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20/05/2001 - 08h40

"Ministro do apagão" admite rever veto a luz extra

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VALDO CRUZ
da Folha de S.Paulo, em Brasília

O ministro Pedro Parente, que coordena a Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica, o "ministério do apagão", declarou que o governo vai usar o "bom senso" para analisar casos excepcionais no programa de racionamento lançado anteontem.

"Não somos dogmáticos, não somos estritamente rígidos na norma. Vamos ter toda a abertura para avaliar questões especiais", afirmou o ministro.

O ministro informou que o governo vai analisar a possibilidade de rever a medida que proibiu a contratação de energia para novos projetos industriais. Segundo ele, se o programa de racionamento de energia apresentar sinais positivos, essa regra será uma das primeiras candidatas à revisão.

Alguns pontos do programa ainda estão indefinidos, como as regras para a implementação do corte de energia dos consumidores que não cumprirem a meta de redução de consumo de energia elétrica e os parâmetros que as distribuidoras deverão seguir para as pessoas que não ocupavam no ano passado o imóvel em que residem hoje.

Parente fez questão de dizer, porém, que o corte de energia elétrica dos consumidores não é somente uma ameaça.

"É muito importante ficar claro que quem não cumprir a meta estará sujeito ao corte." Segundo o ministro, a alternativa a esses cortes seria "cortar todo mundo todo dia".

Coordenador do "ministério do apagão", o ministro da Casa Civil criticou os políticos de oposição que estão prometendo não cumprir as medidas do programa de racionamento de energia.

Segundo Parente, eles estão demonstrando que têm "um tipo de visão extremamente míope" e continuam apostando no "quanto pior, melhor".

Os prefeitos petistas Marcelo Déda (Aracaju) e João Paulo (Recife) ameaçam não seguir as regras definidas pelo governo Fernando Henrique Cardoso para reduzir o consumo de energia elétrica no país.

Parente reclamou também daqueles que estão ameaçando entrar na Justiça contra o programa. "Infelizmente, entrar na Justiça virou esporte nacional".

Parente gasta mensalmente cerca de R$ 200 pela conta de luz. Para seguir as regras que ele mesmo definiu, disse que está providenciando a instalação de um sistema de aquecimento a gás em seu apartamento.
A seguir, trechos da entrevista concedida à Folha anteontem à noite.

Folha - O plano tem gerado algumas reações contrárias, como alguns prefeitos de oposição dizendo que não vão respeitar as regras...
Pedro Parente -
Bom, em primeiro lugar, gostaria de dizer que para benefício do país essa não é uma posição generalizada nem sequer majoritária. O que notamos é um interesse muito grande de participar e de contribuir. Em segundo lugar, demonstra exatamente um tipo de visão extremamente míope, de pessoas que não conseguem afastar o interesse partidário do interesse nacional maior. Estão naquela de que se é ruim para o país, é ruim para o governo. Eu acho que deveriam fazer uma distinção. Não necessariamente o que o governo quer é ruim para o país. Portanto essa visão precisaria melhorar um pouquinho.

Folha - Essas pessoas estão pensando mais no interesse individual do que no coletivo. É isso o que o sr. quer dizer?
Parente -
Nós não estamos aqui discutindo uma coisa que diz que corta ou não corta. Nós estamos discutindo como cortar, porque corte tem de ter. Nós temos três alternativas de corte. Um corte generalizado, em que todos pagam. Ou um corte que dá condição à sociedade de contribuir, buscar se administrar, para fazer esse corte da melhor forma possível. Ou, por último, acontece o corte porque o sistema pifa, entra em colapso, o sistema cai. Nós achamos que devemos dar à sociedade, às empresas, às famílias o direito de tentar administrar isso. Eles [oposição] não se preocupam com isso porque continuam com a tese do quanto pior, melhor.

