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06/11/2006 - 09h01

Preço do gás está defasado, diz Gabrielli

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PEDRO SOARES
PLÍNIO FRAGA
da Folha de S.Paulo, no Rio de Janeiro

O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, 57, afirmou à Folha que, independentemente dos problemas enfrentados com a Bolívia, o preço do gás no país precisa subir como forma de desestimular o consumo. "O preço do gás no Brasil precisa ser reavaliado, independentemente do que acontece na Bolívia. Tem de ser reavaliado", afirmou.

Segundo Gabrielli, a diversificação da Petrobras para países tidos como mais arriscados para investimentos estrangeiros, como Bolívia, Venezuela e Nigéria, não é motivo para inquietação. "Não tem petróleo na Suíça. Se você quer estar na área de petróleo e gás, vai estar em áreas conturbadas política e geopoliticamente." Gabrielli diz concordar com Lula em que a Petrobras será uma "enorme alavanca" para o crescimento brasileiro nos próximos anos. A estatal trabalha com crescimento estimado de 4% do PIB, abaixo dos 7% dos sonhos de Lula. De acordo com o executivo, a empresa responde por 10% do PIB do país.

Sobre um eventual convite para assumir o Ministério da Fazenda, foi seco: "É pura especulação", disse, antes mesmo que a Folha abordasse o tema. Se trocasse a Petrobras pela Fazenda, Gabrielli deixaria um salário de R$ 40 mil por outro que não chega a R$ 10 mil.

Gabrielli reconheceu que "uma empresa do tamanho da Petrobras" não é "apolítica", embora a classifique como "apartidária".

Na sexta, Gabrielli falou à Folha, no 23º andar do prédio da empresa, no centro do Rio, em sala decorada com uma foto sua ao lado de Lula, ambos vestidos com macacões da empresa em plataforma de petróleo.

FOLHA - O acordo da Petrobras com a Bolívia foi positivo?
JOSÉ SERGIO GABRIELLI -
Há um problema de visão política que obscurece a visão real e pragmática. O contrato, se aprovado pelo Congresso, viabiliza investimentos porque garante o retorno acima dos custos recuperáveis. Não abrimos mão em nada nas condições legais de reclamar nossos direitos em lugar nenhum do mundo.

FOLHA - Não há nenhum compromisso de investimento?
GABRIELLI -
Não há nenhum compromisso, a não ser para garantir a produção. A produção tudo bem, porque nos interessa manter. Mas investimentos novos não há compromisso.

FOLHA - Mas houve uma redução da margem de lucro?
GABRIELLI -
Não. Houve uma mudança. Eu tinha 50% [parcela da produção livre de impostos] para ter lucro, na qual eu assumia o risco do custo. Agora, tenho o custo garantido e divido o lucro [com a YPFB] em razão do preço, da produção e do ritmo do investimento.

FOLHA - Dá para a Petrobras ganhar mais do que ganhava antes da nacionalização?
GABRIELLI -
As condições são extremamente favoráveis à empresa, que tem um contrato de compartilhamento de produção, coisa comum hoje na indústria do petróleo. Não é contrato de prestação de serviço.

FOLHA - A impressão que passa é que a Petrobras e o governo brasileiro foram surpreendidos a cada passo do governo da Bolívia. Por quê?
GABRIELLI -
Sabe quantas negociações nós temos simultaneamente hoje? Dezenas. Ninguém faz uma negociação com essa complexidade via imprensa. Há uma situação [similar] na Nigéria, na Rússia e nos próprios EUA sobre a mudança dos royalties no golfo do México. Há ampliação dos impostos no Reino Unido. Isso [aumento de tributação] é característica da indústria do petróleo toda vez que os preços ficam altos. Os governos tendem a querer aumentar sua parcela. As formas são diferentes em cada país.

FOLHA - Mas esse cenário de aumento da tributação não pode gerar uma série de revisões de contrato com a Petrobras?
GABRIELLI -
Quando era diretor financeiro, estive em agências de classificação de risco e disse que a Petrobras estava diversificando suas atividades e que iríamos elevar nossa presença em países como Argentina, Bolívia, Venezuela, Nigéria, Moçambique e Turquia. Perguntei: isso aumenta ou diminui a avaliação de risco? A resposta das empresas de rating foi: não há petróleo na Suíça. Se você quer estar na área de petróleo e gás, vai estar em áreas conturbadas política e geopoliticamente. Faz parte da indústria de petróleo, incluindo os EUA. A Guerra do Iraque tem fundamento básico no petróleo.

FOLHA - A crise com a Bolívia está superada?
GABRIELLI -
Eu acho que, se o Congresso boliviano aprovar esse contrato, nós temos, no que se refere à exploração e produção, um marco regulatório que nos permite analisar projetos de uma forma bem mais racional.

FOLHA - Mas não há o risco de a Constituinte em curso na Bolívia alterar novamente a lei?
GABRIELLI -
Dificilmente o marco vai mudar pela Constituinte. A expectativa é que o Congresso aprove, já que o presidente [Evo] Morales defende esse contrato. Evidentemente vamos analisar os projetos adicionais com base nessas regras [a serem aprovadas].

FOLHA - Mas restarão outros problemas a serem resolvidos.
GABRIELLI -
Sim, há as discussões sobre as refinarias e a discussão sobre o preço do gás, que estamos numa fase conclusiva das negociações. Acredito que chegaremos a uma definição até o dia 10.

FOLHA - O sr. espera alta de preço?
GABRIELLI -
Acho que não tem por que haver um aumento de preço, mas eu não vou antecipar uma posição. A nossa posição é que os reajustes feitos com base nos preços do óleo combustível, que é a fórmula adotada, são suficientes para manter o equilíbrio do contrato. Mas aí tem outro problema que a imprensa esquece. Esse contrato é da Petrobras Brasil com a YPFB. A Petrobras tem outros contratos particularmente com a Comgás, as distribuidoras brasileiras, que são outros contratos. O que regula o preço brasileiro são esses outros contratos.

