquisa.

Câmbio

Outro aspecto levantado pelo estudo é o papel do câmbio no controle da inflação. O dólar caiu 18,2% em 2003, 8,1% em 2004 e, se chegar ao final do ano em R$ 2,45, como projetam os analistas consultados pelo BC, cairá 7,7% neste ano. Apenas a valorização do real, mostram as estimativas da Fiesp, contribui para que a inflação deste ano seja 23% menor do que a inflação esperada no caso de ausência de alterações no câmbio.

O cenário, aponta o estudo, é parecido com o dos anos de 1997 e 1998, quando o câmbio valorizado ajudou na queda da inflação. O problema, aponta Francini, é que os atuais níveis de câmbio não são sustentáveis.

Cedo ou tarde, a desvalorização da moeda brasileira exercerá pressões inflacionárias, o que poderá obrigar o BC a novamente elevar as taxas de juros, comprometendo o crescimento.

Preços monitorados

Outra barreira para o bom funcionamento do sistema de metas no Brasil: a existência de uma proporção alta de preços ainda indexados. Neste caso, aponta não só o estudo da Fiesp como os de uma série de analistas de outras instituições, a elevação de juros é inócua para conter as altas dos preços, já que eles são corrigidos por cláusulas contratuais.

"A velocidade com que se tentou baixar a inflação levou a uma política anticrescimento", avalia Francini. Para a indústria, diz ele, a tentativa de derrubar a inflação quando ela era gerada pela alta desses preços comprimiu margens de lucro e transferiu renda para outros setores.

Ele mostra, por exemplo, que em 1999 a proporção de produtos ou serviços com preços administrados consumidos pela indústria era de 16,3%. Em 2005, essa proporção deve ficar em 20,7%. Ou seja, a indústria passou a gastar mais com insumos com preços monitorados, não sensíveis às altas de juros, e que subiram, em média, mais que os preços livres.

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