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22/10/2001 - 11h17

Investidor leva a pior após concordata da Boi Gordo

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CAROLINA MANDL
Free-Lance para a Folha de S.Paulo

Os cerca de 20 mil investidores que aplicaram nos contratos de investimento coletivo da Fazendas Reunidas Boi Gordo, que pediu concordata na semana passada, devem ficar de olhos bem abertos nos próximos dias.

Eles foram atrás da polpuda rentabilidade de 42%, que a empresa oferecia baseada na engorda de bois e na valorização do preço da arroba, sem desconfiar que, quanto maior o ganho, maior o risco do investimento.

Agora, para tentar reaver seu dinheiro, eles terão de acompanhar, passo a passo, o andamento da concordata que tramita na Vara Única da Justiça de Comodoro (MT) e que dá um prazo de dois anos para a empresa pagar seus credores.

Desde março, Paulo Roberto de Andrade, diretor-presidente da Boi Gordo, tem estado com investidores na sua porta que tentavam, sem sucesso, resgatar o dinheiro de contratos já vencidos.

A Folha acompanhou a agonia da empresa nos últimos meses e, mais de uma vez, alertou para o risco que corriam os investidores. De acordo com os advogados consultados pela Folha, o primeiro passo para quem tem dinheiro aplicado na empresa é conferir a relação de credores. A Boi Gordo é obrigada a publicar, até o dia 17/11, uma lista com o nome dos seus credores e o montante devido a cada um em jornais de todas as cidades onde tem filial.

Preste atenção no valor devido porque esse pode ser um ponto polêmico. A rentabilidade parou de correr a partir do dia em que a Boi Gordo entrou com o pedido de concordata (15/10).

Segundo o advogado Aldo de Cresci Neto, a maior dificuldade do investidor para conferir essas informações será ter de ir até Comodoro, onde corre o processo. A sugestão dele é formar uma associação para diluir os custos. Um único advogado poderia representar o grupo.

Rentabilidade
A alta rentabilidade oferecida pelos contratos de engorda de boi foi o chamariz para muitos investidores. Eram 42% em 18 meses, cifra bem distante dos 12,9% acumulados pela poupança no mesmo período (01/05/2000 a 01/11/ 2001), investimento que garante R$ 20 mil em caso de quebra da instituição financeira.

Há três anos, a empresária Mara Lúcia de Paula, 38, começou a aplicar em engorda de boi e ficou tão encantada com o primeiro ganho que obteve que resolveu reaplicar em novos contratos. Tem a receber R$ 30 mil. Diante da concordata, procurou a empresa. "Cheguei a pedir até o boi como pagamento, mas eles não aceitaram", diz ela. "Agora já dei o dinheiro como perdido."

A ilusão de estar aplicando em um ativo real também deu mais confiança a muitos investidores. É o caso do químico José Roberto Scigliano, 62, que chegou a visitar uma das fazendas da Boi Gordo. "Vi que era um local muito bom e nunca pensei que isso pudesse acontecer."

Mas, apesar da ilusão de serem ativos tangíveis _ao contrário das ações, dos títulos de renda fixa e das operações em mercados futuros_, os bois também acabaram sumindo do pasto.

De acordo com um estudo feito pelo professor Alberto Borges Matias, da Faculdade de Economia e Administração da USP, desde 1998 a empresa perde dinheiro com sua atividade principal, a engorda dos animais.

Ele também analisou o último balanço anual da Boi Gordo, divulgado em maio deste ano, e constatou que ela teve um prejuízo de R$ 286,8 milhões no exercício. "Se a atividade não era lucrativa, a empresa tinha que buscar o dinheiro de novos investidores para pagar aqueles que saíam."

Com base na análise da empresa, Matias conclui que "o pagamento começa a ficar inviável a partir do momento em que novos investidores não aplicam mais ou que os antigos resolvem sacar para realizar o lucro da aplicação."

Ao ir à lona, a Boi Gordo contabilizava R$ 746 milhões de recursos de investidores, sendo que R$ 107,1 milhões foram captados por meio de títulos emitidos sem a autorização da CVM (Comissão de Valores Mobiliários). Por outro lado, investidos em boi havia apenas R$ 115 milhões. Em imóveis, máquinas e veículos existiam cerca de R$ 354,3 milhões.

Explicação
De acordo com a empresa, a concordata foi provocada pela demora da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) na aprovação de um novo lote de contratos, o que impediu as reaplicações de investidores antigos e as vendas de títulos a novos clientes. Ou seja, barrou a entrada de dinheiro.

A informação é negada pela autarquia. "Dois meses e meio é um período que deve estar na programação da empresa", diz José Luiz Osório de Almeida Filho, presidente da CVM.

Os prejuízos com a operação de engorda de boi também são negados pela Boi Gordo. De acordo com Ary Oswaldo Mattos Filho, consultor jurídico da empresa e ex-presidente da CVM, esse é um problema resultado das normas contábeis, que acabam fazendo o balanço não retratar a realidade da empresa. Mas, segundo o presidente da CVM, nem a empresa nem sua auditoria reclamaram dessa questão.

Mattos Filho também afirma que pedir a concordata foi uma forma que a empresa encontrou de honrar seus compromissos. Segundo ele, a Boi Gordo poderia ter optado por vender seus maiores ativos, os imóveis. "O problema é que, apesar de serem valiosos, eles são muito grandes e demoram para ser negociados."
 

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