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16/06/2002 - 10h05

Dúvida da dívida assola investidor comum

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SANDRA BALBI
da Folha de S.Paulo

Nas duas últimas semanas o cidadão comum, que aplica suas economias em fundos DI e de renda fixa, amargou a perda de 0,5% e 1,25%, respectivamente, em suas aplicações. Foram para o ralo R$ 3,5 bilhões desde o dia 29 de maio até o último dia 12.

Muitos, assustados, sacaram seus investimentos assaltados pela dúvida que já tomava analistas financeiros: a dívida interna é sustentável? O novo governo dará calote na dívida?

Ouvidos pela Folha, alguns desses analistas afirmam: não há a menor chance de calote ou reestruturação da dívida, ganhe quem ganhar as eleições. "A dívida pública é perfeitamente manejável", afirma Walter Mundel, economista e consultor financeiro.

Por que, então, a histeria dos últimos dias? É que a dúvida da dívida chegou ao cidadão comum.

Há uma máxima no mercado financeiro: quando o jornaleiro começa a discutir a cotação das ações, é hora de vender.

Foi o que aconteceu nos últimos dias com os investidores dos fundos DI. Eles descobriram que os ganhos de 243,28% obtidos desde 1996 foram proporcionados pelos títulos da dívida mobiliária do governo, que há tempos preocupa analistas locais e internacionais, mas que eles ignoravam.

A dívida mobiliária federal, o papelório do governo em poder do mercado, corresponde hoje a 48,3% do PIB. Somada à dívida externa líquida e à dívida não mobiliária, o endividamento total do governo corresponde a 54,5% do PIB, segundo dados do BC.

Os investidores de fundos e participantes de fundos de pensão são os principais credores desse papagaio. Esses investidores detêm 35,7% da dívida mobiliária interna do governo federal.

Nas últimas semanas, eles conheceram a volatilidade (oscilação) das LFTs (Letras Financeiras do Tesouro), os papéis que até então eram garantia de ganhos polpudos e estáveis das suas aplicações, e descobriram que não há porto seguro para investimentos. E passaram a temer um calote.

Efeito Orloff
Os analistas consultados pela Folha descartam a possibilidade de ocorrer um calote, ou uma megatroca de títulos públicos, como fez o ex-ministro Domingo Cavallo na Argentina, forçando uma reestruturação da dívida em condições desfavoráveis aos credores.

Há razões técnicas para tal crença."Nem o tamanho nem o prazo da dívida é problema, o problema é saber se existe uma política fiscal que financie o pagamento dos juros", observa Mundel.

Se o novo governo mantiver o superávit primário no patamar atual, de 3,75% do PIB, terá bala para continuar rolando a dívida.

Para Walter Mendes, diretor da Schroder Investment Brasil, não existe risco de explosão da dívida se houver um mínimo de estabilidade. Uma conta que costuma ser feita pelos analistas para demonstrar que a dívida pública é sustentável mostra que, com uma taxa de juro real de 10% ao ano, como a atual, é preciso um crescimento de 3% do PIB e um superávit primário de 3,6% do PIB para manter a atual relação dívida/PIB.

Se reduzir o juro real para 9% ao ano e houver um crescimento de 2% no PIB, é preciso um superávit primário de 3,7% do PIB para manter a dívida estável. "Mas, nessa simulação, se o PIB crescer 4% em vez de 2%, a dívida cai no longo prazo", diz Mendes.

Na sua opinião, o medo da dívida decorre de seu tamanho, do baixo crescimento do PIB e dos juros altos. Além disso, há a indefinição dos candidatos de oposição sobre como tratarão a dívida.

Rejeição do governo
O receio dos analistas é que, apesar de controlável, a dívida mobiliária comece a ser rejeitada pelos credores caso as oposições não dêem sinais inequívocos de que honrarão os pagamentos. No limite, estaremos rolando a dívida diariamente, no overnight, a partir de agosto ou setembro.

Se as tensões atuais não forem desarmadas, "o mercado poderá requerer um juro elevado na rolagem da dívida no início de 2003", diz Octávio de Barros, economista-chefe do BBV Banco.

A hipótese de a nova equipe econômica não aceitar pagar os juros pedidos pelo mercado, segundo ele, lembra a troca de dívida feita pela Argentina.

"Se isso ocorrer, o risco Brasil irá para perto de 2.000 pontos, as agências de risco rebaixarão o 'rating' do país, o crédito externo secará, haverá fuga de investimentos diretos, pressão cambial, pressão inflacionária, juros altos, crescimento medíocre", diz Barros.

Para Gabriel de Moura, diretor do Banco1.net, "a pior situação seria uma 'renegociação involuntária' da dívida, como na Argentina". Na sua opinião, se o mercado não aceitar as condições de rolagem da dívida do novo governo, a saída seria ele resgatar os títulos, trocando parte da dívida por moeda, o que geraria inflação. "O calote está descartado; o governo perderia credibilidade e não conseguiria mais se financiar."

Há analistas que sonham até com o impensável para acalmar o mercado. Para Vladimir Caramaschi do Vale, analista da corretora Fator Dora Atherino, é preciso um pacto político entre o governo e o PT em torno de medidas fiscais fortes.
 

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