FOLHA - Em outras palavras, o sr. quer dizer que o reajuste, se vier, não chegará com a mesma intensidade ao consumidor final?
GABRIELLI -
Não. O que estou dizendo são duas coisas diferentes. Vamos discutir em separado a situação no Brasil. O preço de gás no Brasil precisa ser reavaliado independentemente do que acontece na Bolívia.

FOLHA - O sr. acha que o preço está baixo?
GABRIELLI -
Acho que o preço no Brasil está baixo e não tem nada a ver com a Bolívia. [Está baixo] em razão da relação que existe hoje entre o preço do gás e os preços do óleo combustível e do petróleo. Como resultado, há um crescimento da demanda de gás no Brasil extremamente elevado. Está previsto em 17% ao ano.

FOLHA - Tal crescimento do consumo é insustentável?
GABRIELLI -
Não é insustentável porque a gente vai investir para viabilizar a oferta. Mas é objetivamente um crescimento acelerado que reflete um preço abaixo do que deve ser.

FOLHA - Mas, ao manter o preço por dois anos, a Petrobras foi responsável por esse crescimento?
GABRIELLI -
É verdade. De 2003 a 2005, não aumentamos os preços porque tínhamos um contrato pelo qual pagávamos, trazendo ou não, 24 milhões de metros cúbicos/dia de gás. Em 2003, estávamos trazendo de 9 milhões a 10 milhões de m3/dia e pagando por 24 milhões. Então, não repassamos [os reajustes] para o mercado interno. Com isso, o mercado cresceu e enchemos o Gasbol [gasoduto Brasil-Bolívia]. Isso até setembro de 2005, quando começamos a reajustar o preço porque atingimos o limite.

FOLHA - O presidente Lula, no discurso da vitória, cita a Petrobras como um dos fatores que elevarão o crescimento do país no ano que vem. Qual o papel da Petrobras?
GABRIELLI -
Sabe qual o nosso investimento previsto no ano que vem? R$ 39 bilhões. Sabe quanto nós vamos gastar até 2011 comprando do Brasil? US$ 50 bilhões, o que representa 66% do nosso investimento no Brasil. Ou seja, a política de conteúdo nacional e de investimentos acelerados vai fazer uma enorme alavancagem na indústria brasileira. Temos um programa de investimentos de US$ 87,1 bilhões até 2011.

FOLHA - Esse bem-estar da Petrobras não se reflete no resto da economia brasileira.
GABRIELLI -
Quer me jogar na briga do Ministério da Fazenda [risos]. O nosso programa de investimento vai provocar um valor agregado [PIB] de R$ 216 bilhões, mais ou menos 10% do PIB brasileiro. Ou seja, em torno de 10% do PIB brasileiro está garantido. Esse investimento tem três características para as quais vale a pena chamar a atenção. Primeiro, é muito pouco sensível à taxa de câmbio. Não necessita de financiamento. Todo esse plano de investimento vem de atividade operacional da Petrobras depois de pagar dividendos, na hipótese de US$ 35 o barril do petróleo. Portanto, financiamento não é problema. Isso deve representar de 7% a 9% do investimento total brasileiro, que é relativamente inelástico à taxa de câmbio e à taxa de juros.

FOLHA - O sr. acha que a economia vai crescer quanto no ano que vem?
GABRIELLI -
Note que eu não vou falar de macroeconomia. Nossa previsão de expansão de longo prazo, até 2011, é de 4% ao ano.

FOLHA - Lula fala em até 7% ao final do governo.
GABRIELLI -
Estou dizendo que essa é a taxa de crescimento estratégica, prevista no Plano Estratégico.

FOLHA - Os 7% o sr. não acha...
GABRIELLI -
[risos] Só para dizer de forma clara: a especulação sobre [a ida para] a Fazenda é pura especulação e não passa absolutamente de especulação.

FOLHA - Uma acusação na campanha foi o uso político da Petrobras.
GABRIELLI -
Uma empresa do tamanho da Petrobras, em qualquer país do mundo, não pode analisar investimentos só do ponto de vista de curto prazo, do acionista privado. Uma empresa que tem 10% do PIB não pode dizer que não tem efeito sobre a economia e a política brasileira. A Petrobras não é apolítica, mas é apartidária.

FOLHA - Mas não é exagerado dizer que é apartidária porque o sr. é um petista militante?
GABRIELLI -
Sou petista militante e me orgulho disso. Agora, sempre evitei ação partidária na Petrobras. Sou cidadão e brigo por meus direitos de cidadão. Tenho meus direitos partidários. Tenho 57 anos e desde os 15 sou militante político.

FOLHA - Quais erros o governo e o PT cometeram?
GABRIELLI -
Acho que alguns companheiros cometeram erros na questão ética. Não preciso dizer. A imprensa publicou sete páginas por dia só sobre isso. Agora, no futuro, a história vai mostrar: quando o historiador pegar o que foi publicado nos jornais e os dados [econômicos positivos], vai haver uma certa contradição.

FOLHA - Um dos exemplos de aparelhamento do Estado que os críticos do PT dão é o secretário-geral do partido (Silvio Pereira) ter recebido uma Land Rover de uma empresa com contratos com a Petrobras (GDK). Criticam supostos benefícios à empresa intermediados por ele.
GABRIELLI -
Ganhou uma Land Rover de quem? Da GDK. O que a Petrobras deu? Não deu nada. Não tem nada a ver com isso.

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