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20/11/2006 - 10h25

Oferta de gás será "justa" em 2007 e 2008

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CLÁUDIA TREVISAN
da Folha de S.Paulo

O Brasil vai enfrentar um período "justo" no fornecimento de gás em 2007 e 2008, e o risco de falta de energia depois desse período só estará afastado com a conclusão, até 2009, dos projetos de exploração da Petrobras em Santos, Espírito Santo e Bacia de Campos e das hidrelétricas previstas pelo governo. A avaliação é de Mauricio Tolmasquim, presidente da EPE (Empresa de Planejamento Energético), criada em 2004 para cuidar do desenvolvimento do setor a longo prazo. Apesar do "buraco" no fornecimento de gás em 2007 e 2008, Tolmasquim afirma que não há risco de racionamento, mesmo que o país cresça os 5% anuais desejados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O presidente da EPE diz que o governo enfrenta o problema de ter poucas usinas hidrelétricas para serem colocadas nos leilões de energia nova. A seguir, trechos da entrevista concedida à Folha por telefone na semana passada.

FOLHA - Existe risco de falta de energia a partir de 2008 ou 2009?
MAURICIO TOLMASQUIM - Não existe possibilidade de falta de energia. As distribuidoras têm 100% de suas necessidades de energia contratadas com geradoras até 2012. É claro que não há só as distribuidoras. Existe também o mercado livre, que corresponde a 25% do total.

FOLHA - Qual a situação dos 25%?
TOLMASQUIM - É o mercado livre, dos grandes consumidores. Os distribuidores contratam a geração e, normalmente, as grandes empresas têm contratos para suas demandas. Entre 2007 e 2008, existe a questão de gás. Nós temos uma situação justa de abastecimento de gás para as termelétricas, mas ela não coloca em risco o suprimento de energia, porque as termelétricas não precisam funcionar o tempo todo. Se há problema de chuva, as termelétricas são ligadas para complementar as hídricas. Nos últimos quatro anos, as térmicas funcionaram em média 30% do tempo. Simulações mostram que haveria gás para funcionarem 60% do tempo. Além disso, a média de chuvas prevista para 2007 é 30% superior à média dos últimos 70 anos. É uma situação muito boa em termos pluviométricos, que permite passar por esse buraco, melhor dizendo, esse período justo em termos de gás que é 2007 e 2008. Por que 2009 já está resolvido? Porque em 2009 estão entrando 24 milhões de m3 de gás da Petrobras a partir de Santos, Espírito Santo e a Bacia de Campos. Além disso, há 20 milhões de m3/dia de GNL (Gás Natural Liqüefeito) no Rio de Janeiro e no Pecém, no Ceará.

FOLHA - As térmicas serão capazes de suprir a demanda com qual nível de crescimento do PIB?
TOLMASQUIM - Trabalhamos com taxas entre 4% e 5%.

FOLHA - Se o país crescer 5%, como quer o presidente Lula, já a partir do ano que vem e até o fim do segundo mandato, haverá energia?
TOLMASQUIM - Sim.

FOLHA - Se houver seca semelhante à que levou ao apagão em 2001, em quanto as térmicas teriam de funcionar para o país crescer 5%?
TOLMASQUIM - Eu não tenho essa conta precisa aqui, mas em princípio essa margem de 60% seria suficiente.

FOLHA - Se há problema no fornecimento de gás, não é equivocado o modelo de leilões de energia nova, que privilegiaram as térmicas?
TOLMASQUIM - Não foi contratada nenhuma térmica a gás nova. As que foram contratadas foram as "botox", que são as construídas recentemente que não foram amortizadas, mas são classificadas como novas.

FOLHA - Houve pouca procura por hídricas e no último leilão duas usinas não foram arrematadas.
TOLMASQUIM - O problema é que temos poucas usinas hídricas para serem leiloadas.

