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02/12/2002 - 07h53

Pobres são os que mais sofrem com o retorno da inflação

ANDRÉ SOLIANI
da Folha de S.Paulo, em Brasília

O repique inflacionário deve aumentar a pobreza no país, segundo pesquisadores ouvidos pela reportagem. Todas as classes sociais estão perdendo com o aumento de preços, mas os pobres são as principais vítimas, pois a inflação agora se concentra nos alimentos.

"Provavelmente haverá um aumento da pobreza em 2002 em decorrência da alta da inflação", afirma Sônia Rocha, especialista em questões sociais e coordenadora de programa da FGV-RJ.

Os diferentes índices de inflação deixam claro que, neste ano, o custo de vida dos pobres está subindo mais rapidamente que o das demais classes sociais. Nos últimos 12 meses, especialmente desde setembro, quanto mais o índice está relacionado com a cesta de consumo de uma família de baixa renda, maior o seu valor.

A inflação não pune sempre as classes de menor renda mais do que as classes média e alta. Nos primeiros anos do governo Fernando Henrique Cardoso (que tomou posse em 1995), por exemplo, o aumento de preços se concentrou no setor de serviços.

Os maiores aumentos eram das mensalidade escolares, das consultas médicas e dos serviços, como cabeleireiro e encanador. O preço desses itens praticamente não afeta o bolso dos pobres, afirma o professor de economia da Unicamp Geraldo Biasoto.

Entre os indicadores de inflação analisados pela reportagem, o custo da cesta básica, o melhor entre os utilizados para medir o aumento do custo de vida para os pobres, foi o que apresentou a maior variação.

Em 15 das 16 capitais pesquisadas pelo Dieese, a alta do preço da cesta básica entre novembro de 2001 e outubro de 2002 foi superior a 10%. Em dez capitais, a inflação ficou acima de 15%.

O IPCA, que mede inflação para pessoas que ganham de 1 a 40 salários mínimos, foi de 8,45% no mesmo período. Isso mostra que a inflação para os "mais ricos" está menor que para os "mais pobres". O INPC, que mede inflação para famílias que ganham entre 1 e 8 salários mínimos, foi de 10,26%.

O ICV (Índice de Custo de Vida) do Dieese também mostra que os pobres são os maiores perdedores. O indicador mede inflação em São Paulo para três estratos de renda. A inflação para o terço mais pobre da população é a maior de todas.

Comida e pobreza
"Claro que a inflação vai ter um impacto na pobreza. Nós estamos tendo aumento de preço dos alimentos, do gás de cozinha, da eletricidade, da água e, nos próximos dias, vai ter aumento no preço dos transportes. Isso vai ter muito impacto nos índice de pobreza", afirma Cornélia Porto, coordenadora do Índice de Custo de Vida (ICV) do Dieese.

Segundo a pesquisadora do Dieese, o preço da comida é a principal razão para um aumento maior do custo de vida dos que têm renda menor. Cálculos de Sônia Rocha mostram que entre as famílias que ganham até dois salários mínimos os gastos com alimentos correspondem a 33,51% do orçamento. Para quem ganha mais de 30 salários, o vilão da inflação mais recente atinge apenas 10,31% da renda total.

A elevação das tarifas públicas e do preço do gás de cozinha também tem um impacto maior no orçamento dos mais pobres. Nos dois itens, os índices de reajustes estão acima dos índices médios de inflação ao consumidor.

Pobreza no Brasil
Os resultados da inflação farão com que os programas de transferência de renda do governo não consigam melhorar os índices de pobreza no Brasil, segundo Sergei Soares, pesquisador do Ipea. Atualmente, existem cerca de 54 milhões de pessoas vivendo com menos dinheiro que o necessário para suprir as necessidades básicas de um cidadão.

Para Soares, programas como o Fome Zero, proposto pelo novo governo, só conseguirão compensar os efeitos inflacionários deste ano. Ou seja, não são esperadas reduções da pobreza no país no curto prazo. A situação poderia ser pior, se os programas de transferência de renda não existissem.

A pior notícia, no entanto, fica por conta dos mecanismo que os economistas consideram necessário para que o repique inflacionário recente não contamine os preços no ano que vem.

Segundo o professor de economia da Unicamp, Luiz Gonzaga Belluzzo, será preciso conter aumentos salariais para que a inflação não entre em descontrole. Não deverá haver recuperação da renda das famílias brasileiras, corroída pela aceleração da inflação, se o próximo governo não quiser perder o controle dos preços.
 

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