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11/02/2007 - 10h04

País paga preço do sucesso, diz Mantega

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LEANDRA PERES
VALDO CRUZ
da Folha de S.Paulo, em Brasília

O Brasil está pagando "o preço do sucesso". Essa é a razão que Guido Mantega (Fazenda) aponta para a recente onda de valorização do real ante o dólar-a moeda chegou a ser cotada a R$ 2,08 na semana passada, mas encerrou o período a R$ 2,109.

A redução no ritmo de queda dos juros teria sido outro fator, embora o ministro considere que a questão de "fundo" é que o Brasil hoje é um "uma máquina de gerar dólares". A proposta de maior abertura da economia às importações como solução para o problema não é bem-vista pelo ministro.

Crítico dos juros altos a ponto de cobrar publicamente reduções na taxa do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, Mantega compara o país a um viciado em drogas para dizer que não defende um "tranco nos juros". "[O Brasil] é como um viciado acostumado a uma dose elevada de droga. De repente você tira, não dá certo."

O gradualismo de Mantega não o leva a defender a autonomia legal do BC. Para ele, o modelo atual é eficaz, já que "o ministro da Fazenda reclama, o presidente reclama, mas o BC não funciona ao sabor de pressões políticas". Leia trechos de entrevista concedida à Folha na quinta.

Folha - A que o sr. atribui essa valorização do real nos últimos dias?

Guido Mantega - A um conjunto de fatores. Um deles foi a definição de que não haveria aumento da taxa [de juros] do Fed [o BC dos EUA], o que levou a um cenário internacional mais otimista. Ao mesmo tempo, o Brasil tem mais segurança, mais estabilidade, boas perspectivas para a economia com o PAC, com taxa de rentabilidade financeira ainda elevada. Essa combinação atrai movimento de aplicações. Quando o Copom reduziu a queda da taxa, garantiu rentabilidade maior para aplicações financeiras.

Folha - Então a decisão do Copom teve impacto na valorização do real?

Mantega - A questão é que o Brasil tem excelente saldo comercial, reservas crescentes chegando a quase US$ 93 bilhões, é uma máquina de gerar dólares. Nossa rentabilidade financeira é superior à do dólar.

Folha - O senhor acredita numa reversão desse movimento que leve à valorização do dólar?

Mantega - É muito cedo para dizer que houve desvalorização que levou o câmbio a um novo patamar. A taxa não vai voltar ao passado. Aquele câmbio de R$ 3 era porque a economia estava fragilizada, havia riscos que hoje não existem. Estamos pagando em parte o preço do sucesso. Até o sucesso tem um preço! Mas prefiro pagar o preço do sucesso ao do fracasso.

Folha - Houve um ataque especulativo ao BC?

Mantega - Não acho que foi um teste, é mais questão de oportunidade. Você tem liquidez internacional, o pessoal está querendo ganhar dinheiro em algum lugar.

Folha - Se a origem do problema cambial é o saldo comercial, o máximo que o governo pode fazer é estimular importação...

Mantega - O governo não precisa estimular importação. Tem gente que diz: "Vamos abrir mais a economia". Como abrir mais? Se você tem câmbio valorizado, barateou as mercadorias estrangeiras. A abertura já existe e isso é uma arma poderosa contra a inflação.
Folha - Países como Argentina e Rússia têm crescido a taxas mais elevadas, acompanhadas por inflação mais alta. É uma opção para o Brasil?

Mantega - Estamos trilhando um caminho talvez mais moderado, mas mais seguro. É a filosofia do nosso governo. É uma temeridade certos países crescendo a 7%, 8%, 9%, vão encontrar pontos de estrangulamento e isso pode reverter. O Brasil está acelerando o crescimento de maneira consistente e sólida. Essa é a nossa diferença.

Folha - Tem algum jeito de o governo suavizar o preço do sucesso?

Mantega - Os juros vão continuar caindo, a importação vai continuar aumentando e o governo vai continuar fazendo reservas. Esses três fatores, impulsionados pelo crescimento, deverão caminhar para o equilíbrio cambial mais favorável à produção doméstica.

Folha - O senhor discorda da redução de 0,25 ponto na taxa de juros?

Mantega - Fico satisfeito quando ela cai, e está caindo.

Folha - Em que período pode se esperar câmbio mais favorável?

Mantega - Com o PAC, vamos mudar de patamar de crescimento. O ano de 2007 é um ponto de inflexão, em que você vai dar o salto em direção ao crescimento maior. Nos últimos 20 anos, o Brasil teve planos de estabilização. Mesmo o Real, se você olhar, não é plano de crescimento. Dos últimos planos, o Real é um dos melhores, mas é de estabilização.

Folha - Mas bem-sucedido no combate à inflação.

Mantega - Relativamente bem-sucedido porque tivemos que depois emendar, deixou uma série de problemas, mas não vou entrar nessa discussão. O que quero salientar é que, finalmente, depois de 20 anos, a agenda de desenvolvimento foi colocada no país pelo PAC. É consistente, não vi nenhuma crítica substantiva. À medida que vamos mostrando resultados, essas críticas caem por terra. Por exemplo, fiquei 2006 inteiro ouvindo que o governo não iria atingir a meta de superávit primário. Fizemos resultado acima dos 4,25%. E aí? Cadê os críticos? Estão caladinhos lá. O pior é que ganhamos pouco e eles ganham muito dinheiro dando consultoria.

Folha - Para economistas como Persio Arida, André Lara Resende e Edmar Bacha, a explicação para a taxa de juros no país são incertezas jurídicas. Qual é a explicação do sr.?

Mantega - A taxa está caindo. No governo passado, você usava taxa de juro para atrair capital estrangeiro porque tinha desequilíbrio das contas externas. Se isso foi eliminado, não há razão para termos juros diferentes de outros países e estamos caminhando para isso.

Folha - Não existe um patamar-limite para o juro real no país?

Mantega - Não, não tem nenhuma restrição. Tudo isso era bobagem. Já ouvi dizer que a restrição era o juro real de 10%. É coisa de especulador, de rentista, quem quer ganhar bastante e, então, cria-se esse mito. Não sou favorável a que você dê um tranco nos juros, tem de ir gradualmente. É como o viciado, estava acostumado a uma dose elevada de droga, de repente você tira, não dá certo. Tem de tirar gradualmente.

Folha - Luiz Marinho (Trabalho) e Ricardo Berzoini (presidente do PT) defendem que se tire a droga de uma vez. Atribuíram a situação do mercado de câmbio à redução do ritmo da queda dos juros. Atrapalha o processo esse tipo de declaração?

Mantega - As pessoas podem externar suas opiniões, mesmo não sendo especialistas no assunto. País democrático é isso.

Folha - Mas isso não atrapalha, quando as críticas são muito ácidas, a condução da política econômica?

Mantega - Não acredito, dada a solidez da nossa economia. Se fosse em outro momento e alguém dissesse "vai cair o presidente do BC", provavelmente quem lançou o boato estava operando no mercado futuro. Solta o boato, mexe um pouquinho com as cotações e o sujeito ganha dinheiro. O Brasil hoje está sólido o suficiente para permitir qualquer discussão.

Folha - Em momentos de boataria, menos gente ganharia dinheiro se tivéssemos um BC independente legalmente?

Mantega - Não vejo vantagem. O arranjo atual é eficaz, já tem autonomia, às vezes o ministro da Fazenda reclama, o presidente reclama, mas o BC não funciona ao sabor de pressões políticas.

Folha - Com o PAC, quanto vamos crescer neste ano?

Mantega - Com certeza acima de 4%.

Especial
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