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27/07/2000 - 11h20

Depoimento de Malan e Lopes abre brecha para FHC depor

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JOSIAS DE SOUZA
da Folha de S. Paulo, em Brasília

Os depoimentos do ministro Pedro Malan (Fazenda) e do economista Chico Lopes (ex-presidente do Banco Central) injetaram no inquérito que apura o escândalo dos bancos Marka e FonteCindam um novo mistério. Um mistério que abre, pela primeira vez, brecha para que o presidente Fernando Henrique Cardoso seja chamado a depor.

O enigma gira em torno de um almoço ocorrido no Palácio da Alvorada. Deu-se no dia 14 de janeiro de 1999.

Estavam ao redor da mesa, entre outros, FHC, Malan e Chico Lopes. Brasília fervia. Vivia um de seus dias mais tensos sob FHC.

Os jornais estampavam em manchete de primeira página o terremoto financeiro anunciado na véspera. A Folha, por exemplo, anotava, em duas linhas de título: "Real é desvalorizado em 8,3%; saída de dólar supera US$ 1 bi". Além do prato de comida, as autoridades reunidas no Alvorada dividiram com FHC informações sobre os efeitos do tremor econômico no mercado financeiro.

Em depoimento prestado no Rio, na última terça-feira, Chico Lopes disse que, durante o almoço, pôs sobre a mesa um dado preocupante: "havia problemas na BM&F (Bolsa de Mercadorias e Futuros)". Afirmou mais: o BC estava agindo para evitar uma crise sistêmica. Com o que FHC teria concordado plenamente.

No seu depoimento, tomado na mesma terça-feira, Malan confirma que, naquele fatídico 14 de janeiro, fez não uma, mas duas refeições na companhia de Chico Lopes. Depois do almoço no Alvorada, avistou-se com o então presidente do Banco Central em um jantar.

Mas "não houve alusão às dificuldades enfrentadas nas Bolsas de Mercadoria de Futuro", registra a cópia do depoimento de Malan, obtida ontem pela Folha.

Mistério
Afinal, onde estava Malan no momento em que Chico Lopes expôs suas inquietações quanto aos riscos de turbulência na BM&F? O ministro estava no banheiro? Ausentou-se da mesa para fumar cachimbo, um hábito que aprecia? Eis o novo mistério que pende do processo.

Chico Lopes diz que não se recorda se o ministro estava por perto no exato instante em que fez tais observações. Parece um detalhe tolo. Mas esclarecê-lo é vital para a condução do inquérito.

O Ministério Público aferrou-se à tese de que o alegado "risco sistêmico" é um falso argumento, uma mentira criada para acobertar o socorro fraudulento a duas instituições que se arrebentaram na virada do câmbio: o Marka e o FonteCindam.

Os procuradores utilizam a palavra de Malan para tonificar a sua tese. Argumentam o seguinte: se o risco de contágio do sistema financeiro fosse real, o ministro da Fazenda deveria ter sido informado do drama envolvendo o Marka e o FonteCindam.

Se não foi, como sustenta Malan, é porque não havia risco. Ou pior: talvez estivessem querendo esconder dele algo que já se sabia ilegal.

FHC
A possibilidade de que Chico Lopes tenha mencionado no almoço do Alvorada, ainda que vagamente, os "problemas na BM&F" poderia funcionar como atenuante. Daí a relevância de que FHC confirme a versão do ex-presidente do BC. Ou, por outra, a desminta.

O presidente da República pode ser chamado ao inquérito pelos advogados de Chico Lopes, pelo Ministério Público ou pelo juiz Abel Gomes, sob cuja vara o processo se desenrola.

Na hipótese de ser convocado a depor, FHC responderia a um questionário escrito, uma prerrogativa de seu cargo.

Ontem, reunidos no Rio, os procuradores envolvidos no caso analisavam as possibilidades abertas com os novos depoimentos. Ciosos da delicadeza do processo, negavam-se a falar em público.

Preços camaradas
O socorro ao Marka e ao FonteCindam sorveu R$ 1,574 bilhão dos cofres públicos. Sob Chico Lopes, o Banco Central vendeu dólares a preços camaradas, para que os bancos liquidassem contratos assumidos no mercado futuro.

No depoimento da última terça-feira, colhido em seu gabinete, na pasta da Fazenda, Malan repisou a tecla de que não teve conhecimento prévio da operação-hospital montada no Banco Central.

Não bastassem o almoço e o jantar do dia 14, duas oportunidades em que poderia ter trocado idéias com Chico Lopes sobre o tema, o ministro esteve na sede do Banco Central no dia seguinte. Passou pela sala em que a diretoria do banco discutia o socorro ao Marka. Mas não viu nem ouviu nada.

Na noite de 15 de janeiro, viajou com Chico Lopes para os EUA. De novo, passaram ao largo do assunto. O curioso é que o ministro sustenta que sua presença na sede do BC, inusual, deveu-se à "preocupação com o futuro da economia brasileira e inclusive do sistema financeiro" após a mudança na política cambial.

O socorro ao Marka fora costurado na véspera do embarque de Malan e Lopes para os EUA. No momento mesmo em que os dois jantavam.

Mas nada foi nem sequer insinuado ao ministro, embora Lopes lhe devesse lealdade de subordinado hierárquico.

O depoimento de Chico Lopes suscitou uma penca de outras dúvidas. No instante em que mencionou a FHC os "problemas na BM&F", por que o presidente não o crivou de perguntas?

Um mínimo de curiosidade teria levado FHC a perscrutar sobre que problemas seriam aqueles, que instituições financeiras corriam risco e quais as providências esboçadas pelo Banco Central. Estavam ali, afinal, para discutir o impacto da desvalorização cambial no mercado.

Outra dúvida: se Malan não estava à mesa, por que FHC e Chico Lopes não se preocuparam em inteirá-lo de tudo?

Se não por outro motivo, ao menos para ouvir a opinião do ministro da Fazenda, maior autoridade econômica do governo.



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