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26/12/2004 - 09h00

BC via problema no Banco Santos desde 2001

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MARIO CESAR CARVALHO
da Folha de S.Paulo

O Banco Central sabia desde o primeiro semestre de 2001 que o Banco Santos aumentava seus lucros por meio de "operações não-usuais", feitas com empresas controladas por Edemar Cid Ferreira. Tinha provas, também, de que diretores do banco usaram dados falsos para conceder empréstimos a empresas que não tinham como pagá-los.

O BC define "operações não-usuais" como as que não são feitas rotineiramente pelo banco, segundo a assessoria de imprensa do órgão.

As "operações não-usuais" e o uso de informações falsas são detalhados em dois documentos do Banco Central obtidos pela Folha: uma carta de 13 de abril deste ano e um termo de comparecimento do dia 13 de maio. Termo de comparecimento é o jargão usado pelo BC para o documento que notifica e alerta os diretores de um banco de irregularidades ou de indícios de operações irregulares. Com esse documento, o BC exigiu que Edemar mudasse a diretoria do banco no meio deste ano.

O termo de comparecimento compara o lucro do Banco Santos em 2001, 2002 e 2003 com os "resultados não-usuais" nesse mesmo período. A coluna de lucro líquido nos três anos soma R$ 201 milhões; a de "resultados não-usuais" é de R$ 308 milhões.

Resumo da ópera: sem as "operações não-usuais" o Banco Santos teria acumulado um prejuízo de R$ 107 milhões.

Logo na primeira página do termo de comparecimento, de um total de 15, o BC frisa que os trabalhos de fiscalização apontam o "grave comprometimento da situação econômico-financeira do conglomerado financeiro Santos". Usando como referência a data de 31 de março de 2004, o BC aponta que o patrimônio líquido exigido do banco apresentava um déficit de R$ 463,69 milhões.

O Banco Central tem técnicos na sede do Banco Santos desde o primeiro semestre de 2002, mas só decretou a intervenção na instituição em 12 de novembro deste ano. Passaram-se mais de três anos desde que o BC detectou o uso de empresas controladas por Edemar para elevar os lucros do banco --problema que se tornaria recorrente até 2003, segundo os dois documentos.

Nos 226 dias que dividem o alerta do BC a Edemar e o decreto de intervenção, o buraco do Banco Santos saltou para R$ 700 milhões, segundo o BC. A empresa de auditoria Trevisan e Associados tem uma estimativa maior --prevê que o rombo será de mais de R$ 1 bilhão.

Fábrica de lucro

Os dois documentos descrevem como funcionava a fábrica de lucros do Banco Santos. A mais fácil de ser entendida aconteceu no primeiro semestre de 2001. No dia 20 de junho daquele ano, o Banco Santos adquiriu da Invest Santos por R$ 988 mil a E-Financial, uma empresa de informática que já era de Edemar e tinha como único cliente o próprio Banco Santos.

No mesmo dia, o Banco Santos vendeu a E-Financial para a Procid, que também é de Edemar, por R$ 51 milhões. Resultado: o caixa do banco aumentou R$ 50,1 milhões com essa troca de papéis, o que ajudou a instituição a ter em 2001 um lucro líquido de R$ 15 milhões. Sem essa operação, o resultado do Banco Santos seria um prejuízo de R$ 35 milhões.

Essa não foi a única vez que o Banco Santos lucrou com a venda de empresas de Edemar para ele mesmo. Em 15 de dezembro de 2003, por exemplo, o Banco Santos vendeu para a Invest Santos as ações que detinha da Valor Capitalização por R$ 14,5 milhões. Oito dias depois, a Invest Santos passou a Valor Capitalização para a Procid por R$ 30,9 milhões.

O BC notou no primeiro semestre de 1998 a primeira dessas operações entre empresas controladas pelo Banco Santos. Uma venda de derivativos por parte de uma delas gerou um lucro de R$ 14 milhões.

Empresas de fachada

O Banco Santos emprestou R$ 283 milhões para um grupo de quatro empresas que o Banco Central não sabe o que fazem: a Quality, a Delta, a Omega e a Creditar. Segundo as investigações do BC, tudo indica que são empresas de fachada, usadas por Edemar para tirar dinheiro do banco.

Veja o caso da Quality. O procurador da empresa é o editor Pedro Paulo de Sena Madureira, amigo de Edemar que ajudou o banqueiro a converter-se em mecenas e colecionador. A Quality foi agraciada com empréstimos do Banco Santos de R$ 145,46 milhões (o equivalente a US$ 53,8 milhões). Sena Madureira diz não saber o que faz a Quality. Debocha com amigos que a única Quality que conhece é a margarina.

Funcionários do Banco Santos contaram à Folha que diretores do banco usavam números do CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) de outras empresas para que o BC não notasse os empréstimos para as "gregas" (apelido usado internamente para designar as quatro empresas). Como os diretores sabiam que o BC monitorava os empréstimos para o quarteto, toda vez que saía dinheiro para elas eles usavam CNPJs de grandes empresas, como o Pão de Açúcar.

O Banco Central notou a tentativa de fraude. Na seção dedicada às "gregas", o "termo de comparecimento" assinala: "Empresas cujas dívidas eram informadas ao Banco Central em nome de outros devedores". Em seguida, lista uma série de irregularidades nesses empréstimos:

"Demonstrações financeiras não-auditadas, em alguns casos com falhas rudimentares";

"Patrimônio líquido das empresas incompatível com os empréstimos concedidos";

"Controladora sediada em paraíso fiscal, sem qualquer informação de natureza contábil, financeira ou sobre seus acionistas e administradores";

"Inexistência de garantias".

Salvação dos créditos

A maior das "operações não-usuais" listadas pelo Banco Central nos dois documentos é a venda de créditos de difícil liqüidação do Banco Santos. Apesar de estarem classificados como "H" (ou seja, como prejuízo), o banco teve um lucro de R$ 85 milhões com a venda deles. A compra foi feita pela Finsec --Companhia Securitizadora de Créditos Financeiros, empresa com sede nas Ilhas Virgens Britânicas, sobre a qual o BC não tem maiores informações.

Em 2000, o banco já havia vendido por R$ 50 milhões créditos de difícil liquidação para empresas com sede em paraísos fiscais.

Especial
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