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07/05/2006 - 09h12

Sem investimento novo, gás boliviano trava

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CLÁUDIA TREVISAN
Enviada da Folha de S.Paulo a La Paz

A Bolívia está chegando ao limite de sua capacidade de produção de gás e, sem novos investimentos, deve haver um déficit de 12 milhões de m3/dia entre os compromissos contratuais do país e o que ele será capaz de entregar aos compradores, entre os quais o principal é o Brasil.

Projeções feitas pelo ex-secretário de Energia e Hidrocarbonetos Carlos Alberto López indicam que em 2006 já poderá haver falta de 1,2 milhão de m3/dia --diferença entre produção de 37,6 milhões de m3/dia e demanda de 38,8 milhões de m3/dia.

López estima que seriam necessários investimentos de US$ 600 milhões a US$ 800 milhões apenas para manter o atual nível de produção. Sem esses recursos, haverá queda de volumes, já que os poços de gás vão se esgotando. O ex-secretário prevê que os atuais 37,6 milhões de m3/dia cairão para 30 milhões de m3/dia em 2010, diante de uma demanda contratual de 42 milhões de m3/dia.

Os investimentos de empresas estrangeiras foram cruciais para a Bolívia aumentar seus volumes de produção nos últimos nove anos. Entre 1997 e 2005, elas destinaram US$ 3,6 bilhões à exploração de hidrocarbonetos no país, atraídas pela redução de 50% para 18% do impostos incidentes sobre o setor.

Nesse período, o tamanho das reservas de gás certificadas cresceu dez vezes, enquanto a produção triplicou.

A baixa tributação se manteve até maio de 2005, quando a nova Lei de Hidrocarbonetos nacionalizou a produção do setor e restabeleceu a alíquota de 50%. No dia 1º, decreto do presidente Evo Morales elevou o tributo mais uma vez, para 82%, mas somente para os dois grandes campos operados pela Petrobras.

A estatal brasileira é a que realizou o maior volume individual de investimentos entre 1997 e 2005: US$ 1,5 bilhão, o equivalente a 41% do total de US$ 3,6 bilhões.

A manutenção do imposto em 18% alimentou o discurso dos defensores da nacionalização, para os quais as empresas estrangeiras tinham lucros exorbitantes no país. Quando a alíquota foi elevada para 50%, há um ano, as companhias reclamaram, mas terminaram pagando os impostos.

Dúvida

A grande dúvida agora é saber se a Bolívia poderá prescindir do capital externo para continuar a desenvolver sua produção de gás. Entre os analistas do setor, a resposta é "não".

O volume de recursos que as multinacionais colocam no país vem diminuindo desde 2002 e atingiu, no ano passado, cifras inferiores às registradas em 1997. A principal razão é a instabilidade que cercou o setor de hidrocarbonetos nos últimos anos, com o aumento da pressão por sua nacionalização. Setores à esquerda de Morales consideram suas decisões tímidas e defendem a expropriação das petroleiras estrangeiras, sem indenização.

Em 2003, uma violenta revolta popular derrubou o então presidente, Gonzalo Sánchez de Lozada, idealizador da Lei de Hidrocarbonetos de 1996, que reduziu a tributação a 18%, e da privatização do setor, implementada na mesma época. No ano seguinte, na gestão de Carlos Mesa, um referendo aprovou a nacionalização do gás e do petróleo, ratificada na Lei de Hidrocarbonetos de maio do ano passado.

"O Estado deveria investir em educação, saúde e infra-estrutura. Na área petrolífera, o mais eficiente é deixar que o setor privado assuma o risco de perfurar poços secos e enfrentar eventual queda de preços e de demanda", afirma o economista Mauricio Medinaceli, que foi ministro de Hidrocarbonetos de novembro de 2005 até a posse de Morales, no dia 21 de janeiro de 2006.

Medinaceli lembra que o custo de perfuração de um posto pode superar os US$ 20 milhões e há o risco de que não se encontre gás. Em sua opinião, na situação atual é pouco provável que empresas estrangeiras invistam no setor.

A queda nos investimentos já provocou a diminuição das reservas provadas e prováveis do país --aquelas em que com segurança há gás e as em que há uma grande probabilidade de existir gás. Em 2003, elas chegaram a 54,9 trilhões de pés cúbicos, dez vezes mais que o volume de 1996. Desde então, caíram para 52,35 trilhões de pés cúbicos, em 2004, e 48,76 trilhões de pés cúbicos em 2005. "Algumas reservas se esgotam e, se não há investimento, não há descoberta de novos campos."

A lógica do governo é a de que o Estado deve comandar a exploração desses recursos estratégicos, como ocorre no Brasil, com a Petrobras, ou na Venezuela, com a PDVSA. Para isso, há um esforço de recriação da YPFB (Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos), que foi desmembrada e privatizada a partir de 1996.

O problema é que as empresas entraram na Bolívia nos últimos anos obedecendo à legislação local, e a nacionalização e a alta de tributos provocam uma brutal mudança nas regras do jogo.

Especial
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