FOLHA - Mas duas do último leilão não foram arrematadas.
TOLMASQUIM - Sim, eram duas usinas caras, que têm custos ambientais elevados. Optamos por deixar o mercado decidir. O preço que colocamos, de R$ 156 o MW/hora, era mais caro que o preço das térmicas, de R$ 140. Por que há poucas hidrelétricas? No passado recente foi relegado a segundo plano o planejamento, que foi retomado com o novo modelo do setor elétrico. Sem planejamento, ficaram em segundo plano os inventários das bacias hidrográficas, os estudos de avaliação ambiental integrada e os estudos de viabilidade. Antes de leiloar usinas, você precisa desses estudos. No modelo antigo, a concessão era leiloada mesmo sem licença ambiental. Era um verdadeiro faz-de-conta. Agora, são licitadas só usinas que tenham licença, que é precedida daqueles estudos. A EPE está realizando os estudos, mas eles só vão frutificar mais adiante.

FOLHA - Mas não é também um faz-de-conta licitar usinas por um preço que não vai ser aceito pelo mercado, como no último leilão?
TOLMASQUIM - Cem por cento da demanda foi atendida. O que foi mais atrativo entrou. É um sistema de competição, no qual o mais atrativo ganha.

FOLHA - O problema é que isso está levando à maior dependência do gás, que está justo em 2007 e 2008.
TOLMASQUIM - Não tem aumentado a participação [do gás].

FOLHA - Não há o risco de falta de energia, mas o gás vai subir.
TOLMASQUIM - O preço do gás tende a aumentar. O mercado tem crescido em torno de 7% a 10% ao ano e a previsão é que cresça 17% nos próximos anos. Há um desajuste entre crescimento da demanda e da oferta.

FOLHA - Se não há risco de falta de energia, por que as empresas que produzem energia, as que consomem energia e os analistas do setor afirmam que ele existe?
TOLMASQUIM - Até hoje eu não vi nenhum estudo embasado que desse respaldo a essas observações. Houve um fenômeno em 2001, quando a sociedade foi pega de surpresas. Poucos analistas chamaram atenção para o problema e eu fui um deles. Acho que existe um trauma pós-racionamento, que foi muito ruim para o país.

FOLHA - Uma das condições para que o cenário com o qual vocês trabalham se concretize é que os projetos da Petrobras não atrasem.
TOLMASQUIM - Sem dúvida. É importante que o gás esteja disponível em 2009, assim como a planta de GNL e os gasodutos. Não basta ter o gás. Hoje nós temos 5.680 km de gasodutos. Estão em construção 1.076 km e mais 3.481 km estão sendo iniciados e deverão estar prontos até 2009. E as hidrelétricas não podem ser atrasadas. Também é importante a ampliação da capacidade de transmissão. Nos quatro anos, terão sido instalados 13.904 km de linhas, mais do que foi instalado nos oito anos do governo anterior.

FOLHA - Uma das críticas que o setor privado faz ao plano decenal da EPE é a de que ele se baseia em grandes projetos, como as usinas do rio Madeira, que correm risco de atrasos em razão do impacto ambiental.
TOLMASQUIM - Não existe outra opção agora. O problema que temos é o da falta de hidrelétrica para os leilões.

FOLHA - Qual o tempo necessário para os estudos de viabilidade?
TOLMASQUIM - O de inventário demora cerca de dois anos. O objetivo é ver qual a melhor distribuição das quedas para aproveitar as bacias. A avaliação ambiental integrada, mais ou menos um ano. Depois, vêm o estudo de viabilidade econômica, o de impacto ambiental e os relatórios ambientais, para, aí sim, pedir a licença prévia. Tudo demora uns quatro anos. O rio Madeira é uma forma de ganhar esse tempo.

FOLHA - Se os estudos demoram quatro anos, por que não começaram a ser feitos antes?
TOLMASQUIM - Quando começou o governo, não havia um modelo, havia um caos. A EPE foi criada em 2004 e logo começou a fazer os estudos.

FOLHA - É possível tornar o licenciamento ambiental mais rápido?
TOLMASQUIM - Existem problemas que têm de ser resolvidos. Temos uma multiplicidade de agentes que influenciam e aumentam o custo ambiental dos projetos. Parte da energia fica mais cara por causa desses custos ambientais, que passaram de uma média de 8% a 10% para algo em torno de 15% a 20%.

Especial
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