Folha - O ministro do STF Marco Aurélio de Mello disse que a sobretaxa é uma forma de confisco...
Parente -
Não sou um especialista na matéria, não ousaria contestar Sua Excelência. Seria um confisco se não fosse destinado aos próprios consumidores. O que estamos fazendo é uma tarifa adicional que é devolvida aos próprios consumidores. Não estamos vendo nessa situação nenhum confisco. Mas temos a certeza de que se a matéria for ao Supremo teremos condições de fazer uma boa defesa e Sua Excelência terá condições de se manifestar nos autos.

Folha - O governo não está preocupado com uma enxurrada de ações na Justiça?
Parente -
Veja, a situação que nós vivemos hoje é grave. Procuramos não esconder isso da população. É preciso que seja entendida dessa forma também pelos órgãos da Justiça. Acreditamos que isso vai acontecer. Liminares, ações na Justiça, isso é uma coisa que infelizmente virou um esporte nacional, acontece numa forma muito além do que seria razoável. Mas temos enfrentado situações como essas, temos defendido as posições do governo, perdemos algumas, ganhamos a maioria. Então, achamos que temos base jurídica suficiente para enfrentar essa situação.

Folha - Onde o governo errou para a situação chegar ao que estamos vivendo?
Parente -
Olha, como já dissemos, não vamos entrar nessa discussão. O grupo não foi criado para explicar o passado, e sim para tentar equacionar o futuro da melhor forma possível. Então, sem fazer trocadilho, discutir o passado é perder energia.

Folha - O racionamento pode ser estendido até março do ano que vem?
Parente -
Não se prevê isso, não. O que temos de previsão, pelas discussões, é que esse racionamento duraria até o início do próximo período de chuvas, em novembro ou dezembro.

Folha - E os impactos sobre a economia, crescimento do país, inflação, desemprego. Como vocês estão avaliando?
Parente -
O máximo que a gente consegue dizer neste momento é que, ao permitir que cada empresa, cada família, possa administrar seu próprio corte, essa é a melhor forma de minimizar os impactos sobre crescimento, sobre emprego. É o máximo que a gente consegue.

Folha - As companhias vão ter estrutura para cortar energia de todo mundo que não cumprir a meta de redução? Muita gente não deve atingir essa meta pelo menos no primeiro mês.
Parente -
Como eu disse, vamos ter uma discussão no âmbito da Câmara [de Gestão da Crise de Energia Elétrica] na próxima semana para definir algumas diretrizes. Tais como: o corte vai ser no dia em que recebe a conta, alguns dias depois. É compreensível que não tenhamos chegado a esses detalhes, porque trabalhamos nesse programa de racionamento praticamente dois dias e meio. Até porque não se consegue antecipar todas as particularidades que existem na vida real. A nossa disposição é dizer: "Olha, não somos dogmáticos, não somos estritamente rígidos na norma, vamos ter toda a abertura para avaliar questões especiais, excepcionais". E vamos fundamentalmente usar o bom senso.

Folha - O governo pode flexibilizar o corte nesta primeira fase?
Parente -
Não quero antecipar nada, porque vai ser uma discussão que será feita na câmara. Agora, é muito importante ficar claro que quem não cumprir a meta estará sujeito a um corte. Essa é a situação. Eu sempre digo, "procure entender, não é que eu quero lhe cortar, não é que o governo é ruim". Nós estamos dizendo que a gente precisa que isso dê certo, precisa da colaboração para que a gente não venha a cortar todo mundo todo dia.

Folha - E quanto à regra que impede contratações de energia para novos projetos industriais e comerciais? Há uma pressão para que seja revista. O governo pode mudá-la?
Parente -
Olha, nós fizemos a chamada freada de arrumação. Precisávamos botar o pé nisso. Não fazia sentido ligar mais gente no sistema, pendurar mais demanda, quando ela não dá para os que já estão lá. Agora, se a gente tiver uma evolução favorável, sentir que as coisas vão bem, não teremos nenhum problema em rever essa norma. Então, sem dúvida nenhuma, nós pensaremos em fazer. Mas é preciso termos sinais favoráveis. De graça, sem mais nem menos, não. Agora, essa [regra" certamente é uma das candidatas à revisão.

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