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19/05/2002
-
07h24
GILSON SCHWARTZ
articulista da Folha
Até poucas semanas atrás falava-se na capacidade brasileira de escapar ao "contágio" da crise argentina. Agora está claro que o Brasil não escapa, diante dos investidores internacionais, de uma ampla frustração com toda a região. A falta de resultados na cúpula entre União Européia e América Latina, que terminou ontem em Madri, é um dos principais sintomas desse novo ciclo de pessimismo.
Não se trata apenas da velha desconfiança diante dos sistemas políticos latino-americanos. O fato é que a natureza dos riscos econômicos é a mesma em toda a região, onde houve a adoção generalizada de modelos econômicos dependentes demais da liquidez nos mercados financeiros internacionais.
O contraste entre América Latina e Ásia volta a ser radical. Um dos exemplos mais contundentes é o setor de telecomunicações. Na semana passada, foi anunciado o cancelamento do evento Telecom Americas 2003, que aconteceria na Argentina, em fevereiro de 2003, promovido pela UIT (União Internacional de Telecomunicações).
A entidade procura um país que se candidate a hospedar o evento em 2004 ou 2005. Mas já em 2003 acontecerá uma cúpula mundial sobre sociedade da informação, promovida também pela UIT. A América Latina corre o risco de se preparar mal para mais uma instância decisiva de negociação global.
O problema não é apenas político ou macroeconômico. Parte significativa da privatização do setor de telecomunicações na América Latina teve como protagonistas empresas de Portugal e principalmente da Espanha. Os prejuízos dessas empresas têm sido significativos.
A Telefónica anunciou na semana passada uma queda de 72% nos lucros no primeiro trimestre de 2002. Só a desvalorização cambial argentina gerou perda de US$ 1 bilhão para a empresa, cujas ações já perderam 18% do seu valor neste ano. Resultado prático para a América Latina: corte de 64% nos investimentos da Telefónica na região.
Na Ásia, o evento regional da UIT está confirmado e acontece em dezembro deste ano, em Hong Kong (China), com previsão de 50 mil participantes.
A agricultura é outro setor em que as perspectivas tornaram-se sombrias. Há três semanas os EUA declararam uma autêntica guerra econômica ao resto do mundo, adotando uma nova lei de subsídios agrícolas. O cenário nesse setor crucial para o desempenho das exportações brasileiras está piorando rapidamente.
O protecionismo norte-americano tende a estimular mais protecionismo europeu. Na prática, países como o Brasil, que dependem fortemente das suas exportações agrícolas, tendem a ficar numa sinuca, com excesso de oferta de mercadorias. O resultado inevitável é a queda nos preços desses produtos.
Telecom e agricultura desenham um garrote econômico. De um lado, a alta tecnologia, de outro, produtos tradicionais. Na alta tecnologia, as perspectivas de substituição de importações dependem de mais investimentos estrangeiros, que estão sendo cortados. Na pauta exportadora tradicional, os preços tendem a cair, dificultando a geração de divisas e pressionando a taxa de câmbio e a inflação.
Nesse contexto de asfixia econômica estrutural, ter escapado ao "contágio" argentino não parece muito reconfortante. As opções para o próximo presidente brasileiro são bastante limitadas. Aliás, a continuar esse jogo bruto na cena mundial, pode afinal fazer pouca diferença o resultado da atual campanha eleitoral.
AL volta a ser pólo de frustrações econômicas
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articulista da Folha
Até poucas semanas atrás falava-se na capacidade brasileira de escapar ao "contágio" da crise argentina. Agora está claro que o Brasil não escapa, diante dos investidores internacionais, de uma ampla frustração com toda a região. A falta de resultados na cúpula entre União Européia e América Latina, que terminou ontem em Madri, é um dos principais sintomas desse novo ciclo de pessimismo.
Não se trata apenas da velha desconfiança diante dos sistemas políticos latino-americanos. O fato é que a natureza dos riscos econômicos é a mesma em toda a região, onde houve a adoção generalizada de modelos econômicos dependentes demais da liquidez nos mercados financeiros internacionais.
O contraste entre América Latina e Ásia volta a ser radical. Um dos exemplos mais contundentes é o setor de telecomunicações. Na semana passada, foi anunciado o cancelamento do evento Telecom Americas 2003, que aconteceria na Argentina, em fevereiro de 2003, promovido pela UIT (União Internacional de Telecomunicações).
A entidade procura um país que se candidate a hospedar o evento em 2004 ou 2005. Mas já em 2003 acontecerá uma cúpula mundial sobre sociedade da informação, promovida também pela UIT. A América Latina corre o risco de se preparar mal para mais uma instância decisiva de negociação global.
O problema não é apenas político ou macroeconômico. Parte significativa da privatização do setor de telecomunicações na América Latina teve como protagonistas empresas de Portugal e principalmente da Espanha. Os prejuízos dessas empresas têm sido significativos.
A Telefónica anunciou na semana passada uma queda de 72% nos lucros no primeiro trimestre de 2002. Só a desvalorização cambial argentina gerou perda de US$ 1 bilhão para a empresa, cujas ações já perderam 18% do seu valor neste ano. Resultado prático para a América Latina: corte de 64% nos investimentos da Telefónica na região.
Na Ásia, o evento regional da UIT está confirmado e acontece em dezembro deste ano, em Hong Kong (China), com previsão de 50 mil participantes.
A agricultura é outro setor em que as perspectivas tornaram-se sombrias. Há três semanas os EUA declararam uma autêntica guerra econômica ao resto do mundo, adotando uma nova lei de subsídios agrícolas. O cenário nesse setor crucial para o desempenho das exportações brasileiras está piorando rapidamente.
O protecionismo norte-americano tende a estimular mais protecionismo europeu. Na prática, países como o Brasil, que dependem fortemente das suas exportações agrícolas, tendem a ficar numa sinuca, com excesso de oferta de mercadorias. O resultado inevitável é a queda nos preços desses produtos.
Telecom e agricultura desenham um garrote econômico. De um lado, a alta tecnologia, de outro, produtos tradicionais. Na alta tecnologia, as perspectivas de substituição de importações dependem de mais investimentos estrangeiros, que estão sendo cortados. Na pauta exportadora tradicional, os preços tendem a cair, dificultando a geração de divisas e pressionando a taxa de câmbio e a inflação.
Nesse contexto de asfixia econômica estrutural, ter escapado ao "contágio" argentino não parece muito reconfortante. As opções para o próximo presidente brasileiro são bastante limitadas. Aliás, a continuar esse jogo bruto na cena mundial, pode afinal fazer pouca diferença o resultado da atual campanha eleitoral